Católicos serão menos de 50% até 2022 e abaixo do percentual de evangélicos até 2032

Atualizado em 6 de dezembro de 2021 às 18:08
Evangélicos
Foto: Masao Goto Filho/AE/VEJA

Transição Religiosa – Católicos abaixo de 50% até 2022 e abaixo do percentual de evangélicos até 2032, artigo de José Eustáquio Diniz Alves.

Transição religiosa no Brasil

O Brasil é o maior país católico do mundo e possui mais de 100 milhões de habitantes que se auto declaram católicos (praticantes ou não praticantes). Em termos percentuais, os católicos representavam mais de 90% da população em meados do século XX. Mas este quadro veio mudando rapidamente nas últimas décadas e há 4 tendências claras:

1. As filiações católicas vem caindo em termos relativos durante todas as décadas do século XX, mas o declínio se acentuou entre 1991 e 2010 (queda de 1% ao ano), sendo que houve declínio absoluto entre 2000 e 2010;

2. As filiações evangélicas crescem de forma consistente e com aceleração nas últimas décadas, mas o crescimento é abaixo do percentual de perda católica (também houve diversificação das denominações e aumento dos evangélicos não institucionalizados);

3. Há também crescimento do percentual das religiões não cristãs;

4. Por fim, nota-se um aumento absoluto e relativo do número de pessoas que se autodeclaram sem religião (incluindo ateus e agnósticos);

Estas 4 tendências podem ser resumidas em duas grandes linhas:

1. Mudança de hegemonia entre católicos e evangélicos;

2. Aumento da pluralidade religiosa, com queda no percentual de filiações cristãs (católicas + evangélicas) e aumento das outras religiões e dos sem religião.

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A Igreja Católica esteve presente no Brasil deste o início do projeto colonial português. A primeira missa foi rezada no domingo, dia 26 de abril de 1500, quatro dias após o desembarque da frota de Pedro Álvares Cabral (que era um católico fervoroso). A igreja participou do projeto de colonização e cresceu muito se fortalecendo junto às populações rurais, com baixa mobilidade social e com pouco dinamismo.

Contudo, com o processo de desenvolvimento e de urbanização houve um desenraizamento da população rural brasileira que migrou para as periferias dos centros urbanos e não encontrou apoio e presença da Igreja Católica. A falta de padres e o clericalismo afastou a Igreja Católica das áreas de expansão demográfica. O conservadorismo, o antimodernismo, a centralização do poder e a rigidez da hierarquia católica dificultaram a expansão da igreja nas áreas mais dinâmicas do país, acelerando o processo de desafeição ao catolicismo. A ética católica nunca se deu muito bem com o capitalismo (como mostrou Max Weber). Os escândalos de pedofilia agravam a situação.

Já os evangélicos – que dão ênfase na experiência direta e pessoal de Deus através do Batismo no Espírito Santo – conseguem atingir um grande público através da “Cura divina” e da “teologia da prosperidade”. Eles possuem grande descentralização e autonomia, rápida formação de pastores, cultos dinâmicos e alegres, abertura de templos pequenos perto das comunidades, fazem uso de músicas e outras formas de atração de fiéis, etc.

Um marco do crescimento evangélico no Brasil é o uso de diversas mídias (jornais, rádios, televisão, internet, WhatsApp, etc.) e a presença atuante na política (inclusive na Frente Parlamentar Evangélica). Há uma retroalimentação entre números de fiéis e representação evangélica. Nas pesquisas de opinião, as igrejas são consideradas mais confiáveis do que os partidos.

O deputado federal mais votado da história do Brasil (Eduardo Bolsonaro), com quase 2 milhões de votos é evangélico, assim com a deputada federal mais votada da história (Joice Hasselmann), com 1.078.666 votos. A deputada estadual mais votada de todos os tempos (vencendo inclusive os deputados federais mais votados) é a advogada “pró-vida” (que é de família espírita e diz frequentar a igreja católica e os cultos evangélicos), Janaína Paschoal, com 2.060.786 votos. No conjunto, o voto evangélico foi decisivo na eleição presidencial de 2018.

