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O triste fim de um chefe de polícia militar depois do golpe fracassado. Por Moisés Mendes

Yuri Calderón – Foto: Reprodução

O triste fim de um chefe de polícia militar depois do golpe fracassado

Por Moisés Mendes

O general boliviano Yuri Calderón não é mais nada desde sexta-feira. Não é general, não pertence mais à Polícia Nacional, está preso preventivamente e pode ser condenado criminalmente a continuar na cadeia.

Já o líder civil que o induziu a cometer crimes como golpista está solto. É uma realidade que os policiais militares brasileiros, que têm Bolsonaro acima de tudo, precisam conhecer.

Eles devem saber que líderes civis podem escapar sem danos em golpes fracassados, se tiverem voto e poder político. E os militares que fracassam correm o risco de serem abandonados.

Yuri Calderón, agora ex-general e ex-chefe da Polícia Nacional, a PM federal deles, foi largado na cadeia. Está preso desde março como um dos chefes militares do golpe de novembro de 2019 contra Evo Morales. Mas não foi chefe de nada, como saberemos mais adiante.

Na sexta, uma corte militar, o Tribunal Disciplinar Departamental de La Paz, determinou que o militar entregue a farda e as comendas e vá para casa vestir pijama, quando conseguir sair da cadeia.

O caso de Calderón é exemplar dos golpistas que parecem ser mas não são mandantes de golpes, são apenas mandaletes.

Além de jogar fora a carreira militar, depois de condenado em processo disciplinar como chefe de um motim e por conspirar contra um governo eleito, o policial deve ser punido na área criminal em processo que ainda corre na Justiça boliviana.

Calderón não foi o que parece ter sido. Foi apenas um covarde e omisso engolido por badernas que não conseguiu conter. Os policiais militares brasileiros aprenderiam muito com seu caso e de outros chefes da polícia militar que estão presos.

O golpe na Bolívia foi acionado por um motim policial, depois que a OEA decidiu colocar em dúvida os resultados da eleição de outubro, que reelegeu Evo Morales, com suspeitas de fraudes nunca comprovadas.

Quem incentivou o motim da Polícia Nacional, para que tome os quartéis e anuncie uma rebelião contra Morales, foi Luis Fernando Macho Camacho, um fazendeiro mafioso, dono de negócios em várias áreas, do seguro à medicina privada.

Camacho era o presidente do Comitê Cívico de Santa Cruz de la Sierra, uma organização da direita e da extrema direita, na região dominada pela elite rural boliviana.

O motim começou no dia 8 de novembro de 2019. Dois dias depois, o alto comando das Forças Armadas gravou um vídeo e declarou que Morales deveria renunciar. Calderón, uma autoridade federal (a polícia é nacional), aparece nesse vídeo.

O general havia assumido em abril, como uma tentativa de Morales de ter um homem de total confiança na polícia. O que está cada vez mais claro é que Calderón não liderou o motim.

O general se acovardou diante da rebelião dos soldados e de grupos de oficiais, empurrados pela turba de Camacho para uma aventura que durou apenas um ano e foi derrotada nas eleições de outubro de 2020.

Calderón e oficiais da Polícia Nacional estão presos. Está presa Jeanine Añez, a civil que Camacho e os golpistas usaram como laranja, por ser senadora, para assumir o poder, quando Morales foi obrigado a renunciar. Estão presos os chefes das três armas e ministros civis de Añez.

Mas Camacho, o líder do golpe, está solto. É nisso que os policiais militares brasileiros devem prestar atenção. Quando o Ministério Público determinou, em 13 de março, que líderes do golpe deveriam ser presos, a Bolívia vive o clima político entre o primeiro e o segundo turno das eleições estaduais.

Camacho é o então candidato do Creemos, um dos agrupamentos da direita, a governador de Santa Cruz. Por que o MP não pede sua prisão? Porque, claro, o milionário fascista, o Bolsonaro deles, envolvido em lavagem de dinheiro e todo tipo de falcatrua, está em campanha.

Camacho conseguiu se eleger. O homem fortalece o que Calderón e seus amigos fardados não têm: mais e mais poder político.

Se os policiais bolivianos haviam sido empurrados para o golpe por Camacho, foi a Polícia amotinada que puxou os militares para a turma. E uns caíram por cima dos outros.

Também caíram Yassir Molina, Marco Antonio “Tonchy” Bascopé e Milena Soto, líderes da violenta RJC, a Resistência Juvenil Cochala, uma organização miliciana com estrutura paramilitar, que era usada, mesmo que sem ligações formais, como suporte de Camacho para ações violentas nas ruas.

Todos estão presos. Os chefes da polícia, os chefes militares, os chefes milicianos e a laranja Jeanine Añez e seus ministros são considerados perigosos pelo Ministério Público e pela Justiça.

Mas o grande líder civil do golpe, o mafioso Macho Camacho, talvez o mais perigoso de todos eles, está solto. É governador, tem poder, tem fortuna e tem imunidades.

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Lição

A lição que a Bolívia oferece é a mais elementar. Parte da estrutura civil do golpe, que conspirou contra a democracia, acabou buscando proteção no voto e na própria democracia e está livre.

Os militantes fardados, usados apenas como tarefeiros pelo fascismo civil para o levante, foram largados na sarjeta quando o golpe fracassou e estão encarcerados.

Moisés Mendes

Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim) - https://www.blogdomoisesmendes.com.br/

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