Cinema & Televisão

O episódio de “Black Mirror” que seria útil à minoria de bolsonaristas que sabe ler e escrever. Por Zambarda

Um dos episódios de Black Mirror

Este texto contém spoilers leves

Black Mirror é uma série sobre tecnologia e sobre os medos que existem neste mundo digital.

Cada episódio é uma história separada. O jornalista e humorista Charlie Brooker certamente não imaginava que seu seriado com a Netflix de 2011 iria tão longe, especialmente começando num episódio em que o primeiro-ministro britânico era obrigado a transar com um porco.

Presente de final de ano, a quarta temporada chegou no dia 29 de dezembro e mostrou que a fórmula dá sinais de esgotamento. São seis capítulos de cerca de uma hora, mas somente dois deles trazem mensagens realmente originais.

“USS Callister”, “Crocodile”, “Hang the DJ” e “Metalhead” são mais fracos e abordam realidade virtual, referências a séries nerds como Star Trek, invasão mental, relacionamentos amorosos via aplicativos (como o Tinder) e o fenômeno dos exércitos robôs (que hoje existem nos drones).

Tudo isso já foi visto nas outras temporadas de Black Mirror. Além da repetição, o ritmo tira a graça de assistir. Mas há dois que salvam a quarta temporada.

O primeiro deles é “Arkangel”, que aborda um chip implantado no cérebro de uma criança para que a mãe faça seu monitoramento.

A base da história é assustadora e reflete um dos aspectos mais poderosos de Black Mirror, que é impactar no enredo utilizando tecnologias muito próximas do que temos hoje, em 2018. Jodie Foster dirige.

Mas o grande episódio da temporada chama-se “Black Museum” e ele é o último. Todos os eleitores de extrema-direita e apoiadores de Jair Bolsonaro deveriam assisti-lo.

Nele, uma jovem negra chamada Nish (Letitia Wright) visita um museu de criminologia gerido por um certo Rolo Haynes (Douglas Hodge).

Situado no meio do deserto, o local abriga artefatos de outros episódios de Black Mirror, como o tablet de monitoramento da mãe em “Arkangel” e outros objetos.

Rolo se encanta com a jovem Nish e decide contar sua história. Em pouco tempo você descobre que ele, na verdade, era um empresário especializado em implantes neurais. Para explicar a eficiência do seu trabalho, ele conta três histórias.

A primeira delas é de um médico cirurgião que recebeu um implante cerebral e tornou-se capaz de sentir as dores dos pacientes para fazer os seus diagnósticos. O experimento deixa o médico louco e ele se torna viciado no procedimento.

A mais assustadora é a segunda história. Uma jovem é morta num atropelamento, mas Rolo Haynes consegue salvar sua consciência. O espírito da mulher é transferido para dentro do seu marido e eles passam a viver uma relação sem intimidade e conflito intenso.

Por fim, a última história de Rolo envolve um negro condenado à morte na cadeira elétrica, que tem a sua consciência também salva pelos experimentos.

No entanto, o executivo decide abusar da memória do homem, que era inocente e não tinha cometido crimes, e o recria digitalmente para expor o seu sofrimento.

Rolo Haynes é um homem branco e interiorano. Privilegiado e rico antes de quebrar seu negócio e fundar o museu para lembrar seus feitos, ele abusa de pessoas com problemas psicológicos, de mulheres, de crianças e de negros que são estigmatizados na sociedade.

“Black Museum” rompe o assunto da tecnologia para falar de população carcerária e de crimes cometidos em nome de privilégios sociais.

Bolsonaristas semi alfabetizados deveriam ver e tentar entender o quanto se assemelham às pessoas que elegeram Donald Trump nos Estados Unidos.

Sem dar informações sobre o final, é interessante como ele passa tantas mensagens em histórias claramente macabras. Provavelmente você vai terminar de assistir dando risada do macaquinho que Nish encontra no museu de Rolo.


Pedro Zambarda de Araujo

Escritor, jornalista e blogueiro. Autor dos projetos Drops de Jogos e Geração Gamer, que cobrem jogos digitais feitos no Brasil e globalmente. Teve passagem pelo site da revista Exame e pelo site TechTudo. E-mail: pedrozambarda@gmail.com

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