FENAJ divulga nota de repúdio à censura imposta pela Justiça ao DCM. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 29 de agosto de 2017 às 8:29
Maria José Braga, presidente da FENAJ

A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) divulgou nota em que manifesta “total repúdio” à decisão da 6a. Vara de Justiça Civil do Distrito Federal que, ao analisar pedido de reconsideração apresentado pelo DCM, determinou que o site não poderia mais usar o termo pelo qual ficou conhecido o caso do helicóptero da família do senador, apreendido em novembro de 2013 com 445 quilos de pasta base de cocaína.

Diz a decisão, divulgada sexta-feira pela juíza Gabriela Jardon Guimarães de Faria:

“A determinação de fl.248 não me parece impossível de cumprimento, como alegam os contestantes (DCM). Ainda que a expressão “helicoca” tenha se sagrado como de uso corriqueiro pela imprensa de uma maneira geral para se referir ao episódio da apreensão de droga no interior do helicóptero de propriedade do autor (senador José Perrela), a proibição de que a mesma não seja,  por ora, mais utilizada nas publicações de autoria dos requeridos é perfeitamente executável para eles, que podem (e devem) continuar a exercer o seu munus jornalístico no trato do episódio, sendo este o caso, mas com desprezo à expressão e eleição de outra em substituição.”

Para a FENAJ, trata-se de censura. 

“A FENAJ considera essa decisão judicial uma violação ao direito constitucional à liberdade de expressão, opinião e de imprensa. E ao direito da sociedade de informar e ser informada com  ética e verdade para melhor exercer sua cidadania. Esperamos que a justiça da 6ª Vara Cível do Distrito Federal suspenda imediatamente a liminar de censura ao DCM e restabeleça o direito da sociedade informar e ser informada, com ética e verdade, para melhor exercer suas escolhas e sua cidadania”, destaca a FENAJ, na nota assinada por toda a diretoria e divulgada pela presidente, Maria José Braga.

Os advogados do DCM, Caroline Narcon Pires de Moraes e Francisco Ramos, procuraram a Associação Brasileira de Jornalismo (Abraji) e solicitaram a presença da entidade na ação, tendo em vista o que ela própria define como um de seus objetivos “o acompanhamento de casos de censura judicial e de violência contra jornalistas”.  É o que, juridicamente, se chama de “amicus curiae”.

Abraji não atendeu à solicitação, com alegação de que faltava tempo para a diretoria se manifestar. Também não se pronunciou sobre a decisão da 6a. Vara da Justiça Cível do Distrito Federal, tomada na sexta-feira e que gerou intensa repercussão nas redes sociais. Foi um dos dez assuntos mais comentados no Twitter durante dois dias.

A alegada falta de tempo da Abraji não ocorreu em outros episódios, que envolveram coberturas de veículos tradicionais da mídia. As notas foram sempre divulgadas no dia em que os fatos se desenrolaram, como no caso das hostilidades a profissionais da Globo em dias de manifestações, situação em que o apoio de entidades como a Abraji também é esperado.

A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo tem 10 diretores, cinco deles funcionários das Organizações Globo, como o presidente Thiago Herdy, do jornal O Globo, e o vice-presidente, Vladimir Netto, que é repórter da TV Globo e biógrafo do juiz Sérgio Moro.

O site Comunique-se, especializado na cobertura de assuntos de imprensa, se manifestou hoje, em editorial, sobre a decisão da 6a.Vara que proíbe o DCM de usar o termo pelo qual ficou conhecido o caso do helicóptero com cocaína.

O Comunique-se relaciona essa decisão a outras, da época da ditadura militar. “Data da década de 1960 quando as redações recebiam listas com nomes e palavras censuradas. Era tempo de ditadura no Brasil. Ou melhor, ainda é – ao menos na visão da família Perrella e da juíza”, escreveu.

O Comunique-se conclui:

“Com espanto, a equipe do Portal Comunique-se espera que o país não dê passos ainda mais largos rumo ao passado. Os Perrella estão envolvidos em uma história de 445 quilos de pasta base de cocaína em um helicóptero. É helicoca pura esta história. Francisco Ramos e Caroline Narcon Pires de Moraes, advogados do DCM, formalizaram recurso junto à juíza Gabriela Jardon, para que ela reconsiderasse a decisão. E que seja reconsiderada, porque não faz sentido proibir um veículo de comunicação de usar determinado termo – ainda mais quando a palavra em questão está relacionada a um parlamentar que diz não fazer nada de errado, ‘apenas trafica drogas’. Vale lembrar à Justiça que o comércio de drogas é proibido no país, assim como a censura”.

Luiza Eluf

Procurada pelo DCM, a jurista Luiza Eluf, que foi secretária nacional de Justiça e presidente do Conselho Nacional de Entorpecentes, manifestou estranheza com a decisão:

“O Brasil é cheio de decisões estapafúrdias. Até parece que proibir um termo elimina o problema. Existia de fato um helicóptero cheio de cocaína. A imprensa, que é muito criativa, inovou com o termo helicoca. Achei genial. Proibir de falar não torna o político menos ou mais responsável. E não resolve o problema do tráfico de drogas no Brasil”.

No início da noite, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal divulgou uma nota sobre o caso da censura. Disse que a decisão proíbe apenas o uso do termo como sobrenome de Perrella, como constava de um texto do site, retirado do ar em janeiro, em cumprimento à decisão judiciaal. Como a nota é da assessoria de comunicação, não tem valor jurídico. O que prevalece é o que está escrito na decisão de sexta-feira:

“Ainda que a expressão ‘helicoca’ tenha se sagrado como de uso corriqueiro pela imprensa de uma maneira geral para se referir ao episódio da apreensão de droga no interior do helicóptero de propriedade do autor (senador José Perrela), a proibição de que a mesma não seja,  por ora, mais utilizada nas publicações de autoria dos requeridos é perfeitamente executável para eles, que podem (e devem) continuar a exercer o seu munus jornalístico no trato do episódio, sendo este o caso, mas com desprezo à expressão e eleição de outra em substituição.”

Por orientação dos advogados, o DCM vai aguardar a análise do recurso apresentado à segunda instância da Justiça no Distrito Federal, que já se encontra na mesa da desembargadora Carmelita Indiano Americano do Brasil Dias.

O momento do flagrante no helicóptero