Elite bolsonarista crê que grana dá direito de agredir Moraes e democracia. Por Leonardo Sakamoto

Atualizado em 16 de julho de 2023 às 13:09
Alexandre de Moraes, ministro do STF. Foto: reprodução

Os xingamentos ao ministro Alexandre de Moraes e a agressão física sofrida por seu filho por bolsonaristas no aeroporto de Roma, nesta sexta (14), reforçam que uma parte da elite de extrema-direita, que tem mais acesso à informação sobre as consequências de atos como esse, continua propagando ódio e intolerância por acreditar que seu dinheiro a protege.

Entre os que estão sendo investigados pela Polícia Federal, estão os empresários Roberto Mantovani Filho e Alex Zanatta, de Santa Bárbara D’Oeste (SP). “Não foi nada de tão extraordinário”, disse Mantovani ao jornal O Estado de S.Paulo sobre o ocorrido. A declaração normaliza o ataque, como se atacar um ministro do STF e bater em sua família fosse algo corriqueiro.

O bolsonarismo, como movimento autoritário, negacionista, misógino, armamentista, miliciano e golpista, é naturalmente violento, independentemente da classe social do indivíduo que o professe. Contudo, o naco da elite brasileira que dele faz parte age como se tivesse um salvo-conduto para exercer a estupidez devido à sua posição economicamente privilegiada.

Durante a pandemia de covid-19, ricos bolsonaristas vieram a público dizer absurdos sobre as medidas de combate ao coronavírus -remédio amargo que salvou vidas. O empresário Júnior Durski, por exemplo, disse, em 2020, que “não podemos [parar] por conta de cinco ou sete mil pessoas que vão morrer”. Com Bolsonaro sabotando o isolamento, morreram mais de 700 mil.

Outro exemplo é Luciano Hang, investigado tanto por financiamento de milícias digitais de extrema-direita quanto por apoio à realização de atos antidemocráticos, como os de 7 de setembro de 2022.

Reportagem da Agência Pública apontou que a Havan, empresa de Hang, enviou caminhões para ajudarem nos bloqueios de rodovias contra a vitória de Lula. Chegou a incentivar golpistas publicamente e dizer que “o Brasil precisa de mais gente como todos vocês, que vão para a luta, não aceitam o errado como verdadeiro”.

Roberto Mantovani Filho, que agrediu Alexandre de Moraes

Questionados sobre seus atos, ricos bolsonaristas sempre alegam a liberdade de expressão como justificativa. Ou melhor, exigem tolerância para a sua intolerância, esquecendo de dizer que isso leva à eliminação dos tolerantes e da tolerância.

A diferença entre esse grupo privilegiado e a base mais humilde dos seguidores do presidente é o farto acesso à informação. Dificilmente, eles podem alegar ignorância ou manipulação como outros grupos sociais. No caso deles, a adesão ao bolsonarismo tende a ocorrer não apenas pelo alinhamento ideológico, mas também por verificar que essa aliança garante manutenção de seus privilégios.

Por sua importância no papel de organizar a massa de manobra, empresários da banda radical do agronegócio e ricos comerciantes do interior estão sendo investigados pela Polícia Federal por financiar a logística e a estrutura para os atos golpistas de 8 de janeiro.

Muitos agiram por acharem estar respaldados por sua conta bancária e influência política. Traduzindo: a impressão de que rico raramente vai preso. Mas exatamente pela ação diligente do ministro Alexandre de Moraes, tanto no Tribunal Superior Eleitoral quanto no Supremo Tribunal Federal, essa percepção foi por água abaixo e há uma chance grande dos que financiaram a tentativa de golpe serem punidos.

Andreia Munarão, Alex Zanatta Bignotto e Roberto Mantovani Filho. Foto: Reprodução

Isso dobra a revolta contra Moraes por parte dos ricos bolsonaristas, que, por outro lado, não abandonaram o sentimento de que estão acima da lei. E cenas como a agressão do aeroporto em Roma vão se repetir. Porque os líderes do bolsonarismo continuam jogando seus seguidores, ricos e pobres, contra as instituições. Nunca foi tão importante punir Bolsonaro por seus crimes.

Em tempo: ao longo dos anos, eu já fui derrubado e espancado na rua, já levei garrafada na cabeça, já me jogaram frutas podres, fui perseguido até a porta da minha casa, recebi ameaças de morte frente a frente. A agressão física por parte da extrema direita não é algo diferente das campanhas de ataques digitais, mas usa consequência lógica. Mas há uma arrogância quando ela vem da parcela rica: em uma esquina de São Paulo, um carrão abriu o vidro e de dentro uma mulher me cuspiu tempos atrás. Para ela, foi a coisa mais normal do mundo.

Texto originalmente publicado na coluna do Leonardo Sakamoto, no Uol.

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