Diálogo com bolsonarista enterra pretensão de Aras de se manter como PGR. Por Leonardo Sakamoto

Atualizado em 24 de agosto de 2023 às 8:14
Augusto Aras. (Foto: Reprodução)

Por Leonardo Sakamoto

Mesmo sabendo que as chances não eram boas, o procurador-geral da República, Augusto Aras, vem tentando ser reconduzido a um terceiro mandato por Lula. Mas os diálogos analisados pela Polícia Federal, mostrando que ele agiu para proteger um empresário bolsonarista de uma investigação sobre disseminação de mensagens golpistas após ser acionado por ele enterram essa pretensão.

Aguirre Talento, no UOL, nesta quinta (24), revela como Meyer Nigri, dono da Tecnica, acionou Aras após reportagem do site Metrópoles revelar a existência de um grupo de WhatsApp de empresários que trocavam conteúdo de teor golpista.

Aras respondeu que iria localizar o processo mas já antecipou que “se trata de mais um abuso do fulano”, a respeito do pedido de investigação que havia sido pelo senador Randolfe Rodrigues em cima da denúncia do Metrópoles.

Não era “abuso”, tanto que a PF descobriu que Nigri recebeu do próprio Jair Bolsonaro pedido para repassar “ao máximo” mensagens com ataques a urnas eletrônicas, ação confirmada pelo próprio ex-presidente. O empresário continua como investigado pela PF junto com outro membro do grupo, o dono da Havan, Luciano Hang.

E apesar de a defesa do empresário ter dito ao UOL que ele apenas “perguntou a opinião” de Aras, a proximidade manifestada com o procurador-geral da República através de outras mensagens e a proximidade do próprio PGR com Bolsonaro dá outro sentido à consulta.

Tanto que após o juízo de valor antecipado a PGR pediu ao STF o trancamento da investigação aberta contra Nigri e os outros empresários. O ministro Alexandre de Moraes autorizou a continuidade do inquérito.

Reportagem de Marcelo Rocha e Fabio Serapião, da Folha de S.Paulo, de 23 de agosto do ano passado, apontou que o procurador-geral da República ficou irritado por ser informado sobre a operação da Polícia Federal de busca nas casas dos empresários bolsonarista do tal grupo apenas na véspera da ação, pois sabia que isso demonstrava desconfiança do STF com a PGR.

O portal Jota já havia adiantado, na época, que, nos celulares apreendidos pela PF com os empresários bolsonaristas, havia trocas de mensagens deles com Aras com críticas a Alexandre de Moraes e comentários sobre a candidatura de Bolsonaro.

Aras chiou, mas após quatro anos de omissões graves, outros caminhos institucionais foram desenhados para suprir a inércia da PGR. Omissões que ajudaram a pavimentar o caminho para a tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro, com a invasão e vandalismo sobre as sedes dos Três Poderes. Afinal, se ele tivesse agido quando o então presidente atacava as urnas e o sistema de votação e ameaçava um golpe, provavelmente não teríamos o mesmo desfecho.

O PGR foi escolhido por Bolsonaro fora da lista tríplice de candidatos da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), quebrando uma tradição de quase duas décadas. Em seus dois mandatos, atuou como fiel escudeiro do presidente da República, protegendo-o.

Augusto Aras e Jair Bolsonaro. (Foto: Reprodução)

Não significa que a PGR não investigava atos do governo federal, mas houve uma blindagem da figura de Jair. Com isso o ex-presidente também passou incólume apesar de suas ações e omissões na pandemia de covid-19 terem tido consequências mortais para milhares de brasileiros.

No governo Lula, há quem defenda pragmaticamente a manutenção de Aras no cargo exatamente pelos mesmos motivos que ele se mostrou útil a Bolsonaro. A Procuradoria-Geral da República, ressalte-se, precisa defender o povo brasileiro, não o seu governante de plantão – para isso, existe o Advogado-Geral da União e apenas para atos relacionados ao mandato.

Com a revelação dos diálogos e da ação subsequente de Aras, recolocá-lo como PGR seria equivalente a Lula a apoiar as conspirações que queriam apeá-lo à força do poder.

Originalmente publicado no Uol

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