Fundamentos econômicos sólidos garantem popularidade de Lula

Atualizado em 7 de maio de 2024 às 17:48
Alimentos em um supermercado. Foto: Helio Montferre

Por Miguel do Rosário

Acabou de ser divulgada a pesquisa CNT/MDA sobre a aprovação do presidente Lula. É uma pesquisa top de linha, com 2002 entrevistas presenciais, e ela mostra que Lula mantém uma sólida aprovação de 51%.

Houve queda, porém, em relação à pesquisa feita em janeiro, quando o presidente chegou a pontuar 55%.

Pelo gráfico se pode constatar, de qualquer forma, que Lula ainda mantém uma aprovação muito superior a que tinha Bolsonaro em 2021 e 2022, que oscilava entre 30% a 40%.

Gráfico de aprovação do presidente Lula. Foto: Fonte IBGE

 

Gráfico de evolução. Foto: Fonte IBGE

Façamos uma análise diferente. Na verdade, essa pesquisa apareceu bem no momento em que eu terminava um estudo sobre os dados econômicos do país. Veio em boa hora, portanto.

É duro acompanhar, por vezes, a neurastenia das redes sociais. Se você passar tempo demais numa delas, sairá convencido que o Brasil está indo para o buraco, apesar de todos os fundamentos sinalizarem o contrário.

Para a direita brasileira, hegemonizada por extremistas delirantes, vivemos à beira de um apocalipse econômico, político e moral. Como os dados sociais (emprego, renda, crescimento, inflação) estão bons, eles se ancoram num suposto rombo fiscal, que não existe, e num insuportável aumento da carga tributária, igualmente um fantasma.

O problema é mais profundo: à baixa estima nacional se soma, aparentemente, uma insegurança crônica, quase patológica, de que as coisas podem degringolar a qualquer momento. E esse sentimento contamina também a esquerda, que aliás tem seus motivos e seus traumas, pois o grau de instabilidade política tem sido elevadíssimo desde a redemocratização. A partir do final dos anos 80, as elites políticas e midiáticas aceitaram de bom grado a transição para o regime democrático, mas o preço que cobraram parece ter sido manter a sociedade brasileira em constante estado de terror, ansiedade e insegurança.

Neste artigo, reuni os principais dados econômicos, atualizados até março ou abril, sempre segundo fontes oficiais, para conferir se a situação nacional é boa ou preocupante.

Antes de passar à economia, contudo, gostaria de trazer alguns gráficos e comentários do cientista político Antônio Lavareda, presidente do Ipespe, tradicional e respeitado instituto de pesquisa, e um dos mais experientes analistas políticos do país.

“[Confira] abaixo, os resultados de todas as pesquisas divulgadas pelos diversos institutos que trazem a variável dicotômica “Aprovação/Desaprovação do Governo Lula” a partir da primeira edição do ano da pesquisa FBB/ IPESPE em fevereiro até essa divulgada hoje pela entidade. A leitura do gráfico dos saldos (aprovação – desaprovação), sempre a melhor forma de comparar dados produzidos por institutos e métodos diferentes, aponta inicialmente um rápido declínio da curva até a medição do Paraná Pesquisas, em meados de março, quando o saldo se tornou negativo (-2,2) e a partir daí o que pode ser um processo de recuperação segundo os números do PoderData (+2) e agora do IPESPE (+6). As próximas pesquisas confirmarão ou não se há de fato essa tendência positiva.”

Gráfico de aprovação e desaprovação do governo. Foto: Fonte IBGE

Bem, os dados do CNT/MDA divulgados hoje fazem a linha verde, de aprovação, subir mais um pouquinho, até 51%, de maneira que, apesar de trazer queda em relação a janeiro, ela pode confirmar, inversamente, o viés de recuperação apontado por Lavareda. O “saldo” de aprovação em maio, segundo a CNT, estaria em 7,0.

Como eu dizia, no entanto, esse post não é sobre pesquisa, e sim sobre os fundamentos econômicos do país, e considero isso bem mais relevante do que a aprovação do governo. Por uma razão simples. Se os fundamentos econômicos estão sólidos, positivos, então a queda na aprovação pode ser interpretada de uma outra maneira. Ao invés de entender o mau humor dos eleitores como disposição para derrubar o governo, ou votar em candidatos da oposição na eleição mais próxima, ele pode sinalizar a ansiedade por mais realizações, mais audaciosas e mais profundas.

