Renato Cariani e a presunção de inocência que vale só para quem tem privilégios. Por Luan Araújo

Atualizado em 12 de dezembro de 2023 às 19:02
Renato Cariani. Foto: Reprodução

Presunção de inocência. Esse princípio jurídico, apesar de estar no código penal, é pouco utilizado no país em que vivemos. Essa presunção só é pedida para certos grupos sociais. Normalmente brancos, com dinheiro e com posses. Para quem não tem nada disso, a coisa fica um pouco mais complicada.

O privilégio está nas mãos de gente como o influencer fitness Renato Cariani, de 47 anos, que abraça todos os elementos do cidadão de bem, bem-sucedido e espelho para os meritocratas de plantão.

Dono da Anidrol, empresa especializada em fabricação e comercialização de produtos para laboratórios, tem mais de 7 milhões de seguidores no Instagram e 6 milhões no Youtube. Se define como professor de química, professor de educação física, atleta profissional, empresário e youtuber. Seus conteúdos falam sobre o mundo da dieta e o culto ao corpo (normalmente em patamares inalcançáveis para a grande maioria da população).

Rico, com um corpo deformado, empresário milionário e, claro, apoiador confesso do ex-presidente Jair Bolsonaro. Cariani é ídolo de muita gente que se espelha em algo que a classe trabalhadora comum não pode alcançar.

Tudo isso, poderíamos imaginar, poderia ir abaixo com a revelação da operação da Polícia Federal deflagrada nesta terça-feira (12), em que Cariani e a Anidrol eram os principais alvos da acusação de desvio de produto químico usado na produção de crack.

Produto químico usado para produzir o crack. Foto: Divulgação/PF

Não é o que vimos na internet. Nela, perfis dos famosos “redpill” (homens com sérios problemas de autoestima que cultuam misoginia e masculinidade excessiva) dizem que Cariani “não precisa disso por ser rico o bastante” e que “dinheiro de tráfico não é muito”, por isso não faz sentido.

O que denota, para mim, ou uma negação ou uma completa falta de noção da realidade. De uma galera que acha que a droga que destrói milhares de vidas e famílias é fabricada numa viela da Rua Amaral Gurgel e não por famílias e atores poderosos e ricos. Que matando o pobre e o preto a rodo a coisa vai acabar. Que é coisa de ladrão de galinha.

Cariani e a Anidrol, aliás, não foram investigados pela primeira vez. Em 2021, houve uma investigação da delegacia do Meio Ambiente de Diadema, município da Grande São Paulo, onde a empresa é sediada, que apontou o o descarte irregular de resíduos contaminados e de equipamentos de proteção individual (EPIs) misturados com resíduos comuns.

A investigação tinha provas robustas de descarte de resíduos vencidos e o laudo apontava, além do descarte irregular, o armazenamento inadequado de produtos químicos.

O Ministério Público de São Paulo, tão ativo para algumas causas, olhou para Cariani e arquivou o caso. De novo, a presunção de inocência foi apenas para o privilegiado.

Cariani, por ser branco e rico, poderá tentar provar sua inocência na justiça (em liberdade, aliás, já que a justiça negou seu pedido de prisão). Poderá usar a presunção de inocência ao seu favor. Uma pena que a grande maioria da população, que na boa parte das vezes é inocente mesmo, não tem o mesmo privilégio.

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