Suspeito de receber propina da máfia das merendas, o presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, Fernando Capez (PSBD), utilizou um expediente inusitado e revelador para se defender das acusações.
Em entrevista ao blog de Fausto Macedo, do Estado de São Paulo, Capez, que é promotor de Justiça, pediu que comparassem o seu perfil com o do seu ex-assessor Jeter Rodrigues Pereira, denunciado no esquema de superfaturamento da merenda escolar.
“Você já viu o perfil do Jeter? Olha o meu perfil e olha o perfil dele: está com pneumonia, cheio de dívidas, mora em uma favela, tem quarenta anos, e está prestes a se aposentar. Se um cara tem a chance de fazer uma jogada e, sei lá, ganhar 50 paus por mês, a chance de ele fazer isso é maior”, disse Capez.
Sob esta lógica, que lembra as ideias racistas e classistas do cientista Cesare Lombroso, o fato de um indivíduo ser pobre e morador da periferia o torna automaticamente mais propenso a cometer deslizes.
Em entrevista à Folha, Jeter Rodrigues, demitido em dezembro do ano passado, disse que está com dificuldades financeiras, tendo penhorado o Palio 2001 e recorrido a um empréstimo consignado de 10 mil reais para pagar dívidas.
Um link do UOL com os candidatos da eleição de 2008 mostra que Rodrigues informou à justiça eleitoral que na época não possuía nenhum bem a declarar.
No sentido oposto está o perfil de Capez, divulgado na sua página oficial. É procurador de justiça desde 1988, quando foi aprovado em primeiro lugar, autor de livros nas áreas de Direito Penal e Processual Penal, e deputado estadual desde 2006. Na declaração de bens apresentada à justiça eleitoral nas eleições de 2014 consta um patrimônio de R$ 4.960.727,40.
Enfim, um perfil acima de qualquer suspeita, pelo menos de acordo com a ideia que ele deixou escapar na entrevista.
O pensamento expresso por Capez é do mesmo tipo do que produz manchetes jornalísticas mais amenas quando os envolvidos são brancos e de classes mais abastadas. Nesses casos, um grupo de rapazes detidos com 300 de maconha é identificado como “jovens de classe média”.
Quando a apreensão é na periferia, o envolvido é logo identificado pela reportagem como “traficante”.
O que impressiona é ver um parlamentar, membro do Ministério Público e doutrinador, que deveria se ater a fatos e evidências concretas, usar um preconceito mixuruca para se defender.
Se a moda pega, daqui a pouco veremos advogados invocando o “perfil” do cliente ao defender banqueiros, empreiteiros e parlamentares envolvidos nas maracutaias de sempre.
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