Em nome do leitor

Atualizado em 19 de outubro de 2011 às 10:05
Mamãe, no meio de filhos e netos

Mamãe adorava poesia. Lembro  dela, com frequência, com antologias de poetas como Manuel Bandeira e Fernando Pessoa, seus prediletos.

Ela às vezes me dava alguns poemas para ler, para ver se convertia aos versomaníacos, mas jamais me dei por completo à poesia. Alguma coisa, pouca é verdade, ficou em mim. Um poema de Bandeira, por exemplo, chamado “Ainda uma vez, adeus”. Usei este título, como editor da Exame, quando Serra perdeu, no começo dos anos 1990, mais uma eleição para a prefeitura de São Paulo. Ele ficou incomodado, e ligou a meu chefe, Antonio Machado, para se queixar, como é seu hábito.

Recentemente, li em algum livro antigo que a beleza de uma língua está não na prosa, mas na poesia.  Homero, Virgílio, Shakespeare, Camões são algumas provas disso. Embora possa parecer o contrário a incultos como eu, é  bem mais fácil escrever um  bom livro de prosa do que de poesia.

A morte de mamãe teve como consequência, em mim, me aproximar da poesia. De alguma forma, é como se ao ler poetas eu a tivesse por perto, como se uma conexão invisível mas potente se estabelecesse entre nós.

Ganhei de minha namorada Erika um livro de poemas de Cecília Meireles, e quase todo dia percorro ao acaso algumas de suas páginas.

Um poema, particularmente, me chamou a atenção. É dedicado ao leitor. Pensei nas pessoas que me lêem sem que eu jamais as veja, e entendi o sentido de cada linha de Cecília. Compartilho o poema aqui, em memória de minha mãe e em homenagem a cada leitor que possa ter eu ter tido ao longo de tantos de escrita.

Mensagem a um desconhecido

Teu bom pensamento longínquo me emociona.

Tu, que apenas me leste,

acreditaste em mim, e me entendeste profundamente.

Isso me consola dos que me viram,

a quem mostrei toda a minha alma,

e continuaram ignorantes do que sou,

como se nunca tivessem me encontrado.