Hospital em Gaza está sitiado por Israel; quem sai, é morto, diz diretor

Atualizado em 16 de dezembro de 2023 às 9:00
Vizinhança do hospital Al-Awda, que atende o campo de refugiados de Jabalia no norte de Gaza. Foto: Anas al-Shareef/Reuters

Por Leonardo Sakamoto

O hospital Al-Awda, em Jabalia, um dos únicos que continuam funcionando no norte da Faixa de Gaza, está sitiado pelo Exército de Israel, afirmou ao UOL o seu diretor, o médico Ahmad Muhanna. O cerco já dura mais de uma semana.

“Há um bloqueio total do hospital Al-Awda pelo Exército. Ninguém pode sair porque está sob risco de ser morto por atiradores israelenses que estão posicionados em torno do hospital”, afirmou.

Não apenas ir embora, mas se movimentar entre os edifícios do complexo médico tornou-se um risco de morte. O medo faz com que os que estão dentro durmam longe das janelas e rastejem para evitar serem baleados. A equipe médica diz que pessoas já foram baleadas e mortas em frente ao prédio.

Muhanna relata um situação de calamidade dentro da unidade: “Temos 38 pacientes agora, alguns deles sofrendo por falta de medicamentos e não temos oxigênio, zero estoque de cilindros. Há comida para mais dois dias, no máximo”. Somam-se aos doentes e feridos, 95 pessoas da equipe.

E, além de estar no escuro por falta de eletricidade, o Al-Awda corre o risco de ficar sem água também. “Temos apenas uma pequena quantidade de combustível, cerca de 200 litros, que está sendo usado em um pequeno gerador a fim de bombear a água. Quando acabar esse combustível, a água acaba também”, explica. De acordo com o hospital, um bombardeio israelense atingiu os reservatórios.

Durante o cerco, médicos tiveram que amputar a perna de uma menina de quatro anos de forma precária, sob o risco de infecção por falta de recursos.

“Esta é a situação mais crítica até agora pela qual passamos. Esperamos que este bloqueio do lado israelense acabe. Clamamos à Cruz Vermelha e à OMS [Organizacão Mundial de Saúde] que tomem medidas cabíveis para apoiar o Al-Awda nestes tempos difíceis”, diz Ahmad Muhanna.

Médicos já morreram no hospital por conta de bombardeios

O cerco de Israel, além de impedir a entrada de medicamentos, alimentos e água, também, interrompeu a energia elétrica e barrou combustíveis.

Desde o começo do conflito, o diretor do hospital fez diversos apelos à comunidade internacional pelo reestabelecimento do seu fornecimento para abastecer os seus dois geradores. O Al-Awda contava, antes do cerco, com uma reserva de 12 mil litros, que se esgotou.

A falta de combustíveis impede o funcionamento de respiradores, máquinas de raio-X e incubadoras de prematuros — o Al-Awda também é mais importante maternidade do Norte de Gaza. Muhanna afirmou que os médicos estavam operando com luzes recarregáveis e pilhas.

Crianças palestinas vítimas do bombardeio israelense. Foto: Motaz Azaiza/UNRWA

Em 21 de novembro, a organização Médicos sem Fronteiras divulgou uma nota declarando-se “horrorizada” com a morte de dois médicos do grupo que atuavam no Al-Awda após um bombardeio. Lembrou que o ataque a instalações médicas constitui violação grande ao direito humanitário internacional.

“Dr. Abu Nujaila e o Dr. Al Sahar estavam no hospital quando a unidade foi atingida no terceiro e no quarto andares. Outras equipes médicas, incluindo equipes de MSF, também ficaram gravemente feridas. No momento em que esta nota foi escrita, mais de 200 pacientes ainda estavam em Al-Awda e não conseguiam receber o nível de cuidados de que necessitam”, afirmou a MSF. Um terceiro médico que não pertencia à organização também morreu.

Impactos de mísseis já haviam destruído ambulâncias, causado danos ao edifício e ferido funcionários do Al-Awda duas semanas antes, quando eles estavam atendendo às vítimas dos bombardeios do campo de refugiados de Jabalia. O Exército israelense mandou a evacuação do local, mas os funcionários resolveram ficar.

O governo do primeiro-ministro Benjamim Netanyahu vem acusando hospitais de esconderem sedes do Hamas. O caso mais famoso envolveu o Al-Shifa, o maior complexo hospitalar de Gaza, que também foi cercado por tanques e invadido.

Desde então, o governo de Israel vem divulgando vídeos para tentar convencer que as unidades médicas escondem bases do Hamas. Recebe duras críticas das Nações Unidas, que também usou o termo “horrorizada” para tratar da ação no hospital.

De acordo com Muhanna, a maioria das crianças sobreviventes dos bombardeios chegam ao hospital com queimaduras, cortes na cabeça e ossos quebrados nas extremidades. Tudo em um mesmo paciente. O motivo é que, com as bombas, as paredes desabam sobre elas. Em um ato reflexo, colocam as mãos na cabeça par se protegerem.

Apesar da situação, Muhanna, que já recebeu ordens de evacuação do Exército de Israel, promete ficar. “Nós estamos aqui e vamos continuar aqui.”

Em Gaza, o saldo da retaliação israelense é de 18.787, números do Ministério de Saúde local, controlado pelo Hamas, após 1.200 pessoas serem mortas em Israel pelos ataques terroristas do grupo no dia 7 de outubro.

Por Leonardo Sakamoto no Uol

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