O vexame, a tragédia e o povo nas ruas. Por Aloizio Mercadante

Atualizado em 26 de setembro de 2021 às 8:30
Veja o Mercadante e o Bolsonaro
Aloizio Mercadante e Jair Bolsonaro. Foto: Wikimedia Commons

O ex-ministro e presidente da Fundação Perseu Abramo (FPA), Aloizio Mercadante, escreve sobre a vergonha mundial que foi a última passagem de Bolsonaro pela ONU.

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Mercadante escreve sobre Bolsonaro

Veja o Mercadante e o Bolsonaro
Aloizio Mercadante e Jair Bolsonaro. Foto: Wikimedia Commons

Nunca antes na história deste país um presidente da República patrocinou um vexame internacional do tamanho que Bolsonaro foi capaz de desempenhar na abertura da Assembleia Geral da ONU. Único chefe de estado não vacinado, Bolsonaro esteve em toda mídia internacional fazendo o país passar vergonha com seu negacionismo, despreparo e ignorância. Deixou, ainda, o seu mais recente (e quarto) ministro da Saúde com Covid-19, em um suntuoso quarto de hotel, depois de seus gestos obscenos e grosseria inimaginável.

A passagem do bolsonarismo pela ONU vai custar constrangimentos duradouros aos turistas brasileiros pelo mundo, às negociações internacionais e aos interesses do estado brasileiro. Foi muito grave, mas o pior foi a realidade paralela, da desinformação programada e das mentiras orquestradas, que estão na essência deste governo. O Brasil descrito por Bolsonaro, tentando mostrar serviço ao sistema financeiro globalizado, é o lado mais obscuro e trágico desse episódio.

O negacionismo econômico e social não mencionou que a inflação dos últimos 12 meses está em 9,68%. A alta na gasolina foi de 41,33%, acompanhada pelo esquartejamento da Petrobrás e distribuição volumosa de dividendos para os acionistas internacionais. O custo da alimentação e bebidas subiu 13,94%, com aumento de 47,78% do óleo de cozinha e 23,11% o dos ovos, que estavam tentando substituir a carne já desaparecida há algum tempo da mesa dos trabalhadores.

A foto emblemática dessa catástrofe é a fila do povo na porta de açougues para ter acesso a um pedaço de osso. E, ainda assim, para cozinhar na lenha, porque o gás de cozinha subiu 30,22%, para até R$ 130 e a energia elétrica mais 21, 08%. Como diz o presidente na live dele, mas não no discurso, “apaga a luz e sobe de escada”.

O PIB no segundo trimestre ficou estagnado em -0,1%, puxado pela indústria de transformação que caiu -2,2%. O PIB país caiu para o 14º lugar do ranking internacional, quando estava disputando a 6ª posição nos governos do PT.

O que Bolsonaro não trata nas lives dele e no cercadinho é que 72,9% das famílias estão endividadas, sendo 25,6% com dívidas em atraso e 10,7% sem condições de pagar suas dívidas. E, mesmo assim, o Banco Central segue subindo 1% na taxa básica de juros, agravando o endividamento público, pressionado pela inflação que neste mês já é maior desde 1994 e complicando ainda mais a vulnerabilidade das famílias endividadas.

O discurso não teve uma única mensagem para os 14,4 milhões de desempregados, os 5,6 milhões de desalentados e os mais de 28 milhões de subutilizados. Bolsonaro não mencionou e nem deu qualquer esperança para os que foram jogados na extrema pobreza. Eram 4,8% e agora já são 12,8%, uma multidão que está nos centros da cidade ou perambulando pelas periferias das grandes cidades tentando alguma migalha para a sobrevivência diária. São 116 milhões de brasileiros em situação de insegurança alimentar e que esperam o fim do auxílio emergencial, comprometido em 78,7% com a alimentação.

Bolsonaro teve o desplante de dizer que combate o desmatamento vai bem, em razão da redução em um mês específico, extremamente chuvoso na Amazônia, mas de grave seca no Centro-Oeste e no Sudeste. Na verdade, o desmatamento cresceu 47% ao longo de seu governo e envolveu a demissão do Ricardo Galvão do Inpe, o desmonte dos mecanismos de fiscalização do Ibama, o afastamento de delegados que combatiam a extração ilegal, além da tentativa de acabar com a Funai. Tudo isso no mesmo momento em que 200 cientistas lançam um Alerta Vermelho, mostrando que a Amazônia está atingindo um ponto de não-retorno.

O ex-capitão não falou que o governo dele acreditou que as chuvas iam melhorar e não poupou os reservatórios das usinas hidroelétricas. O negacionismo energético não acionou as termoelétricas de forma prudencial, também não apresentou medidas de incentivo a redução do consumo, apenas impôs um aumento de 52% com a bandeira vermelha no final de junho e 49,6% em agosto, com a bandeira de escassez hídrica. E segue negando que estamos caminhando para cortes seletivos de energia ou o risco de um apagão, sendo que uma contração de 10% na oferta de energia reduz em 1% o crescimento do PIB.

Acuado por todo esse cenário e pelo fiasco que foi o movimento golpista do último 7 de setembro, Bolsonaro agora declara que “a chance de um golpe é zero” e elogia as urnas eletrônicas. Acredite quem quiser, mas quem conhece Bolsonaro desde quando queria colocar bombas no quartel, sabe que ele nunca escondeu a vocação golpista e a defesa do autoritarismo, da ditadura e da tortura.

Para além da rede de fake news de Bolsonaro, há um Brasil sofrendo, empobrecido, desesperado e sem governo. Por isso, contra toda essa tragédia, uma ampla unidade de esquerda, que conta com a adesão de PT, PSOL, PCdoB, PSB, PDT, Rede, PV, Cidadania e Solidariedade, além de centrais sindicais e movimentos sociais, organiza uma imprescindível mobilização popular para o próximo dia 2 de outubro. Enfrentar o desgoverno Bolsonaro nas ruas é a mais importante resposta para assegurarmos vacina no braço, comida no prato, emprego e renda. Impeachment já!