Jornalista portuguesa lança documentário após descobrir que família enriqueceu escravizando negros

Atualizado em 5 de junho de 2023 às 21:55
Catarina Demony com José Lino Neves, os dois em pé e sem posar
Catarina Demony com José Lino Neves, especialista na herança africana de Portugal – Divulgação

A jornalista portuguesa Catarina Demony, de 30 anos, descobriu que sua família materna teve um papel crucial na escravização e no tráfico de povos africanos. A comunicadora ficou sabendo do passado violento de seus parentes em uma conversa informal com a avó, quando tinha 18 anos.

“Não tinha expectativa de que ela me contaria isso e, mesmo quando falou, eu não sabia da dimensão do envolvimento dos meus familiares no comércio de escravizados no Atlântico”, disse, em entrevista ao Ecoa, do UOL.

Catarina disse que saber dar origens de seus antepassados completou um “quebra-cabeça” que havia em sua mente: “Durante a minha adolescência, eu sempre me questionei muito sobre o passado da minha família, porque sabia que, em Angola, ela era bastante abastada, com posses. Sempre me perguntei: de onde vinha esse dinheiro?”.

De acordo com historiadores, a família Matoso de Andrade e Câmara comercializou um grande número de pessoas escravizadas entre os séculos 18 e 19, mantendo as atividades mesmo quando o tráfico foi proibido pela coroa portuguesa.

Bisavó e avó de Catarina Demony falando em cena de documentário
Cena do documentário Debaixo do Tapete – Divulgação

Depois que ficou sabendo de suas origens, a jornalista decidiu transformar a história em um documentário chamado Debaixo do Tapete, lançado neste ano. A obra mistura a narrativa de sua família com a história da escravização e as consequências que isso gerou para Portugal.

Catarina passou 10 anos investigando, juntou documentos de historiadores e do Arquivo Nacional Torre do Tombo, em Lisboa, e entrevistou familiares, como a avó e a bisavó. De acordo com a pesquisa, do soldado Matoso de Andrade, primeiro parente a chegar em Angola, no século 18, a José Maria Matoso de Andrade, último membro da família que trabalhou no tráfico transatlântico, estima-se que dezenas de milhares de pessoas foram escravizadas pelos Matoso de Andrade e Câmara.

“Os arquivos mostram que alguns navios de meus antepassados tinham capacidade de transportar 340 pessoas e foram inúmeras viagens transatlânticas”, disse a comunicadora, que pretende fomentar o debate sobre o impacto da escravização na vida de pessoas negras, principalmente em Portugal.

Após a morte de José Maria, em 1974, logo depois da Revolução dos Cravos, eles deixaram Angola. A jornalista faz parte da primeira geração da família a nascer em Portugal, quando o Estado Novo teve fim e as coroas portuguesas foram libertas.

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