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Quanto mais espaço Bolsonaro tem na mídia, mais Alckmin comemora. Por Joaquim de Carvalho

Em depoimento para um projeto da Fundação Getúlio Vargas, organizado por Maria Celina D’Araújo e Celso Castro, o general Ernesto Geisel, que governou o Brasil durante a ditadura militar, foi questionado sobre a relação dos militares com a política depois da redemocratização.

Disse ele:

“Os militares devem ficar fora da política partidária.”

Em seguida, explica qual é, na visão dele, o papel das forças armas — “devem estar sempre preparadas para poder fazer a guerra” — e conta que civis, em qualquer tempo, costumam bater na porta de quartel em busca de interferência na política.

A entrevista foi feita em 1993 e ele dizia que, naquele momento, já tinha gente dizendo: “Temos que dar um golpe! Temos que derrubar o presidente! Temos que voltar à ditadura militar!”

E aí ele cita Bolsonaro, que foi capitão do Exército e tinha sido eleito deputado federal:

“E não é só Bolsonaro. Tem muita gente no meio civil que está pensando assim. Quantos vem falar comigo, me amolar com esse negócio: ‘Quando é que o Exército vai dar o golpe? O senhor tem que agir, é preciso voltar!’ São as vivandeiras!”

Vivandeiras eram as mulheres que acompanhavam o Exército na Guerra do Paraguai— algumas apenas lavavam roupas, outras faziam mais do que isso, e gostavam de estar sempre por perto.

São as novas vivandeiras que fazem campanha por intervenção militar e espalham pelo interior cartazes em que promovem o nome de Bolsonaro.

É minoria, mas em número suficiente para fazer barulho. Foram eles que atacaram a caravana de Lula pelo Sul do País, em abril.

A entrevista de Geisel e os episódios recentes mostram que sempre estiveram por aí. Mas, nos últimos anos, com o jornalismo de guerra para derrubar Dilma, perderam a vergonha, e saíram às ruas.

Por isso, os bolsominions podem ser considerados os filhos do casamento da velha imprensa com a Lava Jato, e isso explica por que se notabilizam pela agressividade e ignorância, pelo vale-tudo.

Na entrevista a Maria Celina e Celso Castro, Geisel acreditava que o desenvolvimento do Brasil faria diminuir essa relação entre política e militares.

E cita Bolsonaro como exemplo de que o Brasil seguiria por outro caminho:

“Presentemente, o que há de militares no Congresso? Não contemos o Bolsonaro, porque o Bolsonaro é um caso completamente fora do normal, inclusive um mau militar”.

Pelas entrevistas que deu, pode-se ver que Bolsonaro é também um mau deputado e trabalha pouco.

Mas, para seus eleitores, como lembrou Kiko Nogueira em artigo no DCM, isso não faz a menor diferença.

Os eleitores de Bolsonaro são o lado extremo do eleitorado que tem medo da democracia porque, em última análise, democracia tem o poder de mudar a face do Brasil.

Porque democracia inclui os pobres, gente que a elite brasileira, convenientemente, sempre tentou manter fora do jogo democrático, como lembra o sociólogo Jessé Souza —  o que faz da democracia brasileira, salvo raros períodos, uma farsa.

Os bolsominions, é preciso ressaltar, não são elite, se concentram em setores expressivos da classe média, os mesmos que idolatram Deltan Dallagnol e Sergio Moro.

Não são ricos, mas agem como se fossem, daí porque podem ser considerados como a tropa de choque da elite. Ou seus capatazes.

Vomitam conceitos como meritocracia sem se darem conta de que, na estrutura de poder do Brasil, sempre tiveram mais oportunidades que as classes populares.

A existência de pobres é que lhes dá alguma identidade, como se a existência deles justificasse o pouco que têm.

“Tenho porque fiz por merecer”, devem pensar.

São uma farsa, como farsa é tudo que defendem, inclusive a de que Bolsonaro é o político que vai dar jeito no Brasil.

Bolsonaro, como mostra seu histórico, é um homem que só quer se dar bem na política, e nisso, alimentando seu eleitorado com as asneiras que diz, tem tido sucesso.

No certo sentido, Bolsonaro tem méritos, ao contrário dos seus eleitores. O candidato ideal para quem gosta de ser enganado.

Por outro lado, ele está longe de ser o único que atende a esse tipo de eleitor. Só é o mais agressivo e, paradoxalmente, verdadeiro.

Ao se mostrar como é, Bolsonaro perde a chance de conquistar os eleitores que têm o mesmo horror a pobres, mas mantêm o verniz de democratas.

Daí porque é um engano pensar que o desastre protagonizado por Bolsonaro no Roda Viva agradou apenas aos progressistas.

Quem mais gostou foi, certamente, a elite que apoia Geraldo Alckmin e tenta fazer dele o próximo presidente da república.

Enquanto bolsominions se comportam como o serviçal de chicote na mão querendo agradar o patrão, a elite adula Alckmin, que, no governo federal, não faria nada muito diferente de Bolsonaro —só que seria mais dócil e passaria a impressão de que é de centro.

Pode ter certeza de há uma fila de veículos da velha imprensa querendo entrevistar Bolsonaro. Quanto mais se expõe, mais ele se mostra desqualificado e joga água para o moinho de quem quer Alckmin presidente.

Na quinta-feira, Bolsonaro vai ser entrevistado pela Globonews.

Os apoiadores de Alckmin já devem ter comprado pipoca e refrigerante.

Joaquim de Carvalho

Jornalista, com passagem pela Veja, Jornal Nacional, entre outros. joaquimgilfilho@gmail.com

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Joaquim de Carvalho

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