Uma entrevista (talvez indiscreta) com Dorothy Parker. Por Camila Nogueira

Atualizado em 21 de agosto de 2015 às 13:20
"Em toda a história, pela qual passaram bilhões e bilhões de indivíduos, nenhum deles teve um final feliz."
A autora

Dorothy Parker (1893 – 1967) foi, em uma palavra, brilhante — como escritora, como poetisa e como jornalista. Famosa por sua irreverência, por seu senso de humor e também por seu desequilíbrio emocional, Parker foi uma das personalidades literárias mais talentosas de seu tempo. Para qualquer aspirante a escritor (ou melhor dizendo, para qualquer pessoa capaz de extrair prazer com a literatura), sugiro a leitura de seus contos. Sua escrita, gloriosamente irônica e refinada, é uma verdadeira aula. Aceitam uma sugestão? Comecem com “You were perfectly fine” ou com “Lady with a lamp”, que traduzem perfeitamente o estilo da escritora.

Boa tarde, Mrs. Parker. Como vai?

Não muito bem. Bebi um pouco noite passada, e uma ressaca é idêntica às vinhas da ira.

Oh. O que você bebeu?

Martini.

É sua bebida favorita?

Adoro beber um martini. Dois, no máximo. Depois de três, entro debaixo da mesa.

E depois de quatro?

Depois de quatro, entro debaixo do anfitrião.

Você é realmente espirituosa!

Ao acordar, escovo os dentes e afio a língua.

… E experiente, ao que tudo indica.

A experiência pode ser adquirida a partir de quatro coisas: a preguiça, a tristeza, a amizade e a inimizade.

Hmmm…

Há também coisas que devem ser evitadas: a curiosidade, o amor, a insegurança e as sardas. E há algumas coisas que são simplesmente inconquistáveis. Champanhe o suficiente é uma delas.

Dizem que a curiosidade é uma boa qualidade para escritores.

Sim, mas é perigosa.

Como assim?

O tédio pode ser curado a partir da curiosidade, mas a curiosidade não tem cura.

Você sempre quis ser escritora?

Eu sempre quis ser rica.

Hmmm…

E ser uma boa escritora. Essas duas coisas podem vir juntas, e isso muitas vezes acontece. Mas se for pedir demais, ser rica é melhor. Até porque odeio escrever. Amo ter escrito.

O dinheiro é realmente tão importante?

Dizem que o dinheiro não compra saúde, mas eu ficaria satisfeita com uma cadeira de rodas cravejada de diamantes. Tome conta dos luxos e as necessidades vão cuidar de si mesmas.

Eu também sempre quis ser escritora.

O segundo maior favor que poderei lhe fazer será presenteá-la com uma cópia do livro The Elements of Style.

E o primeiro?

Matá-la enquanto ainda é feliz.

Por falar em morte, Mrs. Parker, você já tentou se matar algumas vezes.

Das minhas tentativas de suicídio, tirei uma lição muito preciosa: navalhas machucam, rios são úmidos, ácidos mancham a pele, comprimidos causam cãibra, armas são ilegais, cordas falham, gases cheiram mal… É mais fácil viver.

Você teve uma depressão especialmente violenta depois de abortar o bebê que esperava do jornalista e dramaturgo Charles MacArthur…

Serviu-me muito bem por ter colocados todos os meus ovos em um bastardo.

O que você procura em um homem?

Eu só quero três coisas em um homem: beleza, falta de escrúpulos e estupidez.

A beleza é realmente tão importante?

A beleza pode até ser superficial, mas a feiúra chega a atingir os ossos.

E a inteligência? Ela não é essencial em uma pessoa?

Na juventude, sempre ouvi várias histórias de como os homens preferem mulheres espertas a mulheres bonitas. Devo dizer que jamais presenciei uma única cena que comprovasse tal teoria.

Como funciona a sua vida amorosa?

Eu faço o estilo ame-me ou deixe-me; ou, como de costume, ambas as coisas.

Oh!

Algumas mulheres falam dezoito línguas e não conseguem dizer “não” em nenhuma delas…

O que você diria a uma moça prestes a iniciar sua vida amorosa?

Nunca inicie uma conversa abrindo seu coração. Use palavras serenas. Não expresse os seus sentimentos. Sua fala e sua aparência devem ser velozes e rasas, tal como um riacho. Seja simples e glacial como uma gota de neve, e delicada e adorável como uma florzinha de cerejeira. Nunca diga a ninguém que está sofrendo. Se expressar o medo que sente de perder aquele que ama, você nunca o conquistará. Se for sábia e jamais ficar deprimida, vai conseguir conquistá-lo. Não fale a sério e não seja sincera, e então seu desejo será realizado. E se, fazendo isso, conseguir ser feliz, será a primeira entre todas nós.

E a um rapaz?

Príncipe ou plebeu, tenor ou barítono, pintor, encanador ou vagal – fique de boca fechada… Somente os poetas tem o direito de fazer amor e sair contando por aí.

Algo a acrescentar?

Eu sei que isso pode parecer chocante, mas em toda a história, pela qual passaram bilhões e bilhões de indivíduos, nenhum deles teve um final feliz.