Destaques

Jornalismo ‘treta’ e marketing vacinal. Por Fernando Brito

Publicado originalmente no Tijolaço:

Por Fernando Brito

No dia em que o Brasil atinge 3.650 mortes pela Covid em 24 horas, a manchete da Folha dá ideia do quanto o jornalismo brasileiro deixa de lado a notícia para destacar um detalhe que, afinal de contas, não tem a menor importância: se a vacina anunciada pelo Instituto Butantan é ou não é nacional.

É certo que o anúncio com pompa e circunstância da vacina desenvolvida pelo Butantã, ainda em estágio preliminar de testes, foi, como sempre, uma jogada de marketing vacinal de Doria, como todo o tempo o governador paulista age mesta questão, muito embora qualquer pessoa honesta deva reconhecer que, sem o imunizante que o Butantan contratou e produziu a partir de insumos da China, estaríamos numa situação mais dramática, porque 85% das vacinas que temos no país vêm de lá.

Doria é tão “over” que – está no mesmo jornal – até seus aliados o reconhecem-no marqueteiro.

Ainda assim, há fatos. Usar uma base tecnológica – regular e reconhecidamente licenciada – estrangeira para produzir, sem depender em nada do exterior, faz desta vacina possível (terá de confirmar-se efetiva) um imunizante nacional, pois não estaremos sujeitos a importar coisa alguma para tê-lo, ao contrário do que acontece com os atuais.

Há muitas razões para isso, sobretudo a necessidade de responder rápido à pandemia mortal e o drama que todos estão vendo nas dificuldades na entrega de insumos vindos de fora.

O jornal mais importante do país, porém, não pode ser perdoado por deslocar um assunto lateral – em linguagem destes dias, uma “treta” – para o centro da edição em que se deveria retratar não só o drama da hecatombe provocada pela pandemia como a inação dos governantes diante deste quadro. O desvio mental vai até mesmo ao principal editorial, completa bobagem que foge do tema central: a necessidade de parar o país imediatamente.

Seis aviões caíram em São Paulo, matando todos os seus passageiros e tripulantes e não parece que algo assim devesse ficar, como faz o jornal, numa segunda linha, em letras menores.

Mais ainda porque hoje cairão outros cinco ou seis, e amanhã, e depois de amanhã e por quanto tempo mais, se tempos um governo que, a esta altura, apela para um ridículo “pátria de máscara” como o que pode tirar o Brasil deste Vale da Morte.

O país está insciente do que estamos passando e nem é preciso sair da capa da Folha para ver, logo abaixo, a imagem da fila de automóveis que se perde de vista, mostrando do turismo que virou o ‘lockferiado’ sanitário.

Um jornal de 100 anos devia já ter superado a idade das tolices.

Fernando Brito

Disqus Comments Loading...
Share
Published by
Fernando Brito

Recent Posts

Governo federal reconhece calamidade pública em 336 municípios do RS

O Governo Federal reconheceu calamidade pública em 336 municípios do Rio Grande do Sul devido…

24 minutos ago

Contrariando evidências, motorista do Porsche diz que só bebeu água antes de acidente

Cerca de sete horas antes de ter sua prisão preventiva decretada, Fernando Sastre Filho revelou…

47 minutos ago

Sexo oral, masturbação e beijo gay: as polêmicas do show de Madonna

O show da ícone pop Madonna na praia de Cobacabana, no Rio de Janeiro, na…

8 horas ago

Porto Alegre entra em alerta de ‘inundação severa’ e mortes chegam 78 no RS

Porto Alegre está em estado de alerta devido à iminência de "inundação severa", conforme comunicado…

10 horas ago

Pacheco propõe orçamento de guerra para recuperação do RS

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), sugeriu neste domingo (5) em Porto Alegre a…

11 horas ago

Show de Madonna teve o 5º maior público da história; confira o ranking

Madonna superou os Rolling Stones como atração com o quinto maior público no mundo Até…

11 horas ago