Polícia prende 25 jovens em ato contra tarifa em SP e acusa 13 de associação criminosa; Justiça ordena soltura

Atualizado em 12 de janeiro de 2024 às 11:08
Antes que pudessem chegar ao ato, 25 jovens foram detidos e levados pela PM em bases comunitárias móveis – Gabriela Moncau
Por Gabriela Moncau

A Polícia Militar (PM) prendeu 25 jovens que tentavam chegar ao ato contra o aumento da tarifa do transporte em SP na noite da última quarta (10). Destes, 13 seguiram presos e foram acusados pelo delegado Alexandre Henrique Augusto Dias, do 3° Distrito Policial, de associação criminosa. Em audiências de custódia nesta quinta (11), a Justiça ordenou a soltura de todos os detidos. Até o fechamento desta matéria quatro adolescentes e um adulto haviam sido postos em liberdade.

Entre os detidos, seis são menores de idade. Na visão do delegado, que não foi acatada pela Vara da Infância e Juventude, eles deveriam ser internados na Fundação Casa para “garantia de sua segurança pessoal e principalmente da manutenção da ordem pública”. Por determinação da Justiça, no entanto, os adolescentes deverão ser “entregues aos seus responsáveis” e responder os processos em liberdade assistida.

Os sete maiores de idade, que também são acusados de corrupção de menores, terão de usar tornozeleira eletrônica e estão proibidos de ir a manifestações.

A detenção

O grupo foi detido por policiais da Força Tática da PM na saída do metrô República, quando pretendia ir até o Theatro Municipal onde o protesto convocado pelo Movimento Passe Livre (MPL) se concentrava. No entendimento do delegado, ao apreenderem objetos encontrados com os jovens – entre os quais uma pedra, vinagre, canivete, tesoura, gases, spray e celulares – os policiais teriam evitado um “grave atentado ao Estado Democrático de Direito”.

A advogada Maíra Pinheiro acompanhou os jovens detidos na delegacia durante a madrugada. “O delegado determinou que todos fossem ouvidos, nitidamente os colocando em posição de constrangimento em relação ao direito de não incriminação. Eles foram incitados a dizer o que foram fazer no protesto, porque estavam lá, quem conheciam”, conta.

“Pelo tom da linguagem do Boletim de Ocorrência (BO), fica evidente que existe uma confusão entre os fatos atribuídos a esses jovens e as opiniões das autoridades policiais e dos PMs sobre a legitimidade da manifestação do Passe Livre”, avalia a advogada. “Existe uma nítida intenção de criminalizar a atividade política”, resume.

A citação a uma suposta tentativa de abolir o Estado Democrático de Direito, que aparece duas vezes no BO a que o Brasil de Fato teve acesso, remete aos crimes imputados aos envolvidos nos atos golpistas na praça dos Três Poderes em 8 de janeiro. A relação de um episódio com o outro, na visão de Pinheiro, é uma “insanidade”, uma “imprecisão técnica” e um precedente perigoso.

“Essas acusações são absurdas”, define Luana*, integrante do MPL. “As pessoas nem chegaram à manifestação e mesmo que tivessem chegado, é um direito delas se manifestar. Isso faz parte de uma política de criminalização dos movimentos sociais do governo Tarcísio [de Freitas (Republicanos)]”, afirma, lembrando dos dois ativistas contra a privatização da Sabesp que ficaram seis dias presos no último dezembro.

PM escolta catraca com extintor durante ato

O protesto desta quarta (10) contra o aumento das passagens de metrô, trem e ônibus intermunicipais foi o primeiro desde que o governo Tarcísio implementou o aumento da tarifa em 1º de janeiro. Um novo ato está marcado para a próxima quinta-feira (18), às 17h, na praça da República.

Na contramão de experiências de tarifa zero em 87 cidades do país, o governo Tarcísio aumentou a tarifa do metrô e do trem para R$5 / Gabriela Moncau

Na contramão de experiências de tarifa zero em 87 cidades do país, o governo Tarcísio aumentou a tarifa do metrô e do trem para R$5 / Gabriela Moncau

Além da reversão do aumento de R$0,60 do transporte sobre trilhos, o MPL se contrapõe à privatização do transporte e defende um modelo “com participação popular”, “tarifa zero financiada com tributação progressiva” e “empresas remuneradas por quilômetro rodado e não por catraca rodada”.

A despeito de uma tempestade, o ato caminhou pelo centro da cidade até a estação Higienópolis-Mackenzie na av. Consolação, uma das linhas privatizadas do metrô, gerida pela empresa ViaMobilidade.

Ali, ativistas tentaram fazer a tradicional queima simbólica de uma catraca para o encerramento do protesto. Exaltados, policiais ameaçaram reprimir caso a intervenção acontecesse. Dezenas de agentes de segurança, incluindo a Tropa de Choque, estavam posicionados nos arredores. Durante cerca de meia hora, o objeto foi levado de um lado a outro e seguido, como que numa escolta, pela polícia. Em dado momento, os agentes passar a seguir a catraca com um extintor.

“As forças policiais, defensoras das catracas, se sentiram ofendidas e fizeram questão de proteger uma catraca velha, impedindo a manifestação de realizar essa intervenção”, descreve o MPL em nota. “O recado foi passado. Não aceitaremos calados nenhum aumento e nenhuma privatização a mais”, afirma o movimento.

Originalmente publicado em Brasil de Fato

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