Pai de Weintraub se diz vítima da ganância dos filhos e tem que provar na Justiça que não é louco

Atualizado em 22 de agosto de 2020 às 2:28
O médico Mauro Salomão Weintraub. Ele teve que provar que não está louco (Fonte: CRM-SP)

O médico psiquiatra e ex-professor da Faculdade de Medicina da USP Mauro Salomão Weintraub, pai do ex-ministro da Educação e atual diretor do Banco Mundial, Abraham Weintraub, foi obrigado por seus filhos a se submeter a uma perícia judicial para provar que não sofre de qualquer tipo de demência senil que lhe impeça de gerir o próprio patrimônio. Segundo ele, que demonstrou em juízo gozar de suas plenas faculdades mentais, “é a ganância dos filhos que os afastou da família”.

Aos 74 anos de idade, o médico, que já foi preso por criticar o regime ditatorial instalado no Brasil em 1964, vive uma batalha jurídica de quase dez anos, em processos movidos pelos próprios filhos, Abraham e Arthur, o segundo também empregado do governo federal. O motivo é o patrimônio do pai, que os litigantes querem ver preservado até que ele morra.

Para tanto, já moveram e movem diferentes processos, seja para interditar judicialmente o pai, alegando “conduta indicativa de ausência de discernimento” (em outras palavras, insanidade mental), seja para impedir a doação de imóveis para a atual esposa, com quem vive há 24 anos, alegando que isso fere seus direitos expectativos como herdeiros do que é de seu pai.

No processo número 0033871-32.2011.8.26.0100, da Terceira Vara da Família e Sucessões em São Paulo, por exemplo, os filhos tentam a interdição do pai, para que ele não possa transferir para a esposa qualquer bem ou valor de sua propriedade.

No dia 31 de janeiro de 2012, Mauro Salomão Weintraub submeteu-se a um interrogatório na Justiça para provar sua sanidade.

 

Cabeçalho do Termo de Interrogatório a que Mauro Salomão Weintraub foi submetido para provar que não está louco (Fonte: TJ-SP)

Perante o juiz do caso, advogados e testemunhas, teve que responder a perguntas do tipo, “o senhor sabe onde está?”, ou “que dia é hoje?”, ou ainda “quem é o prefeito de São Paulo?”. Explicou também que dificilmente seria louco, já que era médico em pleno exercício da profissão, além de dedicar-se a inúmeras outras atividades, como pintura (com quadros expostos no Museu da Faculdade de Medicina da USP), administrador de fundos próprios no mercado financeiro (home broker) e único conselheiro de seu condomínio.

 

Pai de Abraham Weintraub provou na Justiça que sabia quem era o prefeito de São Paulo em 2012 (Fonte: TJ-SP)

O que leva, então, seus filhos a sustentarem na Justiça que o senhor deve ser interditado, senhor Weintraub?, questionou o juiz do caso. O médico respondeu que via um só um motivo: “a ganância”. Contou também à juíza e aos demais presentes que um de seus filhos – Arthur ou Abraham – lhe dissera que sua esposa “iria largá-lo na miséria e que eles filhos teriam que sustentá-lo” (sic).

 

Filhos de Mauro Weintraub diziam que pai seria abandonado na miséria (Fonte: TJ-SP)

As declarações são de 31 de janeiro de 2012. Mauro Weintraub e sua esposa estão juntos até hoje.

O interrogatório em questão foi parte de uma perícia técnica realizada a mando da Justiça no médico psiquiatra. Tanto o perito técnico judicial quanto o Ministério Público de São Paulo – de acordo com parecer anexado ao processo – atestaram a completa sanidade e domínio das faculdades mentais de Mauro Salomão Weintraub.

No dia 16 de abril de 2014, o juiz Rui Porto Dias sentenciou em desfavor dos filhos, afirmando que o médico não era o louco. As primeiras linhas de sua fundamentação resumem o que se apurou, como se pode ver abaixo.

 

Sentença de 16 de abril de 2014: Mauro Weintraub não é louco (Fonte: TJ-SP)

Mas os irmãos Weintraub não se deram por vencidos. Continuaram chamando o pai de louco na segunda e na terceira instância (STJ), perderam todos os recursos que esgrimaram, e o processo foi extinto em novembro de 2017.

 

Quanto vale essa loucura?

Em outro processo movido por Abraham e Arthur (número 0165853-72.2011.8.26.0100, na 5ª Vara do Foro Central Cível de SP), a dupla alega que o pai estaria passando bens demais para o nome da esposa, e que isso estaria dilapidando seu direito futuro (expectativo) à herança, como filhos legítimos do médico e de sua falecida primeira esposa, que deveria ser de, no mínimo, 50% do valor do patrimônio do pai, conforme garantido por lei.

Por causa disso, Mauro Salomão Weintraub teve que explicar, em 2012, a sua situação financeira e familiar a advogados, juiz, promotores, testemunhas e oficiais de Justiça, além de fazê-las constantes em documentos públicos. Explicou que os valores envolvidos não correspondem a cifras acima das permitidas em lei, entre outras peculiaridades do caso:

É casado pelo regime de separação de bens há 16 anos. No ano de 2002, para proteger financeiramente sua esposa, doou-lhe duas lojas situadas no bairro do BomRetiro, uma loja no bairro da Lapa, um imóvel em que funcionava seu consultório, além do apartamento onde o casal reside atualmente.

Apesar de tais doações reservou-se os bens mais valiosos provenientes da herança de sua genitora. Os valores investidos no Banco Votorantin também foram preservados. Mantém junto ao banco certificado de renda imobiliária da empresa Gafisa, no valor aproximado de R$ 300.000,00, além de renda fixa no valor de cerca de R$ 900.000,00. Mantém ainda conta corrente e aplicação a ela vinculado no Banco Citibank, no valor de cerca de R$ 200.000,00. 

Descrição de bens que Mauro Salomão Weintraub teve que apresentar na Justiça, sob demanda dos filhos (Fonte: TJ-SP)

Esse processo, que teve origem em 2011, ainda não acabou, está correndo entre as instâncias da Justiça, ao gosto dos recursos dos irmãos Weintraub. O médico e pintor de 74 anos, ao que parece, terá que lutar até a morte pelo direito de decidir o que será feito de seu patrimônio após a morte.