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O choro do agente da ONU que viu o ataque a uma escola em Gaza

 

A cena insólita correu o mundo.

Christopher Gunness, porta-voz da Agência de Obras Públicas e Socorro das Nações Unidas, falava, numa entrevista para a Al Jazeera, sobre uma escola mantida pela organização em Gaza que fora atacada de madrugada pelo exército israelense. Pelo menos 19 pessoas morreram e outras 125 ficaram feridas.

Ex-repórter da BBC, 54 anos, há oito na região, Gunness terminava a conversa com o âncora e se preparava para se despedir. Conseguiu balbuciar que “os direitos dos palestinos, inclusive os de seus filhos, são negados e é terrível…”

Emocionado, tentou prosseguir, até que irrompeu em soluços. Alguém aparece em seu socorro. Com a câmera desviada para outro lugar da sala, ouve-se apenas seu choro.

Gunness diria depois que, “às vezes, há momentos em que as lágrimas são mais eloquentes do que palavras. Mas minhas lágrimas são insignificantes se comparadas às do povo de Gaza. O que está acontecendo, particularmente com as crianças, é uma afronta à humanidade de todos nós. A injustiça de tudo isso é suficiente para fazer qualquer coração explodir”.

O secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon, chamou o atentado de “escandaloso” e “injustificável”. Palestinos buscavam refúgio na escola. Na noite anterior, Netanyahu avisara que a campanha israelense seria “prolongada”.

Israel se comprometeu a pedir desculpas se fosse comprovada sua responsabilidade. “O bombardeio a uma instalação da ONU que está abrigando civis inocentes que estão fugindo da violência é totalmente inaceitável e totalmente indefensável”, declarou um funcionário da Casa Branca.

Palavras, palavras, palavras.

Gunness conta que, no momento em que desabou, não sabia que ainda estava sendo filmado. “Para mim, foi um momento de tristeza privada”, afirma. Ele cobriu três guerras em Gaza. Batalha principalmente pelo fim de um campo de refugiados perto de Damasco. Escreveu uma peça sobre Gaza. Acha que os palestinos são “os verdadeiros despossuídos da Terra”.

Aquilo não foi o choro patético de, por exemplo, uma seleção brasileira. Naquele seu gesto está contido o que o coronel Kurtz chamou de “o horror, o horror”, dito com um olhar “pungente o bastante para penetrar todos os corações que batem na escuridão”.

Chris Gunness chorou pelas crianças e por nós.

Kiko Nogueira

Diretor do Diário do Centro do Mundo. Jornalista e músico. Foi fundador e diretor de redação da Revista Alfa; editor da Veja São Paulo; diretor de redação da Viagem e Turismo e do Guia Quatro Rodas.

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Kiko Nogueira

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