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Altamira é o emblema de todos os dilemas nacionais. Por Luís Felipe Miguel

Volta Grande do Xingu. Foto: Reprodução/ Brasil de Fato/ Catarina Barbosa

Publicado no Facebook de Luís Felipe Miguel, professor da UnB:

Altamira é uma espécie de emblema de todos os dilemas e conflitos que o Brasil enfrenta. Emblema da violência do nosso país, mas também – graças ao Movimento dos Atingidos por Barragens, aos ambientalistas, aos indígenas, aos sem terra – da luta e da resistência.

Do governo Médici, quando foi proclamada “capital da Transamazônica”, até Belo Monte, Altamira é onde se expõe com total nitidez o caráter predatório, segregador e autoritário de um modelo de desenvolvimento que atravessa regimes e partidos.

Belo Monte também promoveu o inchaço da cidade, cuja população cresceu algo entre 30 e 50% num período de dez anos, sem planejamento, sem infraestrutura, com as esperadas consequências em termos da explosão da violência urbana.

Em julho passado, o massacre no presídio tornou Altamira, uma vez mais, o infeliz símbolo do Brasil do retrocesso. Da “velha política” do governo Helder Barbalho (uma coalizão que engloba do bolsonarismo ao PT e cooptou até lideranças do PSOL) à pretensa “nova política” da extrema-direita, vemos a passagem da leniência e conivência com a violência à sua exaltação aberta. Num caso como no outro, a marca é o desinteresse pela vida e pela segurança dos marginalizados e excluídos – o que se perde no caminho são os bons modos ou, se preferirmos, a hipocrisia. O que não é irrelevante, mas está longe de ser essencial.

À beira da cidade, o rio Xingu – um daqueles fenômenos da natureza que clamam pela utilização de um adjetivo tão cursí quanto “majestoso”. Quando o olhamos, temos a enganadora impressão de que é plácido e invulnerável. E nem percebemos tudo o que está afogado sob suas águas.