EXCLUSIVO – Relatório aponta políticos, empresários e advogados de SC que organizaram atos golpistas: “Tem que quebrar tudo””

Atualizado em 19 de janeiro de 2023 às 16:42
Vândalo bolsonarista preso em Brasília no último dia 8 (crédito: reprodução/Reuters/Ueslei Marcelino)

O Ministério Público de Santa Catarina recebeu na última quarta-feira (18) uma notícia-crime contendo um relatório que aponta as atividades golpistas praticadas por políticos, empresários e advogados do estado desde a derrota de Jair Bolsonaro (PL) nas eleições do ano passado.

No documento, constam provas materiais e documentais das ações ilegais dos apoiadores do ex-presidente, incluindo incitação a um golpe militar, financiamento dos atos de vandalismo em Brasília no último dia 8 e apologia aos crimes de homicídio e lesão corporal grave.

Os dados e as provas foram compilados pela assessoria jurídica da direção municipal do PT de Itajaí, que tomou a iniciativa de fazer uma investigação própria – com base em bancos de dados e informações públicas – diante da inação das autoridades de fiscalização e controle locais, que assistiam passivamente até agora ao funcionamento de um acampamento em área pública na cidade e à conspiração para atos de violência e atentado à democracia.

Após a instauração da notícia-crime, o MP-SC informou que as informações já foram encaminhadas e estão sob análise da Ouvidoria do órgão. O DCM teve acesso ao inteiro teor do relaório.

“Muitos vídeos e prints foram enviados pela população, que está indignada com os atos antidemocráticos sem que as autoridades tomassem qualquer providência, por isso o PT assumiu a frente de compilar o material e entregar para as autoridades”, explica o advogado que representa o partido na ação, Marcelo Saccardo Branco.

“O PT tem histórico de luta pela democracia desde o combate à ditadura civil-militar instaurada em 1964. Agora, não poderíamos transigir com as ações golpistas, criminosas, da extrema-direita fascista. Ações que atentam contra o Estado Democrático e de Direito e promovem o terrorismo contra a democracia e o povo brasileiro. É nosso dever combatê-los!”, completa Gerd Klotz, que assina a petição em nome da legenda e é presidente municipal do partido em Itajaí.

Veja, abaixo, quem são os principais suspeitos identificados e quais as provas reunidas pelo PT-SC da conduta ilegal dos denunciados.

Liliane Mayre Fontenele, vice-presidente de comissão da OAB, a “Doutora Pix”

Crédito: OAB-SC

Foi a principal responsável pela organização e pelo levantamento de recursos para a manutenção por mais de dois meses de um acampamento golpista em frente a um prédio da Marinha do Brasil na cidade e para a excursão vândala a Brasília no dia 8.

É a “curadora” (como é chamada) de nove grupos de Whatsapp criados com o nome “Manifestação Marinha Itajaí”, por meio dos quais foram organizados todos os atos golpistas.

Com a certeza da impunidade, a advogada – que é vice-presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB na cidade – divulgou constantemente sua chave PIX nos grupos de organização dos atos golpistas, tendo recebido o apelido de “Doutora Pix” na imprensa local.

Ela teria recolhido doações de mais de R$ 100 mil de dezembro do ano passado até o dia 8 de janeiro deste ano. Os recursos foram utilizados para o aluguel de caminhões de som, ônibus para Brasília e aquisição de estrutura e comida para o acampamento da Marinha.

Reprodução de uma das inúmeras mensagens que circularam em grupos golpistas em que Liliane Fontenele divulgou sua conta bancária pessoal para arrecadar dinheiro para os atos golpistas (crédito: reprodução)

O relatório entregue às autoridades de fiscalização de Santa Catarina informa (os destaques foram inseridos pela reportagem do DCM):

A advogada Liliane Fontenele, inscrita na OAB/SC sob o n 22780, vice-presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB Subseção de Itajaí, gestão 2022/2024, além de ser a líder do acampamento golpista fixado na frente da Marinha de Itajaí desde o dia 03/11/2022, esteve presente durante as depredações em Brasília, na sede da Polícia Federal em 12/12/2022, inclusive relatando na parte final de vídeo anexado (veja abaixo) que acreditava que tal tumulto fora provocado através de ordem de alguém “lá de cima” (interpreta-se Jair Bolsonaro), na intenção de criar uma justificativa para uma intervenção militar.

Liliane esteve no Congresso Nacional em 07/12/2022 conjuntamente com Bismark Fugazza, que atualmente é considerado foragido da justiça, lendo uma carta que conclama as Forças Armadas a darem um golpe de Estado, sob pena do movimento que ela lidera “tomar
Brasília” e efetuar a “paralização (sic) de todo o Brasil” (veja abaixo).

Durante todo seu período como líder dos atos golpistas em Itajaí, instigou e fez apologia à intervenção militar, tanto diante de cidadãos comuns, quantos de militares, conforme vídeos e publicações em suas redes sociais.

A MESMA ADVOGADA ORGANIZOU UM ÔNIBUS (GRATUITO) PARA PESSOAS IREM PARA BRASÍLIA DIA 08/01/2023, CONFORME PRINTS DE WHASAPP ANEXOS (veja abaixo). ELA COMEMOROU E PEDIU APOIO AOS INVASORES DA PRAÇA DOS TRÊS PODERES, COM PALAVRAS DE ORDEM, CONFORME VÍDEO ANEXO (abaixo).

