Para abrigar aliado em Madri, Bolsonaro atropela diplomacia e constrange a PF. Por Leandro Fortes

Atualizado em 22 de fevereiro de 2023 às 15:25
Márcio Nunes de Oliveira será adido policial federal na embaixada do Brasil em Madri
Imagem: Reprodução/Ministério da Justiça

Publicada, sem alvoroço, no Diário Oficial da União, a nomeação do delegado de Polícia Federal Márcio Nunes de Oliveira para o cargo de adido policial junto à Embaixada do Brasil em Madri, na Espanha, causou grande rebuliço. Diretor-geral da PF, Oliveira foi a quinta indicação de Jair Bolsonaro para o cargo – e o mais fiel tarefeiro que o presidente da República teve dentro da corporação. Em menos de um ano na função (ele tomou posse em março), o diretor-geral operou o afastamento de pelo menos dois delegados com atuações incômodas para o governo e foi acusado, inclusive por colegas, de ter instrumentalizado a PF para ajudar na fracassada reeleição de Bolsonaro.

A nomeação de Márcio Oliveira foi assinada, além do presidente, pelos ministros da Justiça, Anderson Torres, também delegado da PF e de quem Oliveira havia sido secretário-executivo, e das Relações Exteriores, Carlos França. Um conluio montado, no apagar das luzes do pior e mais desastroso governo da história da República, para mandar para fora um aliado que, sob pressão no Brasil, poderia tornar a vida de Bolsonaro ainda mais complicada. Para tocar essa operação a toque de caixa, o trio armou uma confusão inédita, em Madri.

Isso porque, sem nenhum planejamento, foi preciso, primeiro, exonerar o atual adido policial da embaixada madrilenha, o delegado Delano Cerqueira Brun, dentro de um arranjo burocrático inusitado. Para ceder lugar a Márcio Oliveira, Brun foi rebaixado ao cargo de oficial de ligação, também na embaixada, com redução de salário e passará a ser subordinado à função que exerceu por três anos – tempo de mandato da adidância policial, no exterior. Tudo feito à revelia das necessidades reais do Itamaraty e sob constrangimento geral da Polícia Federal, a 11 dias do fim do governo Bolsonaro.

O decreto que tornou sem efeito a dipensa de Delano Cerqueira Bunn. Reprodução D.O.U. de 23/12/2022

Todo esse esforço visa recompensar a fidelidade total de Márcio Oliveira a Bolsonaro, no comando da Polícia Federal. Em maio deste ano, dois meses depois de assumir, Oliveira exonerou o delegado Hugo de Barros Correa do cargo de superintendente da Polícia Federal no DF, defenestrado por não conduzir, da maneira que queria o presidente, os inquéritos que investigam a participação de Jair Renan Bolsonaro, o filho 04, em esquemas de desvio de recursos no Ministério da Saúde e de produção de fake news.

No mesmo período, o diretor-geral afastou o delegado Luís Flávio Zampronha, responsável por coordenar a Diretoria de Investigação e Combate à Corrupção da PF, e por conduzir as investigações que apuravam a máquina de fake news bolsonarista e o financiamento de atos antidemocráticos. Cabe ao setor também investigar parlamentares suspeitos de desvio de dinheiro público, o que inclui tanto Bolsonaro como os filhos Carlos, vereador no Rio de Janeiro, e Flávio, senador da República acusado de comandar um esquema de peculato na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, a famosa “rachadinha”.

Em Madri, Márcio Oliveira vai ganhar um salário de 16 mil dólares (cerca de R$ 83 mil) mensais, nos próximos três anos. Sem contar as mordomias.

Valeu a pena.

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