Justiça leva 2 anos para entregar denúncia a bolsonarista invasor do gabinete de Erika Hilton

Atualizado em 6 de outubro de 2023 às 18:09
Erika Hilton

No dia 17 de agosto de 2021, a delegada de polícia Daniela Branco concluiu seu relatório final do inquérito que investigava a conduta de Guilherme Henrique Neles Silva, conhecido nas redes como “Garçom Reaça”.

Ativo bolsonarista e, segundo suas próprias palavras, “combatente da diversidade sexual”, Guilherme foi ouvido na delegacia de polícia e admitiu ser o responsável pela conta de Twitter (já retirada do ar) em que fazia toda a sorte de ofensas contra a então vereadora Erika Hilton (PSOL-SP).

Antes disso, em Janeiro de 2021, “Garçom Reaça” já havia invadido duas vezes o gabinete da parlamentar, então na Câmara dos Vereadores de São Paulo.

O Ministério Público não tardou em acatar o relatório e ofertar denúncia contra o agressor, pelos crimes de racismo (transfobia) e perturbação da tranquilidade (artigo 65 da Lei das Contravenções Penais).

Bastava, então, que um oficial de Justiça entregasse a denúncia ao acusado, seja em sua casa, no local onde trabalhava ou deixando com algum porteiro na residência de Guilherme ou em seu endereço profissional, ambos já conhecidos das autoridades.

Ocorre, porém, que isso nunca aconteceu. É que essas mesmas autoridades jamais conseguiram entregar a tal citação. Segundo os autos judiciais, foram feitas cinco tentativas, todas infrutíferas.

Trecho de relatório final da Polícia Civil que acusava o “Garçom Reaça” de transfobia (equiparado a racismo) e importunação (Crédito Polícia Civil de SP)

Foi só no dia 2 de setembro de 2022, às vésperas da saída de Erika Hilton da Câmara paulistana (ela então concorria – e viria vencer, em outubro de 2022 – a uma vaga na Câmara dos Deputados, em Brasília), que a Justiça publicou em Diário Oficial uma ordem para que o “Garçom Reaça” fosse proibido de voltar a importunar a parlamentar em seu gabinete de vereadora.

Mas a luta para entregar a denúncia ao acusado não parou por ali. Os oficiais de Justiça buscaram por mais um ano inteiro uma forma de tornar “Garçom Reaça” ciente de que seria, a partir dali, processado penalmente pelo crime de racismo e a contravenção de perturbação. Em todas as tentativas, os oficiais alegavam que não tinha ninguém com quem deixar a citação, que ele havia se mudado de residência para endereço desconhecido, que ele não estava mais trabalhando naquele restaurante…

Foram emitidas mais de dez cartas precatórias para que ele fosse citado em outras cidades, onde ele estaria residindo ou trabalhando. Nada adiantou.

Foi só então no dia 20 do mês passado que a Justiça finalmente tomou uma medida para colocar fim à impunidade do réu que se recusava a dar as caras para a Justiça.

Guilherme Henrique Neles Silva, o “Garçom Reaça”

Foi publicada uma citação por edital, considerando o acusado devidamente informado de que, agora, dois anos depois dos crimes que supostamente cometeu, ele finalmente será processado por seus feitos.

Erika Hilton não é a primeira parlamentar de esquerda a ser agredida dentro de seu próprio gabinete e ver passar os anos sem que seu ofensor seja alcançado pela lei.

Recentemente, em entrevista ao DCM, a vereadora de Ribeirão Preto (SP) Duda Hidalgo (PT) contou que, desde que teve início sua campanha ao cargo, em 2020, ela já fez nada menos do que oito boletins de ocorrência por invasão de seu gabinete, ameaças de morte e até de “estupro corretivo” (a vereadora é bissexual assumida).

Veja a última das ameaças, que aliás foi também direcionada em mensagens semelhantes a outras seis parlamentares do país, todas de esquerda:

De acordo com Duda Hidalgo, nenhum dos boletins de ocorrência deu origem a denúncias ou condenações. Para a vereadora, “este é o primeiro fato que estimula essa escalada: a impunidade”.

Que o mesmo não ocorra com os assassinos do irmão de Sâmia Bomfim.