O sociólogo Max Weber é famoso por evidenciar que a ética protestante se encaixa melhor com o espírito do capitalismo. Pesquisa recente da Fundação Perseu Abramo sobre o imaginário social dos moradores da periferia de São Paulo retratou como o avanço do consumo, do neopentecostalismo e do empreendedorismo popular estão correlacionados com uma intensa presença dos valores liberais do “faça você mesmo”, do individualismo, da competitividade e da eficiência. Ou seja, boa parte da população pobre das periferias não compartilha o ideal estatista receitado por grande parte da esquerda brasileira.

Em outubro de 2018, a Frente Parlamentar Evangélica (FPE) lançou o manifesto “O Brasil para os Brasileiros”; com uma detalhada agenda econômica e uma clara pauta conservadora de costumes; além de ter oficializado apoio ao então candidato Jair Bolsonaro (PSL). Em novembro, a FPE influenciou na composição ministerial do novo governo com uma pauta de combate ao chamado “marxismo cultural”.

Desta forma, devido ao ativismo evangélico; à passividade católica e à maior interação entre igreja evangélica e política; a correlação de forças entre os grupos religiosos está mudando e a transição religiosa tem se acelerado no Brasil.

Infelizmente, o IBGE não fez nenhuma pesquisa levando em consideração a variável religião na atual década. Entretanto, pesquisas nacionais (Datafolha) e internacionais (PEW, Gallup, Latinobarômetro, etc.); mesmo não sendo totalmente comparáveis com os dados históricos do IBGE, indicam que a transição está se acelerando.

Em artigo acadêmico anterior (ALVES et. al, 2017) chegamos a prever que as filiações católicas ficariam abaixo de 50% até 2030 e seriam ultrapassados pelos evangélicos até 2040. Contudo, pelos motivos apresentados acima, estas tendências devem ser antecipadas em alguns anos.

No gráfico abaixo, apresento uma atualização da projeção com base em um declínio das filiações católicas em torno de 1,2% ao ano e um crescimento de 0,8% ao ano das filiações evangélicas, estes dados são compatíveis com os resultados das eleições gerais de 2018 que mostraram uma maior presença evangélica em todo o país.

Nas novas projeções, a presença católica na população chegaria a 49,9% em 2022 e a 38,6% em 2032; enquanto a presença evangélica seria de 31,8% e 39,8% nas mesmas datas (conforme mostra o gráfico abaixo). Ou seja, no ritmo atual da transição religiosa; não é improvável que os católicos fiquem com menos de 50% das filiações nacionais em 2022 (nos 200 anos da Independência do Brasil) e que sejam ultrapassados pelos evangélicos até 2032.

Os mapas apresentados a seguir, publicados no site Nexo; mostram como se deu a expansão evangélica nos municípios brasileiros entre 1991 e 2000. A expansão mais significativa (em volume de pessoas) ocorreu a partir das regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, São Paulo e Vitória. Daí, o avanço para o interior atinge inclusive o Paraná e Minas Gerais.

Mas os evangélicos crescem também em todo o litoral desde Florianópolis até Natal. No Rio Grande do Sul a presença é grande desde a chegada dos migrantes evangélicos tradicionais (Luteranos, Calvinistas, etc.). O crescimento também ocorre na região Centro-Oeste e; principalmente, na região Norte (mas nesta região o crescimento é percentual; pois o volume populacional é pequeno). A distribuição espacial da transição religiosa no Brasil pode ser vista no artigo acadêmico citado anteriormente (ALVES et. al, 2017).

Indubitavelmente, a mudança de hegemonia entre os dois grandes grupos religiosos do Brasil está em curso. Parece que a mudança na correlação de forças é irreversível. A dúvida é sobre a data exata em que ocorrerá a ultrapassagem e até onde irá a queda das filiações católicas.

(Texto originalmente publicado em EcoDebate)

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