Ditadura do Brasil bancou Pinochet com dinheiro, comida, armas e diplomatas, diz livro

Imagem: Reprodução/YouTube
Da Coluna de Jamil Chade no UOL.
O regime militar brasileiro foi central em garantir a sobrevivência do golpe militar no Chile, em 1973. Brasília bancou financeiramente a ditadura de Augusto Pinochet, garantiu aos militares chilenos apoio diplomático na ONU e concedeu armas e alimentos.
A constatação faz parte de uma obra que está sendo lançada nesta segunda-feira pela Cia das Letras e que mergulha o leitor num dos momentos mais sombrios da história diplomática nacional. Em “O Brasil contra a Democracia – A ditadura, o golpe no Chile a Guerra Fria na América do Sul”, o analista internacional Roberto Simon revela não apenas o envolvimento ideológico entre militares dos dois países e os preparativos para o golpe, mas também bastidores inéditos de como Brasília blindou Pinochet durante os primeiros meses de vida do novo regime. “Uma vez sepultados (Salvador) Allende e o socialismo chileno, o Brasil se esforçaria para colocar de pé e proteger a neófita ditadura Pinochet”, constata Simon.
De acordo com o livro, realizado a partir de pesquisas em documentos da inteligência dos dois países e centenas de arquivos diplomáticos, Pinochet inicialmente não contou com o apoio explícito do governo americano, “cauteloso para não se envolver publicamente com os verdugos da democracia chilena”. A defesa do ditador, portanto, seria assumida pelo Brasil.
Caberia ao embaixador brasileiro nas Nações Unidas, Sérgio Armando Frazão, por exemplo, um “um papel ativo” até mesmo na elaboração do discurso do chanceler de Pinochet, Ismael Huerta, na Assembleia Geral da ONU. “Crua na arte da diplomacia, a nova ditadura sul-americana buscara ajuda do experiente Itamaraty para pelear na ONU”, constatou o pesquisador.
“Com a queda de Salvador Allende, a chancelaria brasileira tomou para si a missão de defender a junta chilena na arena da diplomacia global. Era uma tarefa solitária. Os Estados Unidos manobravam com timidez para não dar sinais públicos de apoio a Santiago, enquanto europeus buscavam distância dos chilenos, em meio a tantas denúncias de atrocidades que saiam do Chile”, revela o livro.
Assim, o governo Médici serviria de “advogado do regime Pinochet fosse em fóruns multilaterais, como a ONU, fosse de forma bilateral, com um lobby de bastidores calçado na crescente importância econômica e política que o “Brasil potência” vinha adquirindo”. “O objetivo estratégico brasileiro era conter o isolamento internacional do Chile de Pinochet e assegurar a viabilidade do novo regime”, disse.
De acordo com o livro, embaixadas do Brasil em países como México, Polônia e Iugoslávia — os quais haviam rompido relações diplomáticas com Santiago — passaram a representar os interesses chilenos. Simultaneamente, a área de segurança do Ministério das Relações Exteriores mantinha os demais órgãos de inteligência do regime brasileiro informados sobre a campanha de Santiago para reverter a primeira onda de críticas.
Entre os diversos exemplos do apoio brasileiro ao governo de Pinochet, Simon revela como o embaixador brasileiro em Bonn, João Baptista Pinheiro, ainda trabalhou para convencer o governo social-democrata do chanceler Willy Brandt a não suspender a ajuda a Santiago, apesar da crescente animosidade no país em relação ao novo regime chileno.
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