Sociólogo vê “abertura para desarticular a mobilização contra o PT entre os evangélicos”

Atualizado em 6 de novembro de 2022 às 7:30
Ex-presidente Lula em evento de lançamento de carta aos evangélicos
Foto: Ricardo Stuckert

O sociólogo Paulo Gracino Junior, pós-doutor em Sociologia pelo Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, concedeu entrevista à Folha de S.Paulo na qual diz haver espaço para o PT reconquistar o espaço perdido entre os evangélicos, sinalizando duas frentes de ação para isso: comprovando com atos de que os medos incutidos entre os evangélicos sobre um governo petista não se concretizarão e com a inclusão deles em políticas públicas. Confira trechos:

Reportagem da Folha mostrou que alguns líderes evangélicos baixaram o tom em relação a Lula. O sr. diria que uma reconciliação é possível?

A base evangélica é muito diversa. Com o tempo, as pessoas vão perceber que muitos daqueles medos que estavam sendo veiculados pela campanha do Bolsonaro e por alguns líderes evangélicos não vão se concretizar.

O PT vai fazer um governo moderado; igrejas não vão fechar; banheiros unissex não vão existir nas escolas. Todas essas questões vão desaparecer, e aí existe uma abertura para desarticular a mobilização contra o PT.

Uma segunda etapa envolve as grandes igrejas evangélicas. Elas são empresas, e muitas delas precisam de parcerias com o Estado para os seus negócios continuarem.

O PT precisa abrir mão de pautas progressistas para não prejudicar essa reaproximação?

A pauta da legalização do aborto, por exemplo, eu acho que está fora de cogitação. Mas a gente sabe que existem muitas políticas públicas que já estavam previstas no SUS e que independem do Congresso; dependem só da vontade política do gestor na ponta. Acho que essas políticas públicas vão avançar, pelo fortalecimento de grupos da sociedade civil ligados a pautas progressistas.

Agora é ver como Lula vai compor o governo e tentar convencer algumas lideranças do campo evangélico de que o ganho de direitos de outras minorias não significa a ausência de direitos dos evangélicos.

Essa reaproximação passa necessariamente pelas lideranças?

As lideranças são importantes, porque quem traduz a complexidade do mundo exterior para essa população são os pastores. Eles são o elo entre a grande política e a pequena política. É como se você dissesse que dá para fazer campanha sem liderança local e cabo eleitoral. Não dá.

Na minha opinião, o que o PT deve fazer é se aproximar desses grupos, mas não mais com o toma lá dá cá, e sim com políticas públicas. Ouvindo as lideranças locais e devolvendo para elas políticas públicas. Uma praça, saneamento, escola etc. Sem aquela ideia de pegar uma liderança e botar dentro do governo; isso não funciona, porque a liderança pode estar dento do projeto hoje, mas sair amanhã.

É preciso incluir de fato essa população. Porque os evangélicos são atores sociais que vieram para ficar. O Brasil está se tornando mais plural do ponto de vista religioso. É preciso saber gerir essa pluralidade, empoderando as pessoas, trazendo para dentro do Estado, escutando as demandas, deixando de tratar como cidadãos de segunda classe. As demandas evangélicas são legítimas, e é legítimo que os evangélicos façam política

Existe uma intersecção entre Estado e religião que o PT, via política pública, pode explorar. Por exemplo, uma igreja que mantenha uma comunidade terapêutica para a recuperação de adictos pode ter uma parceria com o governo.

É claro que não é imediato. Os líderes evangélicos não vão virar o discurso e dizer que agora amam o Lula. Mas eles falam para uma base que vai voltar a ser atendida pelos programas sociais do PT, então precisam se adaptar. (…)

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