O impacto da PEC dos Precatórios nas eleições presidenciais. Por Miguel do Rosário

Atualizado em 4 de novembro de 2021 às 16:47
Ciro Gomes
Ciro Gomes em seu programa “Ciro Games”; – Foto: Reprodução

Uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) é o tipo de mudança legislativa mais difícil de se levar adiante, por exigir dois terços dos 513 parlamentares da Casa. Ou seja, precisa de um mínimo de 308 votos para ser aprovada.

Ontem, a PEC dos Precatórios recebeu 312 votos. Foi aprovada. Se repetir a performance na votação em segundo turno, na semana que vem, irá ao Senado,  para ser votada e sancionada.

Com isso, o governo não precisará pagar dívidas bilionárias e Bolsonaro terá algumas dezenas de bilhões de reais livres para construir a sua campanha presidencial em 2022.

A PEC mostrou a força de persuasão de Arthur Lira, presidente da Câmara, e do próprio Jair Bolsonaro. É mais um indicativo de que o impeachment se esfuma cada vez mais no horizonte.

Tudo isso, naturalmente, afeta o debate político sobre as eleições de 2022 e as estratégias da oposição. As mobilizações de rua tenderão a dar foco mais no certo. Ou seja, na campanha eleitoral, do que no duvidoso, que é um impeachment com remota chance de ser aprovado.

O foco na campanha eleitoral desmonta, naturalmente, a movimentação em torno de uma “frente ampla”, que passa a ser vista como fictícia, ou mesmo apenas palanque para partidos menores ou com problemas de imagem limparem a sua reputação por terem apoiado Bolsonaro em 2018.

O eleitor está agora, mais que nunca, julgando o comportamento da oposição de olho em 2022.

Essa é a explicação para o impacto profundamente negativo que a orientação do PDT, em favor da PEC, produziu na opinião pública. Especialmente a progressista, que está num processo de ampliação em virtude da rejeição crescente ao governo.

Segundo o registro da Câmara, 15 deputados do PDT votaram em favor da PEC, ou 62% da bancada.

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O impacto foi tão negativo que o candidato do PDT, Ciro Gomes, decidiu radicalizar e “suspender” sua candidatura em protesto contra seu próprio partido.

A narrativa da militância cirista é de que Ciro Gomes demonstrou coerência e coragem ao tomar essa atitude. Mas o que se exige principalmente de um político não é apenas coerência (isso é obrigação) e sim capacidade política de articular apoios em prol de um projeto, é decepcionante, para todos, mesmo para aqueles que não apoiam Ciro, que ele demonstre tanta inépcia na condução política de seu próprio partido.

O PSB também sofreu defecções, mas foi de uma minoria (10 deputados, 31% da bancada). E, o mais importante, o partido orientou contra. O presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira, e a conta oficial do partido, criticaram publicamente os deputados que votaram alinhados ao governo.

Já o presidente nacional do PDT, Carlos Lupi, evitou fazer qualquer crítica a bancada, e veio a público anunciar que está entrando na justiça, juntamente com Ciro Gomes e o deputado Paulo Ramos, com uma representação no STF contra a PEC 23. A iniciativa é, obviamente, apenas uma tentativa desesperada de jogar para a galera. Pois o serviço de casa, que era convencer os deputados a votar contra a PEC, não foi feito. Apelar para a justiça para reverter uma PEC que foi apoiada pelos parlamantares do próprio partido, é a caricatura suprema da judicialização da política.

Ciro espera que o seu ultimato faça com que os deputados trabalhistas mudem o seu voto no segundo turno da votação.

Entretanto, ultimatos não são a melhor estratégia em política. Porque deixam um gosto amargo na boca da militância e gera insegurança em seus aliados. Como um partido ou movimento se aliará a Ciro Gomes se ele está disposto a renunciar a sua candidatura sempre que houver um problema?

O fato é particularmente desgastante para Ciro por acontecer dias após o candidato fazer o lançamento de uma ambiciosa pré-campanha, com slogan (“prefiro Ciro”), jingle e ações da militância em várias capitais.

Independente do resultado, ou seja, com recuo ou não dos deputados do PDT, Ciro sai menor desse processo; demonstrou baixa capacidade de articulação política, influência zero sobre a bancada, e a sua legenda se mostrou extremamente desorganizada.

Vale lembrar que, na votação da PEC 5, que ampliava discretamente a vigilância externa sobre o MPF, o PDT orientou sim e boa parte dos parlamentares votaram não, o que já sinalizava um perigoso nível de desorientação.

O PT, por outro lado, sai fortalecido. Sua bancada votou integralmente contra a PEC dos Precatórios. Os poucos ausentes estavam fora do Brasil.

Um outro ponto interessante é que alguns partidos com forte vocação governista, como Novo e MDB, orientaram contra a PEC, num sinal de descolamento que pode ser interessante à oposição, não tanto em relação ao Novo, de onde não se espera qualquer aliança contra Jair, mas sobretudo em relação ao MDB, onde Lula espera encontrar apoios importantes para sua candidatura.

(Texto originalmente publicado em O CAFÉZINHO, por Miguel do Rosário)

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