O heroísmo e o martírio dos Ultras

Atualizado em 1 de junho de 2013 às 18:50
Ultras protestam contra Mubarak, em janeiro de 2011

 

Um dia, durante os protestos que acabaram derrubando o presidente egípcio Hosni Mubarak, policiais montados em cavalos, burros e camelos atacaram ferozmente os manifestantes na célebre Praça Tahrir, no Cairo Este episódio passaria para a história do Egito como “A Batalha dos Camelos”.

 

A multidão foi heroicamente protegida pelos Ultras — como são chamados os torcedores de futebol do Al-Ahly, um dos principais times do Cairo. Acostumados a confrontos com a polícia de Mubarak, os Ultras foram os braços guerreiros dos revolucionários. Isso tudo está registrado num livro recém-lançado no Egito. O nome é Kitab al-Ultras, O Livro dos Ultras, e o autor se chama Mohamed Gamal Besheer.

 

Os Ultras teriam sido vítimas em Port Said de uma armadilha revanchista armada pela mesma polícia que eles combateram na Praça Tahrir?

 

É uma questão que corre o Egito nestes dias. Os Ultras foram a Port Said, situada a 200 km do Cairo, para torcer por seu time. E terminaram massacrados, sob os olhares passivos da polícia. Por que os policiais não fizeram nada? As suspeitas ficam ainda mais fortes porque também ao governo militar interessa minar os Ultras nestes dias em que uma nova onda de protestos toma a Praça Tahrir.

 

Pobre Egito.

 

Tantas comemorações quando Mobarak caiu, há pouco mais de um ano. E tanta frustração agora. “Hoje eu me pergunto se fiz a coisa certa”, relatou um jovem que participou ativamente dos protestos de janeiro de 2011. “Talvez eu devesse ter cuidado da minha vida.”

 

Mubarak foi um pesadelo de 30 anos, mas o que os egípcios vivem hoje depois dele está longe demais de ser um sonho, lamentavelmente. Pouco tempo atrás, a polícia do regime militar atacou manifestantes cristãos, como captaram câmaras. Imagens de carros blindados arremetendo contra a multidão chocaram o mundo. Depois, contra todas as evidências, o governo militar alegou que os cristão é que foram os agressores. Essa mentira complicou ainda mais a convivência entre os muçulmanos e os cristãos. Numa escola, um professor perguntou aos pequenos alunos o que os islâmicos deveriam fazer com os cristãos. “Matá-los”, respondeu um garoto. Sua justificativa foi a versão oficial do regime — os cristãos teriam investido contra a polícia no curso de um protesto contra a maioria islâmica.

 

É uma pena, mas a Primavera Árabe – veja a Líbia pós-Gadaffi – está lenta, gradual e seguramente se transformando num Inverno.