Marco Aurélio Mello mitou ao dizer o óbvio: é golpe. Por Paulo Nogueira

Atualizado em 31 de março de 2016 às 10:30
É golpe: Marco Aurélio Mello, do STF
É golpe: Marco Aurélio Mello, do STF

E quando as esperanças numa Justiça menos brutalmente politizada começavam a se esvair eis que surge Marco Aurélio Mello, insuspeito de petismo, lulopetismo ou qualquer daquelas categorias que a Globo tenta demonizar na sua louca cavalgada de tentar provar o impossível: que o golpe não é golpe.

Mello se ergueu nas sombras, com a coragem que vem faltando a tantos colegas seus na Suprema Corte, e lacrou: impedimento sem fato jurídico transparece a golpe.

Acabou, aí, a discussão.

Não foi Dilma, não foi Lula, não foi o PT que definiu o que está ocorrendo como golpe: foi um ministro que não pode ser acusado de qualquer simpatia pela esquerda ou por suas causas.

A história haverá de prestar a ele o devido tributo.

Você pega um juiz como Gilmar Mendes. Qual é a credibilidade do que ele fala? Nenhuma. É um militante político em toga. Você acredita na isenção dele tanto quanto acredita na isenção da Globo, da Veja, de FHC, Aécio e por aí vai.

Gilmar é uma desgraça para a Justiça brasileira, um escárnio, uma afronta. Um câncer.

Como ele pôde conspurcar o STF com sua conduta vil por tantos anos é uma questão que a posteridade terá que analisar e responder.

Marco Aurélio Mello apareceu como um contraponto devastador a Gilmar. (E também a outros como Celso Mello, autor de uma tragicômica entrevista em prol do golpe para uma militante da extrema direita.)

E ele não fez mais do que o que se espera de um juiz: se comportar como juiz.

Mas na Era de Gilmar e de Sérgio Moro, alimentados em seu partidarismo e sua vaidade pelos holofotes ininterruptos da mídia, isso é coisa rara.

Poucos dias antes de chamar o golpe de golpe, Marco Aurélio Mello já se distinguira por dizer a verdade sobre a delinquência de Moro ao decretar um depoimento sob coerção de Lula.

Sem que Lula tenha recusado um convite para depor, é uma aberração, avisou. Depois que Moro afirmou que era para “proteger” Lula, Mello disse com humor fino e contundente. “Eu não gostaria deste tipo de proteção.”

Também ali ele lacrou. Mitou.

Num mundo menos imperfeito, companheiros de Marco Aurélio Mello se inspirariam nele no esforço vital de devolver a credibilidade destruída à Justiça.

Não é fácil. Credibilidade, como virgindidade, é fácil perder e recuperar, bem, passemos adiante.

Quando alguém, por exemplo, voltará a acreditar na Veja, ou na Globo, depois de tantas barbaridades deliberadamente cometidas?

Mas a Veja e a Globo passarão, e o Judiciário não. Há, sim, que ressuscitá-lo em nome da decência e do bem de todos os brasileiros.

Há, hoje, duas possibilidades.

Ou a Justiça segue o caminho ignóbil de Gilmar Mendes ou envereda pela senda aberta por Marco Aurélio Mello.

Que o bem triunfe e, com ele, o juiz que numa hora de perplexidade se agigantou ao dizer o óbvio: o golpe é um golpe.