Enfim, vamos aos dados que reuni com exclusividade para vocês. Ao fim do post, indico o link para as fontes de todas as informações e gráficos publicados aqui.

Comecemos pela renda média real do trabalhador brasileiro, segundo o IBGE. Compilando os primeiros trimestres desde 2017, constatamos que a renda média real (ou seja, já descontada a inflação) bateu recorde em março deste ano, atingindo R$ 3.123.

Gráfico de renda média real do trabalhador brasileiro. Foto: Fonte IBGE

sse é número importante, naturalmente, para se apurar o grau de satisfação do eleitor. Muito mais importante do que um governante ser bem avaliado é a situação econômica estar no bom caminho, especialmente no que toca à renda do trabalhador.

De nada adianta um governante tem 80% de aprovação, e a renda do trabalhador experimentar declínio. Inversamente, não há problema nenhum que um presidente perca alguns pontos de aprovação, se os salários e a renda seguem em alta.

Vamos ao desemprego. Compilando os percentuais para períodos iguais, os primeiros trimestres de 2016 a 2024, temos um quadro promissor: o desemprego caiu para 7,9%, o nível mais baixo dos últimos 10 anos.

Gráfico de desemprego no Brasil. Foto: Fonte IBGE

Outro dado positivo, referente ao emprego, é que a maior parte dos novos postos de trabalho criados tem sido do tipo formal, com carteira assinada. Segundo o IBGE, o Brasil já tem 38 milhões de trabalhadores com carteira, um recorde histórico.

Gráfico de pessoas empregadas com carteira assinada. Foto: Fonte IBGE

A indústria também traz boas novas. Ainda segundo o IBGE, a indústria brasileira começou o ano de 2024 com uma forte recuperação, conforme se pode ver pelo indicador do próprio instituto. Quando se examina apenas a indústria de transformação, nota-se uma melhora constante desde o início do ano passado, o que pode sinalizar que o Brasil já vive um processo de reindustrialização.

Gráfico de indústria brasileira geral. Foto: Fonte IBGE
Gráfico da indústria de transformação. Foto: Fonte IBGE

As exportações brasileiras também trazem excelentes notícias para a economia brasileira. No primeiro trimestre deste ano, o Brasil bateu novamente recorde, exportando o equivalente a US$ 78 bilhões, contra US$ 76 bilhões no mesmo período do ano anterior (que também tinha sido recorde). Para se ter uma ideia, o Brasil exportava pouco mais de 10 bilhões de dólares ao final da década de 90.

Gráfico de exportação brasileira. Foto: Fonte IBGE

A propósito, é interessante observar que, ao contrário do que o senso comum propala, a maior parte das exportações brasileiras são classificadas como manufaturadas, ou da indústria de transformação. E estas também bateram recorde no primeiro trimestre de 2024. Em Jan/Mar último, o Brasil exportou US$ 41 bilhões em produtos manufaturados, recorde histórico. Nos primeiros trimestres de 1997 a 2000, para efeito de comparação, o Brasil exportava apenas 8 a 10 bilhões de dólares.

Tudo bem que a maior parte dessa indústria é sobretudo de alimentação, de baixa complexidade. É muito mais “cool” exportar semicondutores e celulares, com certeza. Mas a indústria de alimentação tem uma vantagem: tem um mercado internacional muito mais estável. Farei um post à parte sobre isso amanhã.

Gráfico de exportação brasileira de industrias. Foto: Fonte IBGE

Agora vamos aos dados fiscais.

A mídia brasileira tem feito uma campanha terrorista barulhenta sobre a situação fiscal do país, que, no entanto, segue extremamente sólida.

O déficit primário do setor público, em percentual do PIB, encerrou o acumulado de 12 meses até março em 2,29%, contra 2,44% no acumulado até fevereiro. Nos anos de 2020 e 2021, este déficit oscilou entre 6% e 9% do PIB e ninguém falava em apocalipse.

Gráfico do déficit primaria do setor público. Foto: Fonte IBGE

Além disso, se considerarmos o desempenho vigoroso do PIB, do emprego e das exportações, está claro que a evolução fiscal do Brasil segue perfeitamente saudável.