Liliane Fontenele, a advogada que não gosta de democracia: “Qual a nossa exigência? INTERVENÇÃO IMEDIATA DAS FORÇAS ARMADAS” (Crédito: reprodução)
A advogada Liliane Fontenele criou grupos e organizou a viagem com carros e ônibus gratuitos para os atos terroristas em Brasília (crédito: reprodução)

APÓS O ATO TERRORISTA, ELA AINDA INCENTIVAVA PESSOAS A IREM PARA BRASÍLIA OU A REFINARIAS, O QUE CARACTERIZA ATOS CRIMINOSOS ANTIDEMOCRÁTICOS.

 

Patrick Dauer, o candidato derrotado que quer uma ditadura

O empresário e político frustrado Patrick Dauer: não ganhou a eleição, agora quer intervenção militar (crédito: reprodução/Facebook)

Patrick Dauer (Patriota-SC) é um empresário de sucesso em Itajaí. Sua empresa, a Prosperar Contabilidade, é uma das mais conhecidas do seu ramo na cidade. Já como político, não tem tanta sorte. Tentou se eleger vereador em 2004, pelo PSDC. Não conseguiu. Em 2020, foi o candidato bolsonarista a prefeito, pelo Avante, e perdeu mais uma. Finalmente, em 2022, disputou uma vaga na Câmara dos Deputados, pelo Patriota, apenas para amargar seu terceiro revés consecutivo.

Então, se desiludiu com a democracia. Desde a sua última derrota nas urnas, é um dos maiores entusiastas da campanha pela intervenção militar no país, que substituiria a vontade popular pelo desejo de seu grupo político e de si mesmo. Consta no relório enviado ao MP-SC:

Um dos líderes incitadores da multidão golpista é o Sr. PATRICK DAUER. O mesmo veiculou em suas redes sociais um vídeo no qual DISCURSA em carro de som perante os “manifestantes”. Nos primeiros minutos de vídeo, ele pede intervenção e chama todos os presentes a pedirem em coro com ele Intervenção Federal, atentando declaradamente contra a Democracia, entre outras falas que incitam o povo contra a ordem democrática.

Prova da incitação promovida pelo sr. PATRICK DAUER:
https://www.instagram.com/reel/CknheaOAhbt/?igshid=MDJmNzVkMjY%3D

Convite no Instagram de Patrick Dauer, para que “o povo” promova uma “greve geral” contra o resultado das eleições em que saiu derrotado (crédito: reprodução)

Caso o Ministério Público de Santa Catarina venha a interrogar o empresário, fará bem se perguntar como é possível que o total de seu patrimônio declarado à Justiça Eleitoral se resuma a R$ 70 mil, sendo este o mesmo exato valor que ele mantém imobilizado no capital
social de sua empresa
.

Adriana Keller, a empresária que não quer motorista saindo do Uber para receber Bolsa-Família

A empresária Adriana Keller (dir): em 2018, ela não renegou o resultado das eleições (crédito: reprodução/Facebook)

A empresária Adriana Keller nunca precisou receber o Bolsa-Família. Ela e sua família, os Keller de Itapema (SC), são conhecidos donos de incorporadoras imobiliárias e empresas de crédito em Santa Catarina. Ela prória figura como proprietária em algumas delas (outras estão em nome de seus irmãos e outros parentes).

Fonte: Receita Federal do Brasil
Fonte: Receita Federal do Brasil

Na organização dos atos golpistas gestados em Santa Catarina, Adriana Keller agiu como braço direito de Liliane Fontenele, a “Doutora Pix”. Organizou a excursão golpista a Brasília, os grupos de Whatsapp e o financiamento da tentativa de golpe de Estado, conforme apontam as provas contidas no relatório entregue à promotoria catarinense.

No dia 8 de janeiro deste ano, em meio à euforia que sentia pela invasão e depredação dos prédios da República, ela teve que lidar com a descoberta de uma “infiltrada comunista” em um dos grupos de Whatsapp que administrava. E, então, irritou-se, gritou, mostrou quem é.

Em mensagem de áudio enviada ao grupo, reclamou que pessoas como aquela infiltrada deveriam estar trabalhando com Uber ou como motoboy do Ifood, mas, graças ao programa Bolsa-Família (pago ao Brasil todo por “pessoas do Sul”, como ela, Adriana), tinham abandonando seus empregos, deixando a empresária carente dos serviços de que gostaria de usufruir. Ouça reprodução abaixo, copiada pela reportagem dentre as diversas gravações contidas no relatório que está em posse do Ministério Público de Santa Catarina.

 

Finalmente, na notícia-crime entregue às autoridades ministeriais consta ainda uma série de outros denunciados e as provas de suas ilicitudes, entre eles o humorista Paulo Souza, do Canal Hipócritas, e o vereador de Itajaí Rubens Angioletti (sem partido), o parlamentar recordista de votos da história do município. Em uma das mensagem de áudio anexadas, por exemplo, um dos “patriotas” catarinenses participantes do grupo (que não é o vereador Angioletti) afirma: “Tem que quebrar tudo, esfaquear todo mundo”.

Agora, resta esperar que os promotores do Ministério Público de Santa Catarina concluam o trabalho. Desenhado, já está.