EXCLUSIVO – Holiday sai do MBL no meio do expurgo de mais de 100 membros

Atualizado em 5 de abril de 2021 às 16:47
Fernando Holiday e Renan Santos. Foto: Reprodução/Instagram

Este texto foi publicado originalmente no dia 29 de janeiro de 2021. Está sendo republicado agora após o Patriota expulsar Holiday para o partido se alinhar ao bolsonarismo.

Expurgos, troca de acusações, ameaças e um racha entre as principais lideranças. É isso que está vivendo de verdade, atualmente, o Movimento Brasil Livre (MBL), associação suprapartidária de direita que surgiu na época das manifestações pelo impeachment da então presidenta Dilma Rousseff, em 2015, e que contribuiu para o golpe parlamentar e para a ascensão de Bolsonaro.

Uma das principais lideranças do movimento, o vereador paulistano Fernando Holiday (Patriota), abandonou o MBL nesta semana, dentro de um contexto que, conforme apontam a apuração, entrevistas, prints de WhatsApp, áudios e vídeos a que o DCM teve acesso, é só a “ponta do iceberg” de uma crise sem precedentes nesse movimento de direita, que ainda planeja protagonizar o próprio impeachment do presidente Jair Bolsonaro.

A saída adocicada de Fernando Holiday

No dia 19 de janeiro, o jornalista Fábio Zanini noticiou no blog Saída Pela Direita, do jornal Folha de S.Paulo, uma “crise sem precedentes” dentro do Movimento Brasil Livre (MBL), em seus seis anos de existência. Um trecho da reportagem diz o seguinte:

“Uma de suas figuras mais conhecidas, o vereador paulistano Fernando Holiday (Patriota) abriu uma dissidência interna em razão da disputa pela presidência da Câmara dos Deputados e não descarta deixar o movimento. Holiday apoia abertamente a candidatura do deputado federal Marcel van Hattem (Novo-RS) para a sucessão de Rodrigo Maia (DEM-RJ) e discorda das críticas feitas por outros líderes do MBL a ele.

(…) Van Hattem teve uma áspera discussão pelo Twitter com Renan Santos, coordenador nacional do movimento. O pano de fundo é a posição do deputado gaúcho de cautela com relação ao impeachment do presidente Bolsonaro, defendido de maneira incisiva pelo MBL”.

Na mesma semana, uma das diferentes fontes que o DCM vem ouvindo há cerca de dois meses cravou, em contato pelo telefone: “Holiday vai sair do MBL”. A reportagem, no entanto, apontava que Renan Santos, fundador e líder do movimento, estava “conversando” com o vereador do Patriota, e ainda o chamava de “brother”.

A amizade não durou muito depois da notícia. Nem 10 dias. No dia 28 de janeiro, o mesmo blog da Folha deu a notícia de que Fernando Holiday estava fora do MBL. Pelo Twitter, o vereador suavizou o movimento político:

“Fernando Holiday se tornou membro do MBL desde a fundação. Rapidamente galgou a posição de um dos melhores oradores políticos do país. No período do impeachment, destacou-se nos trios com inflamados discursos contra a corrupção e o descalabro do governo petista. Subverteu a lógica do “lugar de fala” da esquerda; negro, homossexual vindo de família pobre, quebrou os estereótipos em que o pensamento coletivista costuma tentar encerrar as pessoas. Defende um liberalismo altivo, consciente das questões sociais, mas que preza, sobretudo, pelo valor inalienável da pessoa humana.

Junto com Kim Kataguiri, Fernando Holiday formou a dupla de jovens ativistas mais talentosa do Brasil. Em entrevistas para a Folha, Estadão, Jovem Pan, Veja, El País consolidou-se como voz madura no debate público. Virou referência política. E virou estrela pop nas redes sociais. Múltiplo Holiday. Não à toa, é um personagem maior no documentário do MBL e no livro que conta a origem do movimento. Não à toa, foi por duas vezes vereador eleito com mais de 50 mil votos na cidade de São Paulo.

O ano de 2020 foi um ano particularmente feliz para o MBL. Em uma disputa sem fundão, sem tempo de TV, sem marqueteiros pagos a peso de ouro, o MBL conquistou seu maior feito eleitoral – emplacou Arthur do Val com quase 10% de votos”.

É o mesmo conteúdo de uma nota oficial do MBL que o DCM teve acesso e publicou.

Holiday também fez uma live de despedida, publicada no YouTube oficial do MBL, ao lado de Kim Kataguiri.

A história de como vai o Movimento Brasil Livre internamente não é tão adocicada e amistosa como a saída de Holiday dá a entender.

Saída de 150 até 200 integrantes do MBL

Desde de dezembro de 2020, o Diário do Centro do Mundo manteve contato com diferentes fontes que fizeram parte do Movimento Brasil Livre e pessoas que são próximas do movimento. A saída de Fernando Holiday é só a “ponta do iceberg” da “crise sem precedentes” do MBL.

O problema central envolve o líder Renan Santos, fundador que acumula mais de uma centena de processos de sua família, que abriu diferentes empresas e não pagou impostos e passivos trabalhistas. As brigas passaram a envolver a campanha eleitoral de 2020, que focou especialmente no advogado Rubinho Nunes, eleito vereador em São Paulo ao lado de Holiday, e no youtuber Arthur “Mamãe Falei” do Val, que fez uma campanha agressiva e com linguagem bolsonarista, atacando figuras como o Padre Julio Lancelotti.

