Beber leite em público é mais um ato da extrema-direita dos EUA que bolsonaristas copiam

Atualizado em 30 de maio de 2020 às 8:01
Bolsonaro, Tereza Cristina e presidente da Frente de Agropecuária aderem ao ‘Desafio do Leite’. Foto: Reprodução/Facebook

Por Vinícius Segalla

Quando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) bebeu de um copo de leite durante uma live na última quinta-feira (28), afirmando ser parte de uma campanha do agronegócio pelo aumento do consumo do produto, não tardou para que se apontasse a proximidade do ato com a simbologia utilizada pela direita supremacista dos EUA em relação ao alimento. Os núcleos bolsonaristas reagiram com veemência e sarcasmo, alegando desconhecer quaisquer teorias eugenistas que envolvam leite de vaca. Tais teorias – e também o consumo de leite em público como ato supremacista – porém, existem de fato e já entraram para a cultura política da extrema-direita dos Estados Unidos.

Beber leite puro em público ou em vídeos na internet é um ato da chamada alt-right supremacista norte-americana – ativistas e entidades de extrema-direita de cunho fascista – que passou a ser debatido nos Estados Unidos em 2017. Foi quando teorias pseudocientíficas que ligam o maior consumo histórico do produto na Europa e na América do Norte à “supremacia natural da raça branca” vieram a público através de páginas da extrema-direita na internet. Os supostos estudos também afirmam que somente “pessoas de raça branca” possuem alta tolerância à lactose, estando aptos, portando, a tomar mais leite.

Em fevereiro de 2017, um grupo de neonazistas realizou uma espécie de flashmob bebendo leite direto de galões em frente à câmera de uma ativista de direitos humanos dos Estados Unidos que fazia uma transmissão ao vivo pela internet. Veja abaixo.

Em novembro do mesmo ano, o ativista supremacista Lucian B. Wintrich dava uma palestra quando começou a tomar um copo de leite e foi interrompido com os gritos de “Go home, nazi” (“Vá para casa, nazista”, em tradução livre). Veja.

Pode-se ver, na postagem do Twitter, que um internauta pergunta o motivo do palestrante estar tomando leite. Outro responde que o ato é uma espécie de símbolo entre os supremacistas brancos.

Atualmente, os ativistas deste campo naquele país bebem o leite em reverência ao ato simbólico e também com ironia e piada, como se a imprensa e esquerdistas em geral tivessem acreditado em uma espécie de “pegadinha” que teriam feito, negando ter afirmado seriamente qualquer relação entre o consumo de leite e superioridade branca.

A abordagem jocosa surgiu apenas em 2018, quando cientistas e pesquisadores de universidades dos EUA foram a público via imprensa nacional para apresentar provas do charlatanismo da tese encampada pela alt-right. A partir daí, tudo sempre nunca passou de uma piada. Fato é que o assunto consumiu o tempo de cientistas e instituições para explicar o fenômeno e desmentir as teorias supremacistas, como se pode ver em reportagem do New York Times, de outubro de 2018.

No título da reportagem, se lê: “Por que supremacistas brancos estão bebendo leite (e por que os geneticistas estão preocupados)

Na última quinta-feira, Jair Bolsonaro bebeu leite junto com ministros em sua live na internet. A explicação oficial é que se trata de uma campanha do empresariado do agronegócio a que ele estava aderindo, para incentivar que as pessoas bebam mais leite.

 

Bolsonaro bebe leite durante live

Horas depois, Allan dos Santos, youtuber bolsonarista investigado na CPMI das Fake News, repetiu o gesto, com direito a “pose para o print”, como ele mesmo definiu, e à frase enigmática “Entendedores entenderão”.

O youtuber investigado Allan dos Santos bebe leite e ressalva que ato deve ser entendido pelos “entendedores”

Depois que foi apontada a semelhança entre os atos do presidente e de seu aliado aos dos supremacistas norte-americanos, parlamentares bolsonaristas correram às redes sociais repudiar qualquer ligação que se possa fazer entre uma coisa e outra. Chamaram de fake news, ilação da imprensa esquerdista, “mentira de professora comunista da Unicamp”, parte da campanha difamatória contra o governo e, claro, muita ofensa e xingamento.

Então, tá.