Câmara decide urgência de projeto que censura uso do termo Bíblia fora de contexto

Atualizado em 10 de março de 2022 às 16:56
Pastor Isidório, na tribuna, segurando uma Bíblia
Caso aprovado, o mérito do projeto pode ser votado na Câmara sem a necessidade de tramitar pelas comissões. Foto: Divulgação/Câmara dos Deputados

Mais uma vez a homofobia parece assombrar a política brasileira, ainda que disfarçada de um suposto cuidado com os textos sagrados. Dessa vez, um projeto de autoria do deputado Pastor Sargento Isidório (Avante-BA), quer votar, com urgência, a proibição e criminalização do uso da palavra “Bíblia” e da expressão “Bíblia sagrada” fora do contexto aceito pelas religiões. 

Na prática, ele quer proibir a venda, no Brasil, do livro “The Queem James Bible”, publicado há quase dez anos, que reescreve oito versículos para, segundo os autores, eliminar a homofobia e “permitir que seus verdadeiros significados brilhem”. Agora, um requerimento assinado por 16 partidos da direita à esquerda pede a tramitação do projeto em caráter de urgência. A votação deve ocorrer nesta quinta-feira (10).

“Fica terminantemente proibido os termos ‘Bíblia’ e/ou ‘Bíblia Sagrada’ em qualquer publicação impressa ou eletrônica de modo a dar sentido diferente dos textos consagrados há milênios nos livros, capítulos e versículos utilizados pelas diversas religiões cristãs já existentes, seja católica, evangélica ou outras mais que se orientam por este livro mundialmente lido e consagrado como Bíblia”, diz o primeiro artigo do projeto.

O projeto também pretende alterar o Código Penal ao estabelecer, como punição, o enquadramento nos crimes de estelionato (pena de 1 a 5 anos de prisão) e de discriminação religiosa (até um ano de prisão).

O requerimento de urgência foi assinado em dezembro por líderes das bancadas do Avante, MDB, Patriota, PSC, PTB, PL, Solidariedade, PSB, PSD, PT, PC do B, Republicanos, PSDB, Podemos, PP, Dem e PSL (esses dois últimos se fundiram no União Brasil). Caso aprovado, o mérito do projeto pode ser votado na Câmara sem a necessidade de tramitar pelas comissões. O texto que solicita a tramitação a jato é assinado por partidos da direita à esquerda.

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Saiba mais sobre a chamada “Bíblia Gay”

A bíblia “gay-friendly”, escrita em inglês, pode ser encontrada à venda no site da Amazon por R$348,96 e seus autores não admitem a hipótese de estelionato religioso. 

Muito pelo contrário. Segundo eles, não se trata de uma nova versão das sagradas escrituras e sim apenas da inclusão de interpretações que existiriam há muito tempo. Nesse sentido, o objetivo da “The Queem James Bible” seria apenas popularizar tais interpretações.

“A homossexualidade foi mencionada pela primeira vez na Bíblia em 1946, na Revised Standard Version. Não há menção ou referência à homossexualidade em qualquer Bíblia anterior a esta – apenas interpretações foram feitas. As interpretações bíblicas anti-LGBT geralmente citam apenas oito versículos na Bíblia que eles interpretam como significando que a homossexualidade é um pecado; Oito versículos em um livro de milhares!”, escreveram.

Para o autor do projeto, no entanto, retirar, do texto bíblico, as referências que condenam o homossexualismo “seria uma verdadeira heresia e total desrespeito às autoridades eclesiásticas”, escreveu.

“Uma vez aberto o precedente para que haja um livro corporativista com nome (apelidado) bíblia gay ou de nomenclatura similar, em pouco tempo surgirá também outros livros apelidados de bíblia para outros segmentos de pecadores, a exemplo: homicidas, adúlteros, prostitutos, mentirosos etc. Ou seja, livros chamados de bíblia para livrar todo tipo de pecadores”, afirmou Isidório na justificativa ao projeto.

Ao justificar o texto, no entanto, não há qualquer menção ao fato de que a homofobia é crime no Brasil, equiparável ao racismo, desde 2019.