Onde está Eduardo Cunha e por que ele deu entrevista à Época. Por Kiko Nogueira

Atualizado em 3 de outubro de 2017 às 19:12

O editor chefe da Época, publicação da Editora Globo, foi quem levantou a bola no dia 30 de setembro.

No Twitter, onde é hiperativo e auto referente como João Doria, Diego Escosteguy escreveu que a entrevista de Eduardo Cunha, capa da semana, “não foi concedida na Papuda nem em qualquer local do sistema prisional”.

Onde, então?

Nos últimos dias, o paradeiro de Cunha virou assunto nas redes sociais. O deputado federal Paulo Pimenta, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, questionou a Procuradoria Geral da República na tarde de segunda, dia 2, sobre o parlamentar cassado.

Mais de 15 horas depois, uma resposta de Mara Elisa De Oliveira, chefe de gabinete da PGR Raquel Dodge: “Ela falou que, se não houver nenhum impedimento ou sigilo, a assessoria criminal da PGR vai comunicar a assessoria de comunicação e então alguém vai me ligar”, diz Pimenta.

Às 15h29 de terça, Mara enviou um email ao parlamentar, afirmando que Cunha “está preso na Delegacia de Polícia Especializada da Polícia Civil”.

“A transferência dele para Brasília, ocorrida no dia 15 de setembro, se deu em virtude de uma decisão do magistrado de Brasília [Vallisney Oliveira], que atendeu pedido da defesa, para que Eduardo Cunha acompanhasse — de Brasília — depoimentos de testemunhas e participasse pessoalmente do próprio interrogatório marcado para o mês de outubro”, diz Mara.

Cunha foi condenado a 15 anos e 4 meses de cana. Seu endereço no momento é a Divisão de Controle e Custódia de Presos da Polícia Civil, DCCP.

Ou seja, a entrevista foi, sim, numa instância do “sistema prisional”.

De acordo com o site da instituição, somente recebem visitas os internos que lá estão em razão do não pagamento de pensão alimentícia e de mandado de prisão temporária.

Quem autorizou?

De acordo com a assessoria do DCCP, a conversa “foi concedida no âmbito da Vara Federal, por intermédio dos advogados de Eduardo Cunha” e “no âmbito da Justiça”.

Cunha tem tido um tratamento, digamos, especial em relação a outros detentos da Lava Jato. Não foi obrigado a cortar o cabelo, não foi fotografado careca como Eike Batista — e fala com jornalista do grupo Globo.

Sérgio Cabral, por exemplo, foi proibido pela Justiça Federal de dar depoimento a veículos de comunicação. A decisão do desembargador federal Abel Gomes, da Primeira Turma Especializada do TRF2, é a mesma da primeira instância de Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, no Rio.

A capa de Cunha na Época teve repercussão nula. É mais um blablabla de um homem que calcula tudo. Mas o recado a quem interessava foi dado.

Segundo reportagem do Globo, foi positiva para Temer pelo fato de EC “ter declarado que o ex-procurador-geral da República Rodrigo Janot queria que ele mentisse para incriminar o presidente”.

Relata o jornal:

A avaliação foi feita por um dos participantes das reuniões de ontem no Palácio do Jaburu, onde foi discutida a estratégia de defesa de Temer diante da segunda denúncia contra ele, que começou a tramitar na Câmara. Para esses aliados, este é mais um elemento que reforça a fragilidade da denúncia apresentada por Janot.

— O presidente Temer nunca esteve tão tranquilo — disse um interlocutor.

É evidente que Eduardo Cunha (que nunca é apenas Cunha, é multidão) usou a revista — ainda que Escosteguy tente vender o peixe de um “furo” para sua plateia de otários.

Cunha “preso”

Num artigo intitulado “Vigaristas do bem”, o jornalista Márcio Chaer, dono do site jurídico Conjur, escreveu que “a exaltação aos protagonistas do fenômeno apelidado Operação Lava Jato não faz justiça a um herói quase anônimo dessa história: os jornalistas, que deixaram a cômoda posição de meros observadores para se tornarem participantes ativos do processo.”

Segundo Chaer, “os profissionais mais valorizados do mercado são os que têm relações com procuradores. O preço: divulgar a informação oficial como verdade absoluta. Os jornalistas que integram a ‘força-tarefa’ são os roteiristas”.

Na madrugada de 4 de março de 2016, dia da coercitiva de Lula, Escosteguy postou no Twitter: “Quase duas da manhã. Poucas horas para um amanhecer que tem tudo para ser especial, cheio de paz e amor”.

Mas ele ficou famoso, de fato, por uma cascata vexaminosa. Foi em 2014 e o então presidente do STF Joaquim Barbosa contou o que houve numa carta à redação.

“A matéria ‘Não serei candidato a presidente’ divulgada na edição nº 823 dessa revista traz em si um grave desvio da ética jornalística. Refiro-me a artifícios e subterfúgios utilizados pelo repórter [Escosteguy], que solicitou à Secretaria de Comunicação Social do Supremo Tribunal Federal para ser recebido por mim apenas para cumprimentos e apresentação”, afirma.

“Fora o condenável método de abordagem, o texto é repleto de erros factuais, construções imaginárias e preconceituosas, além de sérias acusações contra a minha pessoa”, prossegue.

“No campo pessoal, as inverdades narradas na matéria são ainda mais ofensivas e revelam total desconhecimento sobre a minha biografia. Minha mãe nunca foi faxineira”.

Etc etc.

Diego Escosteguy lamentou os “erros factuais, mesmo os pequenos”. “Falo apenas por meio do jornalismo que busco, com muitas imperfeições, produzir para vocês”, escreveu, como se estivesse num show de pagode.

Cunha, por sua vez, não erra uma. E conta com a mídia amiga para fazer seus acertos.