Deve estar frenética a movimentação das empresas de consultoria em busca dos clientes da Alvarez & Marsal.
Férias de executivos de contas suspensas, home office cancelados, escritórios de vendas a todo vapor ligando para os atuais clientes da A&M tentando convencê-las do risco que é ter como prestador de serviços uma empresa imprudente que contrata um ex-juiz que está obrigado por um tribunal a prestar contas do dinheiro recebido.
Ataque das hienas. Esse é o nome que se dá no jargão do mercado.
É quando uma consultoria comete alguma falta grave e perde o critério mais importante para sua contratação: a credibilidade.
Posso estar enganado, mas o mais provável é que, antes que a A&M se recupere do susto, empresas concorrentes terão comido importantes nacos de sua carne.
O estrago não é só o pedido do TCU para investigar Sergio Moro, mas também a sequência de constrangimentos a que tem sido submetida desde a inexplicável contratação do ex-ministro de Bolsonaro.
Era evidente que representava um risco mas, por algum estranho motivo, a A&M encarou. Em linguagem de consultoria, a A&M não apenas contratou risco, ela conscientemente colocou para dentro um homem-bomba.
Moro tinha todas as anticredenciais: à época já haviam sido publicadas mensagens capturadas pela Polícia Federal que mostravam que ele era o chefe de uma quadrilha disfarçada de caçadores de corruptos e era fresca a traição ao presidente que ele mesmo elegera.
Além disso, poucos meses depois o plenário do STF ao julgá-lo culpado pelo crime de parcialidade deu todos os motivos para a sua imediata demissão.
Mas a A&M resolveu não demiti-lo e manteve o renitente gerente em seus quadros.
Se é inexplicável a contratação, a não demissão é a prova de que há mais coisas entre o céu e terra do que sonha a nossa vã filosofia.
Como não foi atenta à tempestade que se avizinhava, ou por interesses fora de sua competência não pôde agir contra a tempestade – essa é a condição mais provável – o pesadelo, em forma de questionamento do TCU, veio com a luz do sol; com ele um enorme holofote foi aceso.
E holofote é tudo o que a A&M não quer.
Especializada em revolving door (porta giratória) e acostumada a pescar nos quadros estatais seus colaboradores mais valiosos, a A&M precisa do anonimato para bem exercer suas funções. Grande parte de seus lucros advém de sua habilidade de caminhar sobre o pântano sem afundar, sem deixar marcas de sua passagem.
Por mais cuidadosa que seja uma busca na internet ela nada revelará, não será encontrado nenhum malfeito da A&M. É surpreendente e isso mostra o cuidado e o zelo com que ela se movimenta, sem deixar rastro.
A A&M não corre risco de morrer pois é muito grande, com várias práticas de consultorias, áreas de atuação e clientes mundo afora. No entanto, ela acaba de ganhar um furo no casco e, a menos que a sra. Sandra Sokoloff, relações públicas da A&M, consiga abafar o caso, de agora em diante qualquer pesquisa no Google mostrará a mancha.
No imbróglio do TCU, a A&M não está só e conta com a companhia do próprio ex-ministro do Bolsonaro e, em termos práticos, o pedido fere mais a Moro que a própria A&M.
Para Moro, que vem de uma sequência interminável de derrotas, más notícias e performances deploráveis – como o vídeo de Natal -, valerá o popular “quem não teme, não teme”, mantra do lavajatismo. Para ele se tornou uma questão secundária revelar ou não o quanto ganhou de prêmio da A&M.
Evidencia-se a imoralidade de Moro e aparece a face real do argentário. Ele está na planície.
A solução legal para o questionamento do TCU é óbvia: Moro dirá que, pelo acordo de confidencialidade, não pode revelar o quanto recebeu – leia-se quanto foi a sua parte no butim. A A&M, por sua vez, alegará que é uma empresa americana e que o contratou para trabalhar nos EUA e, portanto, não está obrigada a responder questionamentos de um órgão brasileiro.
Não importa a questão legal, o estrago está feito. Para ambos. Se eles se esconderem atrás de um acordo de confidencialidade, algo havia a ser ocultado.
Entra água no navio da A&M. No universo das pessoas normais, no mundo dos não delirantes, já é possível ver uma hiena correndo atrás do marreco.