Escritor e analista internacional da CNN Brasil, Lourival Sant’Anna conhece bem o universo do Talibã.
Ele foi o único jornalista brasileiro, e um dos únicos ocidentais, a entrar no Afeganistão e entrevistar líderes do grupo fundamentalista islâmico – que agora volta ao poder – logo após o atentado de 11 de Setembro, nos Estados Unidos, em 2001.
No Afeganistão, que visitou em três ocasiões, o jornalista desvendou aspectos pouco conhecidos da cultura dos talibãs. Descobriu, por exemplo, que o prazer sexual entre homens é algo disseminado entre os radicais islâmicos. Uma prática cercada de silêncio e contradições: “Como eles são casados, e têm filhos, na sua própria visão eles não são homossexuais”, diz Lourival.
Autor de quatro livros – entre eles, Viagem ao Mundo dos Taleban, sobre a arriscada cobertura no Afeganistão e Paquistão, em 2001 – Lourival é um atento observador do papel que as mulheres exercem no país, onde elas são “propriedades dos homens delas”.
Para ele, a aversão dos talibãs às mulheres tem raízes culturais profundas: “A mulher tem um papel de geração e criação dos filhos. Mas não existe afinidade entre marido e mulher. Afinidade é entre os homens.” (…)
x.x.x.x
Quer entender como surgiu o Talibã?
Aureo Toledo, professor de Relações Internacionais e Estudos para Paz na Universidade Federal de Uberlândia, publicou um ‘fio’ no Twitter que explica o surgimento do grupo extremista.
Leia, abaixo, o ‘fio’ publicado pelo especialista:
O Talibã é um grupo fundamentalista cuja origem remonta à guerra civil (1992-1996) que sucedeu à saída da então União Soviética do país.
Após a retirada das tropas soviéticas, foi deixado um governo títere que tinha que enfrentar diversas milícias armadas.
Em julho de 1994, o Talibã surge.
Após um líder guerrilheiro sequestrar e estuprar 3 garotas, Mohammed Omar, principal liderança religiosa do grupo, recrutou 30 jovens e com 16 rifles atacou a base da guerrilha, resgatou as jovens e enforcou os raptores.
O grupo, em boa parte estudantes oriundos de campos de refugiados na fronteira com o Paquistão, mostrava-se indignado com a situação do país, e almejava reconstruir a sociedade do país com base em preceitos muçulmanos.
O governo paquistanês colocou recursos no grupo, na medida em que passou a compreende-lo como uma oportunidade para estabilizar o Afeganistão.
Em setembro de 1996, o Talibã tomou a capital, Cabul.
O período do Talibã foi terrível. Violação de direitos humanos, intolerância religiosa e perseguição étnica eram coisas do cotidiano.
Em 1997 o Talibã estreita laços com a Al Qaeda, criando as condições para atos terroristas, entre eles os de 11 de setembro de 2001.
O Talibã caiu em 13 de novembro de 2001, quando tropas dos EUA tomaram Cabul, em retaliação ao apoio do país à Al Qaeda.
A partir daí, as lideranças do Talibã passaram a se refugiar no país, muitas próximas à fronteira com o Paquistão.
Para compreender as razões do avanço tão rápido agora do Talibã, chamo a atenção para alguns fatores.
Os acordos de Bonn excluíram politicamente o Talibã de qualquer negociação.
Obviamente que o grupo deve pagar pelos crimes que cometeu, mas tal opção foi problemática pois o grupo tem apoio considerável da etnia pashtun, a maior do Afeganistão.
Acrescente-se a isso que a presença dos EUA na região não ajudava em nada a estabilização do país, pois os vizinhos do Afeganistão (Paquistão, China, Tajiquistão, Uzbequistão, Turcomenistão e Irã) não são os melhores amigos dos estadunidenses.
Reconstruir custa muito dinheiro, e o Afeganistão é carente em recursos.
O país é dependente crônico de ajuda externa. Para piorar o quadro, o mercado ilícito de drogas é grande no país, particularmente a produção de ópio, que financia muitas milícias.
O sistema eleitoral do país não contribuiu.
O Afeganistão é um dos pouquíssimos países do mundo a adota o “distritão”.
Este sistema incentivou candidaturas personalistas e enfraqueceu muito os partidos políticos no país, dificultando a organização da sociedade civil.
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