Exclusivo: Aliado de Tarcísio, Rodrigo Garcia sabia que área de tiroteio é dominada pelo tráfico

Atualizado em 18 de outubro de 2022 às 15:36
Tarcísio de Freitas, após susto em tiroteiro em Paraisópolis; seus aliados poderiam ter evitado o desconforto (Crédito: Reprodução)

A favela de Paraisópolis, a segunda maior da cidade de São Paulo, na zona sul da cidade, é território controlado pelo tráfico, e nem mesmo o governador Rodrigo Garcia (PSDB) em pessoa é capaz de impor a ordem legal em seus próprios equipamentos existentes na área.

Nesta segunda-feira (17), um tiroteio no local amedrontou o candidato ao governo de São Paulo Tarcísio de Freitas (Republicanos). Horas depois, o político concedeu entrevista coletiva ao lado de Gilberto Kassab (PSD), um de seus coordenadores de campanha e secretário estadual da Casa Civil de São Paulo de 1º de janeiro de 2019 a 18 de dezembro de 2020. No evento, Tarcísio afirmou: “Não foi um atentado, mas foi um recado claro de que nós não éramos bem vindos ali”.

Enquanto o carioca Tarcísio de Freitas falava do susto que sofreu em uma favela comandada pelo tráfico em São Paulo, seu aliado Gilberto Kassab assistia a tudo. Ele foi chefe da Casa Civil estadual, mas aparentemente também não sabia de nada (Crédito: Vinícius Segalla)

Na realidade, as autoridades de Segurança e investigação de São Paulo já descartaram qualquer relação entre o tiroteio (em que a polícia matou mais um) e a visita do candidato de Bolsonaro ao local. Não tinha nada a ver uma coisa com a outra. Mas, se o carioca Tarcísio de Freitas foi pego de surpresa ao descobrir que o tráfico comanda o território de Paraisópolis, o seu aliado de primeira hora neste segundo turno, o governador Rodrigo Garcia, poderia ter livrado, se quisesse, seu amigo do susto que passou. Isso porque Rodrigo Garcia sabe muito bem quem manda ali.

O restaurante popular Bom Prato no bairro de Paraisópolis, localizado na rua Ernest Renam, 960, opera em um imóvel que não possui alvará de funcionamento, AVCB – Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros – nem qualquer documento formal exigido por lei. Também não paga IPTU ou qualquer taxa, nem sequer paga pela luz que consome.

Tais informações são incontestes e de fácil verificação. Tanto a Sabesp quanto a companhia energética responsável pelo fornecimento de eletricidade no local, como também a própria Secretaria de Desenvolvimento do Estado de São Paulo, podem confirmar. Não há conta de água ou luz em nome do imóvel que abriga o restaurante estadual, desde a sua fundação.

O mesmo pode ainda ser atestado pelo Corpo de Bombeiros no que se refere ao alvará e à licença para funcionamento do local.

Isso porque, de acordo com funcionários da OSC (Organização Social Civil) que administra o restaurante (Associação Talentos Especiais Liberdade Esperança Beneficiente de Oportunidade ao Menor – Telebom), o imóvel “pertence” a uma pessoa que não possui a sua escritura, sendo a entidade obrigada a pagar o aluguel em uma conta de pessoa física, pessoa esta a quem o poder estadual ordenou que ela pagasse este aluguel, para assim poder operar o restaurante estadual.

Os operadores do Bom Prato também são obrigados a comprar gás de cozinha com a empresa indicada por este proprietário.

O Bom Prato de Paraisópolis é a menina dos olhos de Rodrigo Garcia. Foi inaugurado pelo próprio, quando Garcia era secretário de Desenvolvimento Social, há dez anos, já neste imóvel. Neste ano, foi lá que Garcia tomou posse do cargo de governador do Estado.

No ano passado, o governo gastou R$ 718 mil reformando o imóvel, mas não fez qualquer alteração para legalizar a documentação do prédio, nem deixou de usar energia elétrica furtada por meio de um gato.

Ligação com o tráfico de drogas

Tudo que se informa acima é de fácil comprovação. O que segue a partir daqui, ninguém tem coragem de dizer dando nome e sobrenome, mas foi confirmado por quatro moradores de Paraisópolis ouvidos pela reportagem do DCM: na realidade, o prédio onde funciona o Bom Prato local é ligado aos chefes do tráfico em Paraísópolis, são os próprios bandidos que exigem que o governo estadual mantenha o restaurante funcionando ali, mesmo que não exista licença ou qualquer documento dando legalidade à operação do governo.

“Ih, moço, isso todo mundo sabe, esse prédio é do tráfico. Mas não vai colocar meu nome aí, moço, pelo amor de Deus”, disse uma das moradoras de Paraisópolis ouvidas pelo DCM.

“Quando o Rodrigo Garcia veio aqui lá na campanha dele, pediu autorização antes, avisou que ia vir, o pessoal avisou qual rua podia filmar, qual não podia. É assim mesmo que é, seu repórter, pode escrever”, disse outro.

“Pergunta pro senhor governador quanto ele pagou de luz e de água aqui no Bom Prato, pergunta só pra você ver”, desafiou outro.

A reportagem tem em seu poder o contratato de locação firmado entre a “Associação da Vida Verde Topybol”, a OSC que operava o Bom Prato Paraisópolis até 2021, e o “proprietário” do imóvel onde opera o restaurante. Não irá publicá-lo por um só motivo: medo de morrer. A Secretaria de Desenvolvimento Social do Estado de São Paulo, porém, possui em seus arquivos este contrato, bem como o que foi firmado com o mesmo “proprietário” e a nova OSC que administra o restaurante.

Quem solicitar tal contrato ao governo estadual, talvez não obtenha logo de cara, mas para isso existe a Lei de Acesso à Informação, sancionada em 2011, pela então presidenta Dilma Rousseff (PT). Só o que não vai obter mesmo – porque não existe – são as contas de água e luz do Bom Prato Paraisópolis.

Rodrigo Garcia no restautante Bom Prato, inaugurado por ele mesmo: come, mas não paga a luz (Crédito: divulgação)