“Feminista e fã do PCO”: minha história com Amanda Partata, suspeita de envenenar o ex-sogro e a mãe dele

Atualizado em 22 de dezembro de 2023 às 17:16
A advogada Amanda Partata Mortoza, suspeita de ter matado o ex-sogro e a mãe dele envenenados em Goiânia

O ano era 2017 e eu fui convidado a participar de um grupo de proprietários de páginas progressistas nas redes sociais. Algumas menores e também alguns nomes que vinham se destacando no combate ao golpismo de Michel Temer.

O grupo se desfez logo após o final do mandato golpista, e, sobretudo, pela ducha fria proveniente da eleição de Bolsonaro. Foi algo como um sentimento de muita impotência. Enfim, perdemos contato.

Nesta semana, para minha surpresa, ao ler as manchetes de jornais me deparei com o nome de Amanda Partata. Ela foi presa na quarta-feira (20), suspeita de matar o ex-sogro Leonardo Pereira Alves e a mãe dele, Luzia Alves, envenenados, em Goiânia.

Inicialmente, investigou-se a possibilidade de as vítimas terem tido complicações por intoxicação alimentar causada por um bolo de uma doceria da capital, mas essa versão foi totalmente descartada pela Polícia Civil.

“O caso é bem complexo, envolve um grau de psicopatia. O que nós adiantamos é que, de fato, se trata de um duplo homicídio por envenenamento”, disse o delegado Carlos Alfama.

Amanda é advogada e também se apresentava como psicóloga — embora, segundo o Conselho Regional de Psicologia de Goiás (CRP-GO), ela não tenha registro profissional ativo no banco de dados. As investigações da Polícia Civil apontam que Leonardo e Luzia, que viviam no mesmo imóvel, receberam uma visita de Amanda no domingo, ocasião em que ela levou doces para o café da manhã. O veneno estava no suco de uva.

Cerca de três horas depois da refeição, mãe e filho sentiram dores abdominais, vômitos e diarreia. Chegaram a ser atendidos no Hospital Santa Bárbara, mas morreram horas após o internamento.

O “Partata” me remeteu imediatamente às conversas no WhatsApp. À época com 25 anos, Amanda atuava de forma ininterrupta no grupo e me chamava constantemente no privado.

Pedia para compartilhar postagens minhas – todas de cunho étnico-racial (fruto do meu objeto principal de pesquisa, sobretudo à época, pois defendi o mestrado um ano antes: 2016).

Para além dos pedidos de compartilhamentos, trocávamos confidências de manifestações, articulações da rede e convites. Sim, Amanda me convidou a entrar no PCO. Conforme trechos de conversas: “Você é filiado? A algum partido. Já viu o PCO? Quem faz [a análise de conjuntura] é o [Luis Carlos] Valois. Meu ídolo. Seria bom, não?”, questionou.

Pedia também ajuda para divulgar eventos de Goiânia e se oferecia para serviços de advocacia. Sempre pareceu uma jovem militante engajada com questões sociais.

Em 2 de julho de 2017, veio uma chuva de mensagens desconexas e com tom apreensivo, por vezes dramático. Típico de quem lança mão de hipérboles para supervalorizar a informação: “Eu namorei um procurador da república. O Rapha. Ele é comunista. A mãe dele foi torturada na ditadura. Ele é amado pelo MST, pelo movimento de pobres camponeses e por todos os movimentos sociais. E odiado pela elite do MPF. Que já fez de tudo pra tirar ele de lá. A cabeça dele vale 2.000.000 de reais. Os grileiros são doidos pra pegar”, escreveu.

“Ele atua contra os grileiros no estado que mais mata gente no campo. Eles são loucos pra tirar ele de lá. Todo mundo é mega fã dele. Ele dormia em acampamento às vezes. Eu nem contava pros reacionários da minha relação”.

Eu não respondia nada além de “hum” ou “huum”, até porque não sabia o que responder de fato. No dia 27 de julho de 2017, recebi uma mensagem que creio tenha sido enviada para todos os contatos: “Caros amigos, precisei alterar meu número de celular, segue: 64xxxxxxx12. Beijo grande. Amanda Partata”.

No dia seguinte, as conversas continuaram, tanto no privado quanto no grupo, porém, com um mote diferente. Mais angustiada, preocupada e com questões fantasiosas ou dramáticas.

Foi quando ela disse que estava preocupada com a invasão de seu celular antigo e que as mensagens que estavam chegando, inclusive no grupo, por quem estava em poder do seu chip anterior, deviam ser ignoradas: “Pode excluir. É chip frio”. Detalhe: se dizia feminista, mas crítica do “rad-fem” (feminismo radical), que, segundo ela a perseguia.

“Tô meio perdida com uma coisa, de repente, eu comecei a ser atacada como ‘sinhazinha’, ‘síndrome de princesa Isabel’ ‘de sinhá, a burguesa’. As meninas queriam que eu postasse expondo que eu estou sendo vítima de agressão, mas isso vai colocar o feminismo negro como violento. Elas [rad-fem] são muito transfóbicas”, afirmou.

Depois disso, disse que conhecia um dos advogados do Lula, ficou um tempo fora do grupo e das conversas privadas e mandou, no início de setembro, um “em breve volto. com segurança”.

Sumiu, até eu vê-la no noticiário policial. Amanda sempre pareceu uma jovem engajada, nervosa, exagerada, e militante. Hoje, uma homicida.