Mais importante, se olharmos para o mês de março, o setor público obteve um superávit de 0,12% do PIB, contra um déficit de 1,51% em março de 2023. Nos meses de março de 2018, 2019 e 2020, o setor público (que reúne todas as esferas de governo, mais estatais) registrou déficits bem mais elevados, de 3% a 4% do PIB.

Gráfico do superávit primário do setor público. Foto: Fonte IBGE

A dívida bruta do governo geral (que reúne todas as esferas de governo, INSS, mas não estatais), por sua vez, fechou março em 75,7% do PIB, contra 71,5% em março de 2023; ela é inferior, porém, a todos os meses de março de 2019 a 2021.

Gráfico da dívida bruta do governo geral. Foto: Fonte IBGE

É importante olhar para o desempenho da receita federal nos últimos anos. O gráfico abaixo trata de acumulados em 12 meses, em valores deflacionados para março de 2024. Repare que houve um longo período de estagnação da receita, e até mesmo declínio, de 2013 até o início de 2021. A partir daí, há uma mudança brusca de tendências, e a receita passa a aumentar fortemente. No segundo semestre de 2023, houve um pequeno recuo, logo revertido nos últimos meses do ano e início de 2024.

Um fator saudável  é que esse aumento não veio de royalties, ou de receitas não recorrentes. Ele veio, sobretudo, das receitas administradas pela receita federal, que são mais estáveis.

Gráfico da receita total do governo federal. Foto: Fonte IBGE
Gráfico da receita do governo. Fonte: IBGE

Temos visto, ainda, que a extrema direita vem tentando colar a farsa do aumento dos impostos. Só que os dados da própria Secretaria do Tesouro Nacional mostram que a carga tributária no Brasil caiu no primeiro ano do governo Lula, de 33,07% do PIB em 2022 para 32,44% do PIB em 2023.

E quando se estratifica por esfera de governo, vemos que a carga tributária do governo federal caiu de 22,41% em 2022 para 21,99% em 2023.

Outra boa notícia é que o único tipo de imposto que tem apresentado algum crescimento, na proporção com o PIB, é o vinculado à renda, lucros e ganhos de capital. Este imposto que representava apenas 6% do PIB em 2010, encerrou 2023 em 8,66% do PIB. Já o imposto sobre bens e serviços correspondia a 14,7% do PIB em 2010, e hoje caiu para 12,68% do PIB.

Tabela da carga tributaria bruta. Foto: IBGE
Gráfico da carga tributaria bruta. Foto: IBGE
Gráfico da estrutura da carga tributaria bruta. Foto: IBGE

Deixo para o final, um dos dados econômicos mais importantes, o que afeta mais diretamente o humor do cidadão e o prestígio de um governo: a inflação. Segundo o IBGE, a inflação medida ao final de abril estava em 3,77% no acumulado em 12 meses, e caindo. Houve um pico em fevereiro, logo revertido em março e abril, não afetando a tendência no acumulado. Houve uma alta focada nos alimentos, o que afeta muito mais a população pobre, e isso explica a queda de popularidade de Lula nestas camadas. Mas o fato é que, no geral, a inflação está controlada e mesmo em declínio.

Gráfico de inflação em 12 meses. Foto: Fonte IBGE

Conclusão

Os fundamentos econômicos do Brasil estão sólidos. Ponto. É isso que importa, muito mais do que pesquisas de opinião.

Agora falta ao governo Lula oferecer ao país projetos mais audaciosos, que mobilizem o imaginário, e façam a pauta política se deslocar do campo dos costumes e da briga partidária menor, para alguma coisa mais nobre, capaz de mobilizar diferentes espectros ideológicos.

O governo precisa evitar a luta política no campo onde a extrema direita está mais confortável, e elevar o debate para as grandes necessidades do país.

Não consigo pensar em outras coisas senão mobilidade urbana, especialmente transporte sobre trilhos, e energia solar.

Sobre trens, já tenho falado bastante, e voltarei a falar em outros artigos. No caso da energia solar, este é um fator que poderá mudar profundamente, e rápido, a vida das pessoas, a começar pelo barateamento das contas de energia.

Originalmente publicado no O Cafezinho
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