Filhos do ProUni: as pessoas que mudaram de vida pela educação

Atualizado em 18 de abril de 2022 às 23:22
Pessoas que foram atendidas pelo ProUni. Da esquerda para a direita, Vanessa, Bruna, Helen e Elielton
O DCM conta as histórias de quem foi beneficiário do ProUni. Fotos: arquivos pessoais

Bruna Oliveira é uma mulher negra e nutricionista da cidade de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, Helen Christo, mora em São Paulo e hoje é jornalista, assim como Pedro Marin, que atua na mídia alternativa; já Carlos Eduardo é psicólogo e reside na cidade de Fortaleza. Na pequena Barra Velha, uma cidade do litoral de Santa Catarina, Vanessa Ribeiro atua no setor de advocacia, enquanto que em Pelotas, Elielton atua como fisioterapeuta há pouco mais de dez anos. Mas o que essas pessoas, de diferentes lugares, têm em comum? Todas foram beneficiárias do Programa Universidade Para Todos (ProUni), criado no ano de 2005 no então governo Lula e que tem o objetivo de financiar vagas em instituições de ensino privadas para alunos de baixa renda.

Segundo o banco de dados do Ministério da Educação, entre 2005, ano de criação do programa, e 2020, cerca de 2,8 milhões de pessoas foram atendidas pelo ProUni em todo o Brasil. Em meio aos números, estão as vidas de inúmeras pessoas que conseguiram chegar até à universidade e obtiveram um diploma de graduação, como é o caso da histórias dos profissionais que o DCM contará com exclusividade nesta reportagem.

Mesmo impactando inúmeras pessoas advindas da escola pública, a partir do segundo semestre deste ano, pessoas que tenham cursado o Ensino Médio em colégios privados também poderão concorrer a uma vaga no programa, desde que comprovem uma renda familiar de no máximo um salário-mínimo e meio para bolsas integrais e três salários mínimos para as parciais. A mudança foi feita através da Medida Provisória (MP) n° 1075, de 6 de dezembro do ano passado. Além disso, o número de bolsas ofertadas em 2021 foi 29,5% menor do que no ano anterior, voltando ao patamar de 2013, o que representa, consequentemente, uma dificuldade maior em acessar o ensino superior.

Para o professor aposentado da Universidade Federal de Goiás (UFG), Nelson Cardoso, “Essa é uma mentalidade que existe. Quem está no poder hoje no Brasil pensa desse jeito. O próprio ministro já disse que o ensino superior não é para todos e o que deveria ser expandido no Brasil é a educação profissional.”

Por outro lado, Bruna, Helen, Carlos Eduardo, Vanessa, Elielton e Pedro contam como chegaram até à universidade através do ProUni e o impacto do programa na vida de cada um.

Sobre o Prouni: “Não consigo imaginar como seria minha vida sem minha formação acadêmica.”

Bruna Oliveira foi uma das atendidas pelo ProUni. Ela está com uma camisa estampada, usa óculos, cabelo crespo e pele negra.
Bruna é nutricionista e foi uma das pessoas beneficiadas pelo ProUni. Foto: Arquivo pessoal.

Bruna Oliveira, conhecida como Bruna Crioula, tem 31 anos e é formada em nutrição pela Universidade Vale do Rio dos Sinos (Unisinos). Atualmente, ela é mestranda em Ciências Sociais e atua como nutricionista ecológica, comunicadora popular e pesquisadora alimentar.

Ela conta que teve conhecimento do Programa ainda no ensino fundamental, quando sonhava em entrar na universidade. “Meu encontro com o ProUni foi durante o ensino fundamental. Na época eu queria cursar Moda, um curso inexistente em universidades públicas. Minha família não tinha condições financeiras de arcar com as despesas de uma graduação e foi nessa busca que encontrei o Enem e o ProUni”.

Hoje, depois de ter sido beneficiária do programa, Bruna comenta que não consegue “imaginar” como seria  a vida dela sem a formação acadêmica. “Foi fundamental para que chegasse em lugares não planejados. O universo acadêmico é fértil para diferentes experiências que eu procurei viver da maneira mais intensa e comprometida possível. Não consigo imaginar como seria minha vida sem minha formação acadêmica.”, afirmou. “Não adquiri somente uma bagagem acadêmica, não acumulei apenas conhecimentos científicos. Por meio do meu ingresso no Ensino Superior eu ampliei meus horizontes para ser um sujeito político”, conclui.

