Caso GDias mostra que não existe ala legalista ou democrata nas Forças Armadas. Por Luís F. Miguel

Atualizado em 22 de abril de 2023 às 14:33
General Gonçalves Dias, ex-ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI). (Foto: Reprodução)

Parece evidente, nesta altura do campeonato, que Lula devia ter demitido o general Gonçalves Dias, conhecido como GDias, logo após os atentados do 8 de janeiro.

Naquele momento, já estava claro que, se não foi cúmplice ou leniente, ele fora pelo menos negligente e incompetente em um grau que não permitiria sua permanência no cargo.

Dava para aproveitar o ensejo e abolir o Gabinete de Segurança Institucional, uma aberrante estrutura militarizada no coração de um governo civil.

Mas Lula preferiu preservar GDias, em nome de uma pretensa “velha amizade”. Esvaziou o GSI, ciente de que não era confiável, mas manteve órgão e ministro.

Está pagando o preço. As imagens da CNN com o general vagando no Planalto em meio aos vândalos do 8 de janeiro têm alimentado as redes bolsonaristas com todo o tipo de mentiras e falsificações. Caem como uma luva para o esforço de negar o óbvio e dissociar a intentona golpista das maquinações de Bolsonaro para permanecer no poder a qualquer custo.

A acusação ridícula de que o PT armou o golpe contra seu próprio governo ganha força junto a esse público – que, afinal, já está acostumado a acreditar em todo o tipo de sandice.

Não importa que a CNN seja a CNN e que o jornalista que divulgou o vídeo tenha ligações com o bolsonarismo.

O vídeo causa estrago e ficou evidente que GDias – no mínimo – foi omisso e mentiu para Lula dizendo que as gravações não eram acessíveis ou mesmo não existiam. O depoimento do general à PF não melhorou nada.

E agora o governo terá que aceitar uma CPI cujo objetivo era dar à oposição espaço para desinformar e tumultuar.

Um desgaste que vem num mau momento para o governo, que recuou na taxação dos importados, sofre a pressão do MST por não avançar na reforma agrária e se embananou com as declarações imprudentes de Lula sobre a agressão russa à Ucrânia.

Mas, para além das circunstâncias, o episódio serve para iluminar a posição da cúpula militar. Mesmo aqueles que seriam “simpáticos a Lula”, como GDias, não têm coragem ou interesse de enfrentar a maioria ultradireitista de seus pares.

Não existe ala legalista ou democrata nas Forças Armadas. O primeiro trabalho da ditadura de 1964 foi extirpar esse setor. E os governos da redemocratização nada fizeram para reverter o quadro.

Existem genuínos extremistas de direita, como Heleno, Mourão, Villas-Boas e tantos outros. E existem oportunistas, que veem para que lado os ventos sopram, mas nunca arriscariam vantagens ou os laços corporativos em defesa da democracia.

A política de contemporização continua forte. Leio no jornal que uma ala do governo defende a permanência do GSI e a nomeação de um novo general para o cargo. Chegam a citar Stumpf Trindade, “credenciado” por sua posição como secretário-executivo do próprio GSI nos governos Temer e Bolsonaro.

Não é só um tiro no pé do próprio governo. É uma sabotagem contra a democracia brasileira. A questão militar não tem solução fácil, mas precisa ser enfrentada com o objetivo claro de adaptar as Forças Armadas ao primado absoluto do poder civil.

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