Key Alves e o racismo à brasileira. Por Nathalí

Atualizado em 23 de março de 2023 às 18:56
Fred Nicácio e Key Alves no BBB. Foto: Reprodução

A jogadora de vôlei e ex-bbb Key Alves está confinada junto com outros oito eliminados do programa que aguardam possível repescagem, dentre eles o médico Fred Nicácio, que sofreu intolerância religiosa televisionada no Big Brother Brasil.

Key e seu namorado Gustavo demonstraram incômodo com o culto religioso de Fred, o candomblé, uma religião sabidamente de matriz africana. Key chegou a dizer que sentia uma “energia ruim” do colega de confinamento, enquanto Gustavo disse que pensou que Fred estaria fazendo “algo ruim” contra ele, enquanto o brother apenas rezava.

Confrontada pelo médico, que garantiu que processará o casal, Key disparou: Não sou racista, tenho família negra!

Mulher, pelo amor de Deus!

Esse é o primeiro argumento de um racista, como disse Tina, outra mulher negra confinada para a repescagem.

Esse caso, que revela um Brasil ainda escravocrata, ignorante e racista, nos dá a preciosa oportunidade de comentar sobre um assunto que ainda circula pouco dentro e fora das redes sociais: o racismo à brasileira.

Trata-se de um racismo velado, escondido atrás de um “nossa, que beleza exótica!” ou “que negra bonita, tem traços finos”, ou ainda a carteirada “eu tenho família preta!”, comentários ainda muito comuns, tão comuns que transparecem em um reality show, um microcosmos do mundo real aqui fora.

No Brasil, quase ninguém mais chama preto de macaco, mas isso não significa que o racismo acabou: ele apenas tomou uma forma muito mais difícil de apontar e confrontar.

Acontece quando o segurança segue um preto no supermercado, ou quando alguém se surpreende porque um negro alcançou um status social abastado, quando se diz “ela é uma negra bonita!” (por quê ninguém diz: ela é uma branca bonita?), ou quando se demonstra medo ou preconceito diante de religiões de matriz africana, como aconteceu no caso de Key.

O racismo velado é muito mais cruel porque dificilmente pode ser reconhecido, ou ao menos por pessoas brancas: as pessoas negras reconhecem qualquer tipo de racismo, porque lhes dói na carne.

Esse tipo de racismo se estende à ancestralidade preta, aos seus costumes, aos seus traços, à sua religião, embora dificilmente diga respeito à cor da pele propriamente dita.

Ao expor seu racismo para o Brasil em um reality show, Key Alves conferiu ao grande público a oportunidade de reconhecer e apontar o racismo velado.

Não adianta chorar: racismo à brasileira não só também é racismo como se mostra muito pior do que o racismo escancarado. Ao ofender a religião de Fred, Key ofende toda uma comunidade, uma ancestralidade, uma raça inteira.

Me solidarizo à dor de Fred Nicácio e espero – assim como toda a comunidade antirracista – que o casal seja de fato processado e punido, em que pese o fato de esse final feliz ser ainda tão raro em países como o Brasil.

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