O que acontece com a Soninha?

Atualizado em 20 de outubro de 2012 às 17:01

O problema dela não é o destempero e sim um quadro agudo de esquizofrenia política

“Sustento o que fiz. Xinguei. Não devia. Apaguei"

Soninha chamou Fernando Haddad de filho da puta em seu blog, numa diatribe antipetista sobre o debate na Band. Questionada, primeiro declarou: “Tava morrendo de raiva. Vou apagar”. Apagou. E emendou, depois, através do serviço Ask.fm, em que ela passa o dia respondendo perguntas (diga-se em sua defesa que responde a todas, inclusive as mais ofensivas). “Sustento o que fiz. Xinguei. Não devia. Apaguei. Não passou a vontade de xingar, o que penso sobre a conduta deles, mas nem todas as palavras que a gente pensa e diz em uma conversa devem ser escritas”. Ela trocou o xingamento por “MUITO cinismo”.

Soninha pisou na bola. Acontece. Perdeu a cabeça. Há alguns meses, ela deu uma declaração infeliz sobre um problema no metrô paulistano, em que milhares de pessoas foram afetadas. Soninha tascou que estava tudo “sussa”. “Muito louco”, completou.

O que aconteceu com Soninha? Ela é uma serrista de longa data. A questão, porém, é outra: Soninha, hoje, ocupa uma posição política esquizofrênica. Ela é vendida como “alternativa”, com todos os sinais de “modernidade”: usa o Twitter ininterruptamente; tem um blog (coordenou a internet de Serra, aliás, na campanha presidencial); recicla lixo; é budista; posou nua numa bicicleta; apóia a descriminalização da maconha; abusa de gírias e palavrões.

No calendário cicloativista

Mas, na prática, se alinha com o que há de mais conservador (segundo Fernando Henrique Cardoso) na sociedade. Não dá para acreditar que sua motivação seja dinheiro ou qualquer vantagem espúria. Seja o que for, definitivamente, Soninha não representa novidade nenhuma. O bonde passou. Ela faz o jogo político tradicional e com muito gosto.

Precisa ser assim? Ela poderia se espelhar, eventualmente, no Partido Pirata Alemão, com representação em três estados do país. Um dos líderes, Matthias Schrade, diz que eles querem tirar o poder das mãos dos políticos e devolvê-lo aos cidadãos comuns. “Nós oferecemos transparência, nós oferecemos participação”, afirma. Marina Falkvinge, diretora do partido, causou sensação este ano pelo frescor das ideias. O Diário falou dela.

Soninha tem 45 anos e três filhas. Nasceu em Santana, bairro de classe média de São Paulo, e foi VJ da MTV nos anos de ouro da emissora, entre 1990 e 2000. Cristalizou uma imagem de porta-voz dos jovens. Elegeu-se vereadora pelo PT em 2004 e saiu do partido em 2007.  Foi subprefeita da Lapa em 2009, já no PPS. No ano passado, assumiu a chefia da Sutaco, Superintendência do Trabalho Artesanal, uma autarquia ligada ao governo de São Paulo.

Nesse tempo todo, não se ouviu falar de uma ideia renovadora, de uma proposta diferente que tenha vindo dela. Está longe de ser uma idiota e não é, até onde se saiba, corrupta. É articulada, inteligente. Mas, se você acredita que ela seja uma opção aos velhos partidos só porque anda de bike e come arroz integral, está na hora de rever seus conceitos — já que os dela estão, infelizmente, enraizados no século passado.

UPDATE

– Haddad afirmou que não vai entrar na Justiça contra Soninha Francine. “Saiu a informação de que minha área jurídica estaria entrando com uma ação. Não quero nenhuma ação dessa natureza“, afirmou ele, que atribuiu o xingo a um “ato impensado”. O candidato do PT disse que não quer “fazer uma discussão na última semana. Não vamos tomar medida nesse sentido”.

– Soninha escreveu sobre os empregos de seus familiares no governo do estado pelo Ask.fm (leia o post do Fratello Paulo Nogueira, bom jornalista que é, sobre transparência). Ela se esqueceu de mencionar uma filha que dá expediente na Secretaria de Cultura.

“Não arrumo emprego para ninguém, mas há alguns anos minha filha trabalha na Secretaria do Meio Ambiente (estadual) e minha mãe, no depto de línguas estrangeiras da Secretaria Estadual de Educação. Mérito delas, não nomeei, não indiquei, e volta e meia elas tem vontade de sair porque amam o que fazem, se matam, mas trabalhar no governo é muito duro. São muito competentes. Confie na minha palavra não, pode ir atrás, investigar. Ah, e trabalhar sem concurso público é da natureza da administração pública – tem os funcionários “permanentes”, concursados, efetivos, e aqueles que são escolhidos e nomeados para as funções de livre provimento. Podem ser honestos ou não, competentes ou não, e isso exige fiscalização permanente. O que vale TAMBÉM para os concursados. Mas dispensar um concursado por incompetência e desonestidade é difícil pra cac.” (sic)