O voto evangélico foi superestimado nas eleições

Atualizado em 4 de novembro de 2014 às 12:41

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Publicado no blog Mídia, Religião e Política.

 

O resultado do primeiro turno das eleições 2014, pelo menos no que diz respeito ao Congresso Nacional, chama a atenção pelo caráter em torno dos resultados. Parlamentares com posições conservadoras em relação a causas sociais se consolidaram como maioria naeleição da Câmara, de acordo com levantamento do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), consolidada e respeitada organização que há 31 anos monitora e estuda ações dos poderes da República, especialmente o Congresso Nacional.

Houve aumento do número de militares (incluindo policiais), de empresários, de ruralistas e de outros segmentos mais identificados com o conservadorismo (o termo conservadorismo é usado aqui no sentido da ciência política referente a posições alinhadas com a manutenção – contrária a mudanças – de determinada ordem sociopolítica, econômica, institucional, ou de crenças, usos e costumes de uma sociedade).

Um balanço mais definitivo do número dos evangélicos eleitos (considerada a dificuldade de identificação dos novatos que não têm títulos religiosos atrelados ao nome) já pode ser apresentado, depois de contatos com vários pesquisadores e especialistas, e acesso à lista divulgada pela assessoria da Frente Parlamentar Evangélica, publicada no jornal O Globo. Fica nítido que este grupo, por conta do perfil dos reeleitos e seus partidos, certamente “engrossará” o cordão conservador na Câmara, mas não alcançou o patamar numérico almejado/propagado.

As estimativas analíticas indicavam a denominada “bancada evangélica” chegaria a 100 parlamentares, mantidos os 20% de aumento que se concretizaram nos últimos pleitos.  A Frente Parlamentar Evangélica apregoava um crescimento de 30%. Era parte da campanha de lideranças mais destacadas desse segmento de que os evangélicos ganhariam mais poder com mais vagas no congresso. Nomes como deputado Marco Feliciano (PSC-SP) eram propagados com vistas ao alcance de um milhão de votos.

Um de seus apoiadores, o Pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo Silas Malafaia, chegou a afirmar ao jornal Folha de S. Paulo: “Se o Feliciano tiver menos de 400 mil votos na próxima eleição, eu estou mudando de nome”. Ele ironizava, em 2013, as ações de movimentos sociais contra a presença do deputado na presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara (CDHM). E acrescentou: “Quero agradecer ao movimento gay. Quanto mais tempo perderem com o Feliciano, maior será a bancada evangélica em 2014”.

Esta também foi a aposta do partido do deputado Feliciano, o PSC, que decidiu lançar o Pastor Everaldo como candidato à Presidência da República na esteira do sucesso alavancado ao partido com as polêmicas em torno do caso da presidência da CDHM. Essa candidatura revelou-se fracassada, como será abordado adiante.

Já com a divulgação das primeiras listas de deputados evangélicos, ficava claro que as estimativas de 20 a 30% de aumento da bancada não seriam alcançadas. Números se apresentavam, nas mídias religiosas e não-religiosas, ou bem abaixo dos cerca de 100 parlamentares previstos (57 ou 66, entre os mais “realistas”) ou mais próximos da previsão, porém ainda abaixo dos 100 (80 a 82, entre os mais otimistas).

O DIAP divulgou uma primeira lista, em 6 de outubro, com 53 nomes, indicada como “preliminar”. Depois veio “lista provisória” divulgada para a imprensa pela Frente Parlamentar Evangélica (FPE), com 80 nomes (corrigida depois para menos, 79 parlamentares). A relação do DIAP foi publicada em sites evangélicos como o Gospel+ (que atualizou para 57 eleitos, mas destacou a diminuição)  e o Gospel Prime (que atualizou para 66, apesar de ter evitado registrar o número total, que, segundo o site, resultou em 66).

A primeira relação da FPE, não corrigida, foi publicada pelo jornal O Globo, que destacou o crescimento de 14%.  Esta matéria foi reproduzida pelo site Verdade Gospel, que celebrou os números como crescimento expressivo de 14%, com 80 indicados). O DIAP publicou, em 8 de outubro, uma segunda lista baseada na primeira lista provisória, não corrigida, da FPE, e acrescentou mais três nomes, apresentando um total de 82 parlamentares evangélicos.

Com base nestas listas, em checagem de material de divulgação dos candidatos, bases de dados, contatos locais, e ouvidos analistas e especialistas, foi possível chegar a uma lista mais próxima do definitivo, com 72 nomes. Em comparação com o grupo de 70 eleitos/as na atual legislatura, houve 3% de aumento de deputados identificados como evangélicos na Câmara. Um número muito abaixo dos 20% ou 30% apregoados, e ainda bem inferior aos 14% celebrados pela FPE. Pode-se inferir que a retórica do terror sobre as “ameaças à família” e do “comunismo” não tiveram o efeito numérico almejado.

A relação da FPE, que, inicialmente, chegava a 80 nomes, parece ter sido resultado de uma “caça a nomes” para ampliar a porcentagem de aumento a ser divulgada e evitar divulgar o fracasso numérico, já que, também, sete deputados/as não foram reeleitos/as. Isto pode ser assim entendido porque nove deles não foram identificados, por meio de pesquisa e consultas, como evangélicos: ou declararam filiação católica-romana; ou dizem “se considerar cristãos” e foram apenas apoiados por lideranças de igrejas; ou concorreram por partidos identificados com igrejas, PRB (identificado com a Igreja Universal do Reino de Deus), e PSC(identificado várias denominações) mas não são evangélicos.

Um deles, eleito pelo PSC-RJ, foi retirado de uma segunda lista divulgada pela FPE. A relação atualizada do DIAP tem a lista da FPE acrescida de três nomes.  Um deles é evangélico, de fato. Os outros dois não são evangélicos: um é católico e o outro não revela identidade religiosa.