Duvivier: “Não tomar contato com a parte mais estridente do eleitorado de Bolsonaro foi a maneira que encontrei de permanecer são”

Gregório Duvivier. Foto: Reprodução/YouTube

A revista Veja entrevistou o humorista Gregório Duvivier.

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O senhor vem travando batalhas digitais com o presidente Bolsonaro. Isso tem graça? Graça zero. Gostaria que o presidente se ocupasse mais de seu trabalho no lugar de ficar trocando mensagens com humorista. Um dia desses disse isso a ele via Twitter. Bolsonaro tinha se referido aos governadores do Nordeste como paraíbas. Cutuquei: “Prove sua popularidade na rua dando um passeio entre os ‘paraíba’ ”. A resposta dele foi um vídeo, em que é ovacionado na Bahia. Isso não cola. Aproveitei e dei o recado: “Vai trabalhar, presidente”.

Bolsonaro é engraçado? Ele quer ser. Nada justifica suas falas senão uma tentativa de fazer piada. Mas é aquela graça à moda antiga. Os saudosistas do humor do passado estão muito bem servidos com o presidente. Bolsonaro é bom de meme, de viralizar declarações e de tirar a atenção do que interessa de verdade.

Os bolsominions costumam deixar comentários em suas redes sociais?Juro que não leio. Não tomar contato com a parte mais estridente do eleitorado de Bolsonaro foi a maneira que encontrei de permanecer são.

O senhor percebe em algum dos filhos do clã presidencial pendor para o humor? Embora goste da sintaxe doentia do Carluxo, o melhor talvez seja Eduardo falando inglês. Olha, está duro para os humoristas de hoje superar o anedotismo da realidade brasileira.

Pode definir esse humor de antigamente reavivado por Bolsonaro?Há uns quinze anos, quando comecei, os alvos dos humoristas eram os mesmos da polícia. Ria-se de pobres, negros, nordestinos, homossexuais. Para o bem geral da nação, isso mudou. Não é que não se podem mais fazer piadas desse tipo; elas só não têm mais a graça que tinham. Essa foi uma porta arrombada pelas minorias.

O politicamente correto reprime o humor em algum grau? Não. Ao contrário: ele obriga o humorista a encontrar caminhos mais inteligentes para fazer rir. Nosso trabalho ficou certamente mais duro na era do politicamente correto, mas ninguém escolhe fazer humor porque é fácil.

Sendo declaradamente de esquerda, o senhor às vezes cai na armadilha de enviesar ideologicamente suas piadas?Navego em todos os matizes ideológicos. Apesar de me identificar com a ideologia da esquerda, isso não me impede de rir dela. Em um vídeo do Greg News, dizemos que a direita não sabe fazer hambúrguer e que a esquerda não sabe fazer autocrítica. Claro que eu acho a nossa direita infinitamente mais cômica, mas isso não me impede de rir da esquerda. Ela também é e sabe ser ridícula.

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Pedro Zambarda de Araujo

Escritor, jornalista e blogueiro. Autor dos projetos Drops de Jogos e Geração Gamer, que cobrem jogos digitais feitos no Brasil e globalmente. Teve passagem pelo site da revista Exame e pelo site TechTudo. E-mail: [email protected]

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