PL de Mourão sobre anistia a golpistas é “delinquência legislativa”, diz Reinaldo

Atualizado em 4 de março de 2024 às 11:20
O senador bolsonarista Hamilton Mourão (Republicanos). Foto: reprodução

Em artigo publicado nesta segunda-feira (4), o colunista Reinaldo Azevedo, do UOL, destacou que o PL 5.064, do senador bolsonarista Hamilton Mourão (Republicanos), sobre anistia a golpistas do 8 de janeiro, é uma “delinquência legislativa”:

Há uma consulta pública na página do Senado sobre o PL 5.064, do senador Hamilton Mourão (Republicanos), que concede anistia aos golpistas do dia 8 de janeiro de 2023. Enquanto escrevo, há 478.856 votos “sim” e 516.173 “nãos”.

Essa estrovenga não vai prosperar, o que é melhor para o país. Mas, às vezes, um diabinho me sopra aos ouvidos: “Ah, Reinaldo, torça para passar, vá… Só para a gente ver o STF declarar inconstitucional aquela porcaria!” Não. “Sem essa, capetinha! Pra que mais confusão? Fico com aquele outro ser alado, o de feições angelicais, que diz: “Vamos torcer para o Congresso afastar essa besteira”. E acho que afastará. O texto de Mourão é uma manifestação rara de indigência legislativa. Como parlamentar, é só um general indisciplinado. Vamos ver. (…)

Não raro, os valentões de 8 de janeiro de 2023 estão sendo condenados por:1: tentativa de abolição do estado de direito (Artigo 359-L do Código Penal);2: tentativa de golpe de Estado (359-M do CP);3: organização criminosa (Lei 12.850);4: dano qualificado (Artigo 163 do CP);5: deterioração do patrimônio tombado (Artigo 62 da Lei 9.605).

Para o glorioso parlamentar, os crimes que têm a ver com o patrimônio (4 e 5) não seriam anistiados. Cada um deles rende pena máxima de três anos. Ninguém cumpriria pena em regime inicialmente fechado. Já os outros (1, 2 e 3), com penas máximas, respectivamente, de 8, 12 e 8 anos, bem, estes seriam “esquecidos”.

E isso já nos diz da indecência inata da coisa. Ou ele discorda do julgamento do tribunal — e, pois, não sua opinião, tais crimes não foram cometidos — ou considera que atacar o patrimônio público é ato que não merece perdão, mas tentar abolir o estado de direito e dar golpe de Estado, aí sim!

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Manifestantes terroristas em Brasília – Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Na justificativa, a gente constata que Mourão quer a anistia porque entende que o Parlamento pode se comportar como corte revisora do STF. Como se opõe ao juízo dos juízes, então pretende julgar o julgamento… Inclusive o que ainda não houve. Observem que, segundo este juiz dos juízes,- a maioria não agiu em comunhão de desígnios:- o STF e o MPF não conseguiram individualizar as condutas nem têm condições de fazê-lo.

Para não confessar que está numa cruzada com o objetivo de livrar a barra de pessoas que são do seu campo ideológico, afirma, na prática, que seu intento é fazer do Congresso o Supremo do Supremo. Por esse caminho, o tribunal viraria um quarto de despejo do Legislativo. (…)

O que o estupefaciente Mourão escreve na sua proposta é que ele discorda do resultado do julgamento e que avalia que três dos crimes não foram cometidos. Na sua cabeça oca, o Supremo julga os criminosos, e o Congresso julga o Supremo.

O tal “PL da Anistia” é, em verdade, uma manifestação de delinquência legislativa como raramente se viu. “E por que seria inconstitucional, Reinaldo?” Porque o PL já indica, desde a justificativa, que o Legislativo decidiu julgar em lugar do Supremo. Pior: houve por bem julgar o próprio Supremo.

Como político, Mourão é só um general indisciplinado. Sua proposta é uma vergonha. Do tipo alheia, é claro!, dada a impossibilidade de ser vergonha própria. Seu projeto está para a boa técnica legislativa como os palavrões em porta de banheiro público estão para um tratado de filosofia. Podem até ser engraçados, mas a gente sabe muito bem as substâncias que os escoltam.

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