Essencialmente, as discussões no WhatsApp envolveram problemas profissionais e de remuneração de colaboradores. Cobrando transparência de Renan, os dirigentes regionais ameaçaram denunciar alegados desvios de conduta dentro do MBL.

Um integrante chamou o dirigente Renan Santos para o debate. Ele saiu do grupo de discussão. Não queria responder diretamente esse integrante. Acabou criando outro grupo de discussão.

No dia 16 de dezembro, circularam áudios de Renan Santos anunciando a expulsão de dois dirigentes de São Paulo: Fernando Dainese e Mário Fortes. Em um deles, o líder do Movimento Brasil Livre disse o seguinte quando foi cobrado para ter mais transparência perante os demais integrantes:

Renan Santos, o líder do MBL que expurgou seus próprios militantes
Renan Santos, o líder do MBL que expurgou seus próprios militantes

“Pessoas estão participando aqui para ajudar a esclarecer isso. Muitas. Porque é uma coisa muito grave. Pode envolver a esfera criminal. Coisas aconteceram inclusive hoje. Aqui de São Paulo e outros lugares. A gente está tendo que colocar advogado para resolver essa merda! Porque tem gente fazendo chantagem, não vou citar nomes, extorsão, não vou citar nomes. Vários lugares eu vi isso.

Chega! A gente não é refém de ninguém. Chega. Então é isso. Não quero… ah, isso não me satisfez e tudo mais? Desculpa, quer sair do movimento? A porta da rua é serventia da casa. O movimento não vai ficar à deriva sendo alvo de coisas canalhas. E eu nem estou falando o que essas pessoas fizeram… em respeito a essas pessoas”.

Expurgo de integrantes do MBL. Foto: Reprodução/WhatsApp

Renan prossegue em uma segunda gravação a que o DCM teve acesso:

“Só vou deixar claro aqui: não dá para esclarecer tudo! Não tem transparência total porque está acontecendo uma apuração. Não vamos ser injustos com quem não fez nada. Nem ser leniente com quem foi canalha. O que aconteceu é que um pessoal aqui de São Paulo adotou um comportamento canalha com relação ao movimento para prejudicar deliberadamente campanhas de pessoas do MBL e pessoas do movimento em si.

Com coisas que serão judicializadas! Algumas dessas pessoas foram gravar conversas com coordenadores do movimento para usar essas conversas. Algo extremamente suspeito. Tem gente que é leva e traz. Uma fica denunciando a outra. Quando a gente cortar alguém, vai ter que ser cortado porque é assim que funciona (…). Coisas sujas estão acontecendo e, se precisar, a gente encerra o núcleo de São Paulo. Não tem problema!

Quando pessoas ou pessoas estão sendo cortadas, é porque elas fizeram alguma coisa. E, em respeito até a elas, a gente não vai sair por ai falando. Tá? Mais tarde a gente vem com novos esclarecimentos. Mas, por ora, é isso”.

Você pode ouvir esses áudios, com exclusividade, abaixo.

O expurgo do MBL afetou, estimam as fontes que enviaram essas informações, até 200 militantes, de um total de 350 do movimento. Afetou as coordenações do estado de São Paulo, cidade de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo, Minas Gerais e localidades até da região Nordeste.

Depois, além da saída de Fernando Holiday, outra liderança LGBT deixou o MBL: Tiago Pavinatto, advogado que também foi candidato a vereador em 2020 e não teve apoio do movimento.

Mesmo com tantas pessoas fora do movimento, ele ainda quer liderar os protestos pelo impeachment de Bolsonaro.

O MBL, basicamente, implodiu.

Enquanto membros se queixam de falta de transparência e são expulsos, eles mudam de sede

Em reportagem publicada com exclusividade no DCM em 20 de outubro de 2020, revelou-se que o MBL mudou de sede, de um imóvel modesto na Vila Mariana, para um prédio luxuoso no Morumbi, chamado América Business Park. O aluguel da sala comercial e do conjunto no imóvel varia de R$ 4 mil a até mais de R$ 10 mil. Nos vídeos, eles não mostram muito dessa novo local de trabalho.

Imóvel do MBL na Vila Mariana, mais modesto. Foto: Reprodução/Globo
Novo imóvel do MBL no Morumbi. Foto: Reprodução/America Business Park
Novo imóvel do MBL no Morumbi. Foto: Reprodução/Google Street View

O que se sabe é que a reportagem foi lida no dia de sua publicação por Rubinho Nunes e Renan Santos. Eles olharam apreensivos os celulares com as informações do local durante uma reunião. Transtornados com o conteúdo publicado, não tiveram ânimo de prosseguir com a conversa com outros integrantes do MBL.

Outro lado

Renan Santos, dirigente e um dos fundadores do MBL. Foto: Reprodução/YouTube

O DCM procurou Renan Santos para responder as seguintes perguntas:

1 – Por que o MBL expulsou mais de 100 integrantes e mandou áudios tão agressivos sem provas?

2 – Isso tem conexão com insatisfação ou falta de pagamento nas campanhas?

3 – Por que o MBL não apresenta sua nova sede no Morumbi?

4 – Por que figuras de destaque como Holiday e Pavinatto deixaram o movimento em tão pouco tempo e logo após as eleições?

Até o momento da publicação desta reportagem, não houve qualquer resposta.

LEIA TAMBÉM – Fundador do MBL, advogado trabalhou para MamãeFalei enquanto recebia como assessor na Câmara. Por Pedro Zambarda

Fernando Holiday usa funcionários de gabinete e do MamãeFalei em rap de campanha. Por Pedro Zambarda