Lula vs. Bolsonaro: extrema-direita se instala e progride, diz Le Monde

Atualizado em 3 de outubro de 2022 às 18:13
Brasil
Resultado do primeiro turno é destaque no jornal Le Monde.

Acompanhado amplamente pela imprensa internacional, o resultado das eleições brasileiras do primeiro turno é o destaque do jornal Le Monde desta terça-feira.

“Brasil: um segundo turno incerto entre Lula e Bolsonaro”, diz a capa da publicação francesa.

“Resultados mostram ancoragem do bolsonarismo na sociedade brasileira, independentemente do resultado presidencial”, aponta.

Contrastes

No Rio de Janeiro, a reportagem principal do periódico descreve um dia de contrastes.

“Estamos bem distantes da efervescência de 2018. Uma multidão esperava o favorito das pesquisas diante de sua seção eleitoral. Mas neste ano, apenas umas trinta pessoas se deslocaram para ver Bolsonaro votar”.

“Eu voto em Bolsonaro porque ele é íntegro, porque ele reativou a economia, preserva a floresta e geriu bem a Covid!”, exalta à reportagem Charles Silva de Souza, paraquedista, eleitor da Vila Militar do Rio de Janeiro.

“Não importa se o crescimento do PIB é meia-boca, se a Amazônia queima, se o coronavírus fez aqui mais de 686 mil mortes e se diversos escândalos de corrupção envolvem os familiares do chefe de Estado”, satiriza a reportagem.

“Entre os bolsonaristas mais fervorosos, reina a desconfiança do voto eletrônico, acusado há anos de fraude pelo presidente de extrema direita, mesmo se o sistema implantado progressivamente desde os anos 1990 sempre funcionou muito bem, inclusive até aqui”, precisa.

“Se tudo acontecer normalmente, Bolsonaro será eleito já no primeiro turno. Ele é hiper-popular. Mas os juízes se comportam como ditadores, recusando-se a nos conceder o voto em papel, ou até mesmo um comprovante, para poder continuar organizando tranquilamente a fraude”, diz o também paraquedista da Vila Militar Lucas Lourenço ao Le Monde.

“Na favela de São Carlos, berço do samba vibrante do centro do Rio, o clima é outro. A pequena multidão vestida de vermelho forma com os dedos um L de Lula”, opõe.

“Bolsonaro não fez nada por nós há quatro anos. Nós estamos todos mais pobres hoje”, afirma Eliane Rodriguez Costa à publicação.

Consolidação e resistência

“Onda ultraconservadora no Congresso e nos Estados da federação”, intitula uma segunda reportagem do jornal francês dedicada às eleições brasileiras.

“Os bolsonaristas conquistaram várias cadeiras e o próximo presidente deverá negociar com um parlamento bastante à direita”, constatam os correspondentes Anne Vigna e Bruno Meyerfeld.

“Independentemente de quem for, o próximo presidente do Brasil deverá governar com um Congresso muito conservador”.

“Para essas eleições, tão fundamentais quanto a presidencial num país federal, a extrema direita se implantou e progride”, analisam. “Diversas figuras do governo de extrema direita ganharam”.

“Mas numa assembleia bastante fragmentada, com cerca de 20 partidos eleitos num pleito proporcional, esse sucesso deve ser relativizado. Na Câmara dos Deputados, o Centrão continua dominando, juntando uma constelação de partidos oportunistas, sem ideologia e geralmente corruptos”, pondera a reportagem.

“O crescimento de certos ultraconservadores é um pouco compensado pela vitória de vários representantes da esquerda progressista”, diz em referência a Marina Silva, Sônia Guajajara, Duda Salabert, Erika Hilton e Guilherme Boulos, “que muitos em Brasília veem como o sucessor de Lula”.

Quanto aos governos dos estados, o jornal de referência da França fala em “subida inesperada”.

“Os aliados de Jair Bolsonaro subiram de modo inesperado e ganharam já no primeiro turno no Acre, no Distrito Federal e no estado de Minas Gerais, segundo colégio eleitoral do país”.

“Mesmo caso do Rio de Janeiro, bastião histórico do clã Bolsonaro. Num momento, a esquerda pensava poder ganhar graças à candidatura do deputado socialista Marcelo Freixo, líder da oposição local”, lembra.

“O atual governador, Cláudio Castro, oriundo do Partido Liberal, foi por muito tempo uma figura impopular, cheio de escândalos de violências policiais nas favelas e vários casos de corrupção que tiraram do cargo seu antecessor, o governador Wilson Witzel, destituído em 2021. Beneficiando-se da onda conservadora, no entanto, ele foi reeleito já no primeiro turno”, observa.