Deveríamos ter estátuas do Almirante Negro em toda parte. Por Manuel Domingos Neto

Atualizado em 20 de novembro de 2021 às 15:25
Estátua de João Cândido, o Almirante Negro
Estátua de João Cândido, o Almirante Negro – Foto: Reprodução

Por Manuel Domingos Neto

Força bruta sem legitimidade é inglória, daí o guerreiro sempre se amparar em justificativas sagradas.

Na modernidade, a sagração do guerreiro provém da nação, também conhecida como pátria, que vem do latim e remete a algo como “terra dos pais”. Guerreiro moderno mata e morre em nome da nação que lhe custeia e pranteia.

Nação, comunidade que se reconhece e é reconhecida ignora diferenças, não vê cor de pele. Sua atração irresistível reside na crença em uma comunhão de destino.

Todos querem integrar essa comunidade imaginada, inclusive os que, escravizados, tiveram sua humanidade surrupiada. Alguns lutaram por esse sonho com bravura inexcedível, como João Cândido Felisberto.

No Brasil republicano, o Exército e a Armada não se livravam de suas sanguinárias origens coloniais. Persistiram usando o chicote e cortando gargantas. Lesaram a humanidade, respaldaram sistemas iníquos.

Inviabilizavam, inclusive, o serviço militar obrigatório, fórmula que exigia o respeito aos pretos e pobres.

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Ninguém contribuiu tanto, em tão pouco tempo para a legitimidade das corporações armadas brasileiras quanto o Almirante Negro: em quatro dias de revolta, impôs a supressão da chibata. As corporações puderam, então, arguir com um mínimo de solidez a condição de “nacionais”. A conscrição universal foi, finalmente, foi implantada.

Em 2008, quase cem anos depois da revolta do marinheiros, um presidente da República inauguraria uma estátua de João Cândido.

Abusado e indisciplinado, o comandante da Armada não compareceu. Mandou recado dizendo que o líder negro quebrara a hierarquia e cometera assassinatos. O Presidente, conciliador, não mandou prendê-lo pela desfeita.

Esses almirantes… Ao longo do regime republicano, quantas vezes quebraram a hierarquia e mataram ilegalmente?

Há mais de dez anos tramita no Congresso projeto para inscrever João Cândido no “Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria”. Oficiais da Armada, pagos com o suor dos brasileiros, atuam pela rejeição da iniciativa. Os parlamentares amarelam. Medo monstro.

Almirantes são homens que, para comandar barcos, aprendem a reconhecer a direção dos ventos e das correntes marítimas. Não aprendem, que pena, a perceber os rumos demandados pela sociedade sedenta de nação. Não aprendem a respeitar a hierarquia estabelecida pela Lei.

Almirantes vivem fora do tempo. Ainda veneram Dona Maria, a Louca, por ter fundado a Real Academia de Marinha. Essa mulher não queria bem ao povo. Pirou com a Revolução Francesa. Era inimiga do brasileiros. Permitiu que enforcassem Tiradentes.

Almirantes me fazem lembrar a madame de Haroldo Barbosa e Janet de Almeida, aquela que dizia que a raça não melhorava e a vida piorava por causa do samba; que o samba tinha pecado, coitado, devia acabar…

A Madame tinha um parafuso a menos, só falava veneno, meu deus, que horror!

Pensando aqui no dia da Consciência Negra…

E se as escolas formadoras de almirantes aceitassem o convite de Martinho da Vila e Teresa Cristina para tranpar juntos, unidos e misturados?

Teríamos estátuas do Almirante Negro por toda parte!

A pátria sorriria enternecida.

Dona Maria, a Louca, que não paga os salários nem financia os custosos projetos dos almirantes, seria posta em seu devido lugar.

Força bruta sem legitimidade é inglória!

(Texto originalmente publicado no FACEBOOK do autor)

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