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Cúpula militar se articula em torno de Mourão contra Bolsonaro

Bolsonaro e Mourão

Da ÉPOCA:

Militares da cúpula das Forças Armadas, da reserva e com assento cativo na Esplanada dos Ministérios voltaram nesta semana a fazer algo que era comum no início do ano: reunir-se às escondidas do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para debater a conjuntura nacional. Antes, os encontros ocorriam quando o mandatário ostentava seu lado mais passional e participava de protestos a favor do fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. Agora, foram motivados pelas declarações absurdas do presidente (que insinuou a possibilidade de um conflito contra os Estados Unidos) e pelas humilhações públicas a que o mandatário submeteu dois de seus subordinados: os generais Eduardo Pazuello, ministro da Saúde que foi impedido de assinar um convênio com o Governo de São Paulo, e Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo, chamado de Maria fofoca pelo ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles. Ao menos dois encontros entre os militares ocorreram ao longo desta semana. Nos dois, a reclamação principal é que eles viraram motivo de chacota por causa do discurso de Bolsonaro de enfrentamento contra os EUA em defesa da Amazônia.

No mais recente, na noite de quinta-feira passada, Bolsonaro descobriu que a reunião acontecia, apareceu de surpresa onde estavam informalmente quatro generais do Exército ―o vice-presidente Hamilton Mourão, os ministros Luiz Eduardo Ramos e Walter Braga Netto (Casa Civil), além do comandante do Exército, Edson Leal Pujol. Queria saber o que passava. Quando o mandatário entrou no mesmo recinto, todos se despediram de Mourão, a quem chamaram de presidente. O quarteto tenta demonstrar unidade dos militares contra os arroubos presidenciais, a favor de Mourão. Ainda querem demonstrar o descontentamento com a postura de Bolsonaro que, em um único dia, comemorou uma suposta falha na vacina contra o coronavírus produzida pelo Instituto Butantan e pela Sinovac, ameaçou usar pólvora contra os Estados Unidos para defender a Amazônia e disse que o Brasil precisava deixar de ser um “país de maricas” no combate à covid-19.

Aliados de Bolsonaro desde a época da campanha eleitoral, os militares têm notado um franco descrédito das Forças Armadas e pretendem assegurar o que resta de confiança junto à população. Por esta razão, mesmo com o presidente desautorizando Mourão a falar em seu nome, o vice-presidente seguiu concedendo entrevistas. Na mais recente, à rádio Gaúcha, disse que seu sentimento pessoal era de que a vitória de Joe Biden para a presidência dos Estados Unidos “está cada vez mais sendo irreversível”. Bolsonaro é um dos poucos líderes mundiais que não reconheceram ainda a derrota de seu ídolo Donald Trump. Na mesma ocasião, Mourão endossou o que o general Pujol havia dito no dia anterior. “Não admitimos política nos quartéis”.

Pujol é um general discreto. Pouco fala publicamente. Ficou marcado por fazê-lo no início da pandemia, quando contrariou Bolsonaro e disse que o coronavírus era, sim, uma preocupação dos militares. Nesta semana, ele deu duas declarações que chamaram a atenção. Ambas em debates públicos. Na quinta-feira, durante um evento do Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa, Pujol afirmou que “militares não querem fazer parte da política nem querem que a política entre nos quartéis”.

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