Um dos principais problemas apontados pelos estudantes em relação ao ProUni é a dificuldade em acessar programas de assistência estudantil que possam garantir a permanência dos universitários nos ambientes acadêmicos, especialmente se for um curso em período integral, por exemplo. No entanto, Bruna diz que foi “beneficiária de todas as políticas de assistência estudantil oferecidas pela instituição. Foram graças a essas ações que eu conseguia me alimentar, me deslocar da minha casa até a universidade, assim como, passar por momentos de sobrecarga com acompanhamento psicológico”.

Mesmo assim, ela conta que o fato de ser mulher, empobrecida e negra foram fatores que a colocaram em situações difíceis. “Minhas dificuldades tinham relação com o meu lugar de fala e cosmopercepção de mundo. Enquanto uma jovem mulher negra, as opressões se adensam e se manifestam das formas mais inesperadas. A sociedade brasileira, especialmente as elites que ocupam esses espaços de formação, não estão acostumadas e nem desejam partilhar esses contextos com pessoas pobres e periféricas. Então, minha presença nos campus incomodava muita gente, entre alunos e professores.”

Apesar do preconceito relatado por Bruna, o número de pessoas não-brancas que ingressaram no ProUni sempre foi superior ao número de estudantes autodeclarados brancos. Em 2020, por exemplo, 40% dos alunos eram brancos, enquanto 57% eram negros nas turmas de Ensino a Distância (EaD). Já na modalidade presencial, no mesmo ano, o grupo era composto de 39% de pessoas brancas e 59% de estudantes negros. Indígenas e amarelos registraram porcentagens abaixo dos 2% em ambas as modalidades.

“Eu fui a primeira pessoa da minha família a entrar na universidade”

Vanessa foi uma das atendidas pelo ProUni. Ela tem pele branca, olhar sério e cabelos cacheados.
Vanessa estudou Direito pelo ProUni e foi a primeira da família a ingressar na universidade. Foto: Arquivo pessoal

Vanessa Ribeiro tem 28 anos e mora na cidade de Barra Velha, no litoral de Santa Catarina. Ela, que perdeu a mãe ainda jovem, precisou dividir o tempo entre o sonho de se formar na universidade e trabalhar para ajudar nas contas de casa. Hoje, é advogada depois de ser aluna do ProUni na Universidade Univille, em Joinville, distante 48km da sua cidade natal.

A jurista ingressou no curso no ano de 2010 e foi a primeira da família a ter um diploma universitário. “Eu não teria conseguido entrar na faculdade se não fosse o ProUni, porque não tinha condições financeiras na época. Eu fui a primeira pessoa da minha família à entrar na universidade”, comenta.

Apesar disso, não foram poucas as dificuldades que a jovem enfrentou. Além de precisar se deslocar diariamente, ela também tinha a necessidade de buscar empregos de meio período, ou estágios, para custear o valor das passagens e auxiliar na renda da casa. Por causa disso. precisou trancar o curso durante um tempo.

“Na época a minha mãe havia falecido e eu optei por algo mais próximo de casa, mas foi um período muito difícil. A gente tem todos os outros gastos, eu precisava me deslocar, gastos com livros, com alimentação, tanto que foi um dos motivos que eu optei por trancar a universidade”, declarou Vanessa.

Sem o ProUni, Vanessa disse que “Hoje eu seria uma pessoa a menos formada no país, uma pessoa a menos na minha área de trabalho.”

“Se não fosse o ProUni eu acho que eu não teria entrado na universidade”

Helen foi uma das atendidas pelo ProUni. Ela tem expressão simpatica, pele negra e cabelos pretos lisos
Helen é jornalista e também se formou através do ProUni. Foto: Arquivo pessoal

Helen Christo tem 27 anos, mora em São Paulo e hoje é jornalista. Estudante de escola pública, ela nunca achou que um dia fosse conseguir ingressar na universidade, até que foi encorajada a prestar o ENEM e se inscrever a uma vaga no ProUni, que garantiu uma bolsa a ela no curso de Jornalismo.

“Se não fosse o ProUni eu acho que não teria entrado na universidade. Eu era uma dessas pessoas que, só pelo fato de ter estudado em uma escola pública, achava que nunca teria capacidade de entrar na USP, por exemplo. Então eu nunca tentei”, afirmou.

Ela relata que as dificuldades encontradas foram decorrentes de um déficit no Ensino Básico, além de precisar trabalhar e estudar ao mesmo tempo para conseguir pagar o restante da mensalidade, já que sua bolsa era parcial. “É exaustivo você sair de casa de manhã, voltar muito tarde da noite e dormir praticamente umas 4h por dia, além de ter que prestar atenção nas aulas”, conta. Ela diz que ainda desenvolveu “uma ansiedade horrível” depois que entrou na universidade.

Helen estudou a vida inteira em escolas públicas, um dos requisitos do ProUni, até esse semestre exige a conclusão do Ensino Médio em colégios desse tipo. A partir do segundo semestre, estudantes bolsistas, integrais ou parciais, de escolas particulares, também poderão se inscrever para uma vaga no programa, segundo uma Medida Provisória (MP) anunciada pelo governo Bolsonaro em dezembro do ano passado.

O professor aposentado Nelson Cardoso, da Universidade Federal de Goiás (UFG), avalia que “Essa mudança que foi feita no ProUni, de pessoas que estudaram em escolas privadas também possam participar, pode ser um prenúncio para uma mudança na lei de cotas. Priorizar apenas a renda e não mais a partir de cotas raciais”. As cotas são hoje um  dos principais instrumentos que garantem acesso de pessoas negras, indígenas, deficientes e advindos de escolas públicas ao ensino superior. A medida tenta reduzir a desigualdade existente dentro dos espaços acadêmicos no país.

“Minha mãe e tias são empregadas domésticas, e minha avó foi empregada doméstica.”

Carlos Eduardo foi um dos atendidos pelo ProUni. Ele usa barba, óculos de grau com lentes redondas e cabelo preto ralo.
Carlos Eduardo tem 27 anos e hoje atua como psicólogo. Foto: Arquivo pessoal

Carlos Eduardo é morador da cidade de Fortaleza, no Ceará, e atua como psicólogo. Aos 27 anos, o jovem, que é natural de Russas, interior do estado, hoje estampa no peito um diploma de graduação no curso que decidiu seguir carreira.

O jovem conta que vem de uma família muito pobre do interior do estado e que, se não fosse o ProUni, provavelmente não teria ingressado na universidade. “Ele possibilitou com que eu entrasse na faculdade. Eu sou 2° da família a ter um diploma, a minha mãe é empregada doméstica, as minhas tias são empregadas domésticas e a minha avó foi empregada doméstica”, afirmou.

Apesar do sonho ter sido realizado, Carlos guarda marcas das dificuldades que passou. A ausência de programas de assistência estudantil dentro da universidade dificultou a permanência do jovem no curso, tendo que custear alimentação, gastos com passagem e materiais acadêmicos. “O ProUni possibilita que você entre, mas ele não te dá subsídios de permanecer lá”, avalia.

Durante a pandemia, ele relatou ainda outras dificuldades, como a necessidade de ter acesso a aparelhos que suportassem as aulas e o longo período de estudos. “Eu senti que tinha que lidar com outras coisas. Eu estava com o celular muito ruim, não tinha notebook, computador, nada. Para assistir uma aula eu precisava pedir um aparelho emprestado de alguém.”

Carlos tem duas irmãs, uma delas esteve diretamente ligada à sua formação, já que enquanto ele precisava destinar o tempo para estudar, ela trabalhava e ajudava a manter as contas em casa, “Não tinha como nós dois vivermos esse sonho”. Ele comenta que, conversando com a irmã, “Ela fala da sensação que tem de que teve que matar o sonho dela, ou não viver o sonho dela, para que eu vivesse o meu”.

“Hoje tenho vida profissional estável graças à oportunidade que tive de estar ema uma bolsa 100% em uma universidade”

Elielton foi um dos atendidos pelo ProUni. Ele usa um óculos de sol, cabelos calvos. Ele está dentro de um carro e sorri.
Elielton é fiseoterapeuta e foi aluno pelo ProUni quando o programa foi ofertado pela primeira vez. Foto: Arquivo pessoal

Elielton, 44 anos, é fisioterapeuta na cidade de Pelotas, no Rio Grande do Sul, e fez parte do primeiro grupo de estudantes que ingressou na universidade através do ProUni. Ele conta que, na época, as mensalidades do curso custavam mais de R$ 1.000 por mês, um valor impossível de ser quitado de acordo com o orçamento que ele tinha.

“Ela [a bolsa] foi fundamental, tanto para a minha vida profissional, quanto acadêmica. Eu sou formado em fisioterapia, um curso que custava mais de R$ 1000 na época. Se não fosse o ProUni, a bolsa de 100%, não teria a formação acadêmica e nem uma vida profissional”, diz.

Apesar disso, o profissional conta que também encontrou diversas dificuldades durante o curso. Por ser integral, ele não conseguia trabalhar, mas precisava pagar por algumas coisas exigidas pela universidade, como xérox, equipamentos para aulas e alimentação.

“Sempre era passado, ‘olha, compra isso’, e eram xerox, livros, equipamentos. Como o curso era integral, não exisitiria possibilidade de eu trabalhar”.

“Eu sentia que o fato de estar na universidade abriria um mundo de possibilidades para mim que não existiam até então”

Pedro foi um dos atendidos pelo ProUni. Ele usa barba, um casaco, óculos de grau e cabelo preto curto. Ao fundo há um grafitte de uma mulher negra.
Pedro Marin, 26 anos, foi um dos beneficiários do ProUni em São Paulo. Foto: Arquivo pessoal

Pedro Marin, 26 anos, é jornalista na cidade de São Paulo e mantém um site de mídia independente há cerca de uma década. Apesar de ter sido um dos beneficiários do ProUni e acessado a universidade, ele precisou trancar o curso, na Universidade Mackenzie, e hoje tenta concluí-lo.

Pedro, que morou a vida inteira em um bairro na periferia de São Paulo, localizado na zona leste da capital, ingressou no ProUni em 2015, na Universidade Presbiteriana Mackenzie, uma das mais prestigiadas do estado. Ele conta que teve a sensação de que “o mundo se abriu” quando acessou o ensino superior. “Então, assim, a sensação que eu tinha na época, quando eu consegui isso, e a sensação que eu tinha depois, ao fazer um projeto de iniciação científica, que o Mackenzie me pagava uma bolsa, de R$ 200, eu tinha aquela sensação de que ‘nossa, o mundo se abriu’”, conta.

Pedro abandonou a escola ainda durante o ensino fundamental para trabalhar e ajudar a mãe a pagar as contas de casa, só foi conseguir o diploma do ensino básico depois de ter feito algumas provas no INEP que garantiam um certificado equivalente e que poderia ser utilizado como comprovante de conclusão dos ensinos fundamental e médio. O jovem, que sempre ganhou muito pouco, passou a estagiar como correspondente internacional, o que considerou a abertura de “um mundo de possibilidades”.

“Eu tinha parentes e conhecidos que diziam ‘Ah, você abandonou a escola e vai ser caminhoneiro, você não vai ser nada’. De repente você está numa boa universidade, numa universidade muito cara, e você está recebendo por um trabalho em euros, né, desse ponto de vista, assim, eu não diria nem autoestima, mas essa esperança de ‘nossa, será que tudo aquilo passou?’”, conta. “Eu sentia que o fato de estar na universidade abrisse um mundo de possibilidades para mim que não existiam até então. Apesar desse trabalho ter sido obtido também pelo que eu fazia fora da universidade.”

Pedro, que precisou abandonar o curso na metade devido a questões financeiras, aponta que as universidades deveriam manter uma estrutura mínima de acolhimento aos estudantes empobrecidos. “Eu passava o dia lá, e ao contrário de uma universidade pública, não tinha um refeitório, a comida não era acessível. Há uma estrutura privada de alimentação, e era muito caro, então eu não conseguia comer. Eu me alimentava basicamente de hot dog de um cara que vendia na rua.” “Por que as universidades privadas não podem oferecer bandejão, assim como as públicas?”, questiona.

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Preconceito

As universidades privadas são, majoritariamente, ocupadas por estudantes advindos de escolas particulares e que pertencem às classes econômicas mais altas da sociedade. Com a possibilidade de alunos de baixa renda, que estudaram em escola pública, adentrarem nesses espaços, muitas reações negativas, envolvendo preconceito racial e de classe, são relatados pelos bolsistas. Pedro conta, inclusive, que precisou passar por uma manifestação contrária aos prounistas dentro da universidade no dia em que foi assinar os termos de contrato para receber a bolsa.

“No dia em que eu fui pegar a bolsa do ProUni, tinha uma espécie de manifestação de alunos, um ato organizado, que o pessoal ficava em frente ao setor de bolsas cantando músicas sobre como hoje eles estavam pagando a faculdade dos prounistas e depois pagariam o salário”, afirma.

O jovem conta ainda que já chegou a encontrar frases racistas dentro dos banheiros da universidade. “Aconteceram vários casos enquanto eu estava lá. Eu lembro que uma vez escreveram no banheiro ‘fora macacos prounistas do Mackenzie’, algo assim”.

“O que mais me chateia é que minha mãe não consegue voltar pro curso dela pelo ProUni”.

Pedro, que hoje tenta retornar ao curso de jornalismo, mas encontra dificuldades em se enquadrar nos critérios econômicos, também compartilha da situação da mãe, Maria, que precisou trancar o curso de Teologia na mesma universidade.

“Hoje eu moro com minha companheira e a gente ganha mais que 1,5 salários-mínimos per capta. Só que é aquilo, eu não consigo voltar para a universidade. À medida que a inflação avança, o preço das coisas aumenta e  o salário-mínimo não acompanha mais isso, a gente tem um problema em relação a  esses programas que são baseados em renda per capta”, avalia. “O processo inflacionário corroeu o salário, você cria um cenário que, para a pessoa acessar a universidade, ela precisa ser cada vez mais pobre.”

A mãe de Pedro, que entrou no curso de Teologia na mesma universidade através do ProUni, não consegue voltar ao curso porque a renda hoje é um pouco maior do que o limite estabelecido. “O que mais me chateia é que minha mãe não consegue voltar pro curso dela pelo ProUni, que ela quer terminar. Eu saí de casa e tinha esperança de que, ‘bom, agora minha mãe vai conseguir voltar’, mas não, porque hoje a renda dela ultrapassa um pouco o limite estabelecido de renda.”

Ainda assim, Pedro considera que o programa deveria ter um caráter temporário. “O programa é positivo, é bom, mas ele não resolve a questão do ensino no Brasil, que é uma questão que não diz respeito só a ‘ah, nós, pobres, vamos conseguir a ter acesso a universidade porque somos tadinhos e precisamos serem incluídos’. É uma questão que diz respeito ao Brasil, o que vai ser o país, se a gente vai formar gente competente para fazer as coisas, fazer o país andar, ou se seremos uma fazenda.”

No entanto, ele reforça que “Naturalmente, eu sou muito grato por ter tido essa oportunidade e, acima de tudo, sou muito grato pela minha mãe também ter tido acesso a um curso universitário depois de aposentada. A minha avó foi retirada aos 11 anos para trabalhar em casa de família em São Paulo, dos 11 anos até quando ela se casou, e ela nunca aprendeu a escrever. Então, a minha geração, na minha família, foi a primeira a conseguir entrar na universidade.”

Investimento em Educação Superior esbarra no envelhecimento da população

Nelson Cardoso compartilha das posições de Pedro e ressalta que o ProUni possui um efeito muito claro e impactante na vida das pessoas, mas deveria ser um programa de transição para um ensino superior público, gratuito e acessível a todos. “Se você não expande o público, o tempo todo deverá haver esses programas. O Brasil é um dos países que tem mais privatização do ensino superior no mundo”, comenta.

O pesquisador ressalta ainda que deveria haver uma cobrança maior por parte do Estado em avaliar a qualidade do ensino e dos cursos ofertados nas instituições inscritas no programa. “A gente não vê amarrado ao programa, que de algum modo leva dinheiro para os empresários, indicadores de qualidade daquela instituição. Às vezes não é um dinheiro tributário, como a renúncia tributária, por exemplo. Então deveria existir um indicador de qualidade daquela instituição.”

Cardoso tem ainda uma preocupação muito clara ao observar a curva do crescimento populacional no Brasil, que tenderá a cair a partir de 2040. “O Brasil está em uma dinâmica populacional de envelhecimento. Tem uma quantidade de jovens no Brasil que esse é o momento deles fazerem educação superior. Você está com uma geração atual, que se eles não tiverem acesso à essa oportunidade, acabou, e não vem mais população nessa faixa etária para fazer educação superior.”

Ele ressalta ainda que “Essa é a oportunidade que o país tem de formar essas pessoas na educação superior. Isso significa uma geração inteira que irá contribuir para melhorar o país, a saúde, a educação.”

E foi através do ProUni, o programa Universidade Para Todos, que hoje Vanessa, Bruna, Helen, Elielton e Carlos estampam os seus diplomas de advogada, nutricionista, jornalista, fisioterapeuta e psicólogo, respectivamente. São milhões de vidas impactadas em todo o país que tiveram acesso ao ensino superior através do programa. Por outro lado, Pedro e sua mãe, Maria, tentam retornar à universidade em meio a questões burocráticas do programa, mas que possibilitou os dois a iniciarem um curso de graduação no país.

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