Municípios devem deve seguir diretrizes estaduais de combate ao coronavírus. Por Tábata Viapiana

Atualizado em 27 de abril de 2020 às 17:31
Coronavírus. Imagem: Reprodução

Publicado originalmente no Consultor Jurídico (ConJur)

POR TÁBATA VIAPIANA

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) tem seguido uma tendência de julgamento de obrigar municípios a cumprir as diretrizes estaduais de combate ao coronavírus. Em São José dos Campos, Diadema, Sertãozinho e Cravinhos, o Ministério Público ajuizou ações civis públicas contra medidas adotadas pelas prefeituras para flexibilizar a quarentena (prevista para durar até 10 de maio, conforme decreto do governo de São Paulo).

Em São José dos Campos, foi editado um decreto municipal que autorizava o funcionamento parcial de serviços e atividades em geral, como comércios, shoppings, bares, restaurantes e salões de beleza, além de implantar o isolamento social seletivo. O juízo de primeiro grau concedeu liminar para derrubar a medida. A prefeitura recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo, mas não obteve sucesso.

Segundo a desembargadora Maria Olívia Alves, da 6ª Câmara de Direito Público do TJ-SP, conforme a Lei Federal 13.979/20, a norma estadual, ordenada por exigências epidemiológicas e sanitárias, não pode ser contrariada pela norma municipal, sob pena de ofensa às regras constitucionais de distribuição de competências.

“Frise-se, ainda, que da leitura do texto do Decreto Municipal 18.506/20, não se vislumbra o alegado fundamento técnico em que o agravante se embasa para invocar a pretendida prevalência de interesse local a fim de justificar o afastamento da norma estadual, não sendo demais acrescer que tampouco os documentos carreados a este recurso demonstram, de forma inconteste, a probabilidade do direito invocado”, afirmou a desembargadora.

Diadema
O juiz André Mattos Soares, da Vara da Fazenda Pública de Diadema, determinou que o município cumpra integralmente o decreto estadual e todas as disposições das autoridades sanitárias do Governo do Estado e, com isso, suspendeu as atividades e serviços autorizados pelo decreto municipal 7.727/20 que conflitam com as determinações estaduais.

De acordo com o magistrado, o decreto de Diadema incorreu em vício de inconstitucionalidade. Isso porque, conforme o artigo 24, XII, da Constituição Federal compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre previdência social, proteção e defesa da saúde.

“Já aos municípios a competência legislativa é meramente suplementar, conforme dispõe o artigo 30, II, do texto constitucional. O réu, portanto, afronta a repartição constitucional de competências, ao editar ato normativo em desconformidade com as disposições do Decreto Estadual 64.881/2020”, disse. Em caso de descumprimento da decisão, o juiz fixou multa diária de R$50 mil.

Sertãozinho
Por fim, a juíza Daniele Regina de Souza, da 1ª Vara Cível de Sertãozinho, suspendeu as atividades em estabelecimentos privados de serviços não essenciais, cujo funcionamento, ainda que parcial, havia sido autorizado por decreto municipal. Além disso, foi determinado, no caso de descumprimento, multa diária de R$ 50 mil.

Segundo a magistrada, o município não tem autonomia irrestrita para legislar sobre a área da saúde. E, ainda que o tivesse, sempre deve prevalecer a norma que melhor preserve o direito constitucional da saúde. No caso dos autos, a norma a ser seguida, conforme Souza, é a do governo de São Paulo.

“Não me parece, com máximo respeito, que 12 leitos de UTIs sejam suficientes frente a uma população estimada, em 2019, de 125.815 pessoas. É inegável que o município demandará o auxílio do Estado na suplementação de leitos de UTIs, na rede pública, e, atenta ao disposto ao artigo 18, inciso IV, letras “a” e “b”, da Lei 8.080/90 (dispõe sobre o Sistema Único de Saúde), deve se sujeitar a predominância do interesse regional do isolamento do Estado, já que outros municípios da região se socorreram da mesma estrutura”, afirmou.

A juíza reconheceu graves efeitos econômicos causados pela crise no município. Porém, ponderou que,”na colidência de direitos constitucionais, entre eles o direito à liberdade econômica e direito à saúde, deve prevalecer o último”. Além disso, segundo ela, já foi noticiada pelo Governo do Estado a flexibilização das regras da quarentena, a partir do 11 de maio, “de modo que temos um horizonte traçado para o futuro, com preparação de todo o Estado”.

Cravinhos
Em Cravinhos, o juiz Sylvio Ribeiro de Souza Neto, do plantão judiciário da Comarca de Ribeirão Preto, suspendeu um artigo do decreto municipal que flexibiliza as regras de isolamento social para o comércio e outros estabelecimentos da cidade. Foi estipulada multa diária de R$ 100 mil em caso de descumprimento.

“A norma recém editada pelo município de Cravinhos agride o regramento constitucional na medida em que se trata de pandemia e as consequências pelo contágio na população cravinhense não ficam cingidas àquele município, até porque é fato notório que se trata de região inserta na conurbação (em que o centro é a cidade Ribeirão Preto); diariamente os cravinhenses se dirigem a Ribeirão Preto para o trabalho, para os serviços e aqui incluídos os da rede médica hospitalar (referência nacional)”, afirmou o juiz.

Segundo ele, não há pertinência jurídica para o município de Cravinhos desprezar a restrição imposta no âmbito estadual sobre a epidemia. “Todos os entes (municípios, estados e União) precisam se unir e procurar assegurar à população o acesso à saúde, prorrogando ao máximo o tempo da explosão concomitante de contágios e abrandar/achatar a famosa “curva de contaminação/contágios”, tudo com vista ao existir o colapso do sistema de saúde